A invenção contém como
ativo um insumo vegetal obtido das cascas do caule de Commiphora leptophloeos,
conhecida popularmente como imburana
Uma
formulação farmacêutica e cosmética inovadora, na forma de hidrogel, teve o
pedido de patente depositado junto ao Instituto Nacional da Propriedade
Industrial (Inpi) no mês de novembro por cientistas da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN). A invenção contém como ativo um insumo vegetal
obtido das cascas do caule de Commiphora leptophloeos, conhecida popularmente
como imburana, uma espécie nativa da Caatinga e do Cerrado, dois dos biomas
brasileiros.
Coordenadora
da equipe de pesquisadores, Silvana Maria Zucolotto Langassner identifica que o
insumo ativo foi obtido a partir de um subproduto da espécie, visto que a
madeira do caule é amplamente utilizada na indústria moveleira para a confecção
de portas, janelas e móveis. Zucolotto realça que a nova tecnologia apresenta
aplicação na área da saúde, mais especificamente no tratamento de infecções
fúngicas causadas por fungos do gênero Candida.
“Nós
testamos a formulação em modelos experimentais pré-clínicos in vitro de
infecção causada por fungos do gênero Candida e in vivo em modelos de
inflamação aguda tópica. Em ambos os casos, os testes apresentaram atividades
antifúngicas e anti-inflamatórias satisfatórias, sendo notificada a inibição de
células fúngicas isoladas de fluidos vaginais, como também na redução dos
edemas locais. Além disso, os insumos se mostraram seguros com baixa
citoxicidade”, explica a professora do Departamento de Farmácia da UFRN. A
cientista acrescenta que esse resultado ocorre também pois os insumos ativos
usados foram desenvolvidos sem a adição de solventes tóxicos, obedecendo aos
preceitos da química verde.
O
fungo Candida se aloja comumente na área genital, provocando coceira, secreção
e inflamação na região, com sintomas que remetem à infecção candidíase.
Usualmente, o micro-organismo vive normalmente no corpo sem causar danos, mas,
em situações de desequilíbrio, aumenta a população e passa a ser danoso. Esses
fungos gostam de ambientes quentes e úmidos, por isso se proliferam em pontos
com dobras no corpo ou espaços do corpo que são mais propensos ao acúmulo de
umidade.
Renato
Dantas De Medeiros, autor da tese de doutorado que resultou na nova tecnologia,
tendo participado da obtenção e desenvolvimento do insumo, desenvolvimento e
caracterização da formulação e avaliação da atividade antifúngica, fala que o
uso de plantas para o tratamento tópico de doenças vaginais, como a candidíase,
e de distúrbios da pele se mostra altamente promissor, visto que apresentam
potente efeito terapêutico, menos efeitos adversos e independência na produção
da matéria-prima em território brasileiro, desde o cultivo até o produto que
será comercializado.
Atualmente
realizando estágio doutoral na Universidad Complutense Madrid, na Espanha, com
bolsa pelo Programa Capes PrInt, Renato frisa que, em relação à composição de
Commiphora leptophloeos, destaca-se a presença de metabólitos especializados,
como ácidos fenólicos, flavonoides glicosilados e lignanas, substâncias
relacionadas com as atividades terapêuticas da espécie. Especificamente a casca
do caule da imburana é considerada um subproduto proveniente das indústrias
moveleiras, logo, esse resíduo poderia ser reaproveitado como matéria-prima
vegetal para o desenvolvimento de novos produtos de valor agregado, que podem
ser empregados por indústrias farmacêuticas ou cosméticas.
Segundo
o estudante do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação
Tecnológica em Medicamentos (PpgDITM), somado a todos esses aspectos, “tem-se o
fato de que até o momento não tem nenhum insumo, cosmético ou fitoterápico,
registrado na Anvisa que contenha como princípio ativo o extrato da casca do
caule de C. leptophloeos. Por fim, desenvolver insumos com plantas nativas do
Brasil pode contribuir para o fortalecimento da cadeia produtiva nacional e diminuir
a dependência do Brasil em relação a outros países”, destaca.
O
pedido de patente é fruto de parceria da UFRN com a Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho e contou com a colaboração também de Guilherme
Maranhão Chaves e de Luanda Bárbara Ferreira Canário de Souza, ambos na
avaliação da atividade antifúngica, e de Marlus Chorilli, este colaborando no
desenvolvimento da formulação.
Protótipo
Atualmente
atuando como professora visitante sênior na North Carolina State University, no
Estado da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, Silvana Langassner situa que o
invento está, após a comprovação da ação antifúngica e anti-inflamatória, por
meio de estudos pré-clínicos, em fase de um protótipo. O projeto de pesquisa
está sendo desenvolvido no Laboratório de AFarmacognosia, junto ao Grupo de
Pesquisa em Produtos Naturais Bioativos (PNBio).
“O
pedido de depósito de patente é relevante porque permite a proteção de uma
invenção. É também gratificante ver o resultado de uma invenção desenvolvida em
uma universidade pública do Brasil, com uma espécie nativa, que pode viabilizar
o desenvolvimento de toda a cadeia produtiva do produto acabado em solo
brasileiro e diminuir a dependência do Brasil da importação de insumos vegetais
de outros países”, realça a docente.
O
depósito do pedido de patente é uma forma de reconhecimento do esforço
inventivo e, por isso, garante ao seu proprietário direitos exclusivos sobre a
invenção. Ele é uma propriedade temporária, legalmente concedida pelo Estado,
sobre uma invenção ou modelo de utilidade, formado por um conjunto de
procedimentos sequenciais, por meio dos quais o requerente dá entrada no pedido
de obtenção de direitos sobre uma criação que pode ser produzida
industrialmente. No Brasil, o órgão responsável é o Instituto Nacional de
Propriedade Industrial (Inpi). O processo, após o depósito de patente feito
pelo requerente, consiste na análise do pedido de registro e na concessão do
direito, caso haja conformidade do pedido com os requisitos formais e legais.
Como
efeito colateral, a partir da proteção da autoria intelectual, a ideia é que
aconteça o incentivo aos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Pensando
nisso, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) criou em 2022 a sua
primeira Política de Inovação, a qual estava prevista no Plano de
Desenvolvimento Institucional 2020-2029 (PDI) já com a perspectiva de se
estruturar em quatro eixos norteadores: disseminação da prática da inovação e
do empreendedorismo, estratégias de fortalecimento da propriedade intelectual,
transferência de tecnologia e inovação no ensino.
Uma
história que não se apaga
No
início do processo para depositar a patente, uma notícia inesperada chegou até
os inventores. A partida de Luanda Bárbara Ferreira Canário de Souza, aos 34
anos, surpreendeu não apenas pela idade, mas pela perda de uma pessoa que se
caracterizou sobretudo pela capacidade de encontrar alternativas em meio a
problemas.
Graduada
em Farmácia, mestre e doutora em Ciências Farmacêuticas, todos os títulos
obtidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Luanda era técnica de
laboratório da Instituição, professora do ensino superior do Centro
Universitário Facex e professora adjunta do Centro Universitário Natalense. Em
sua homenagem, as equipes do Centro de Ciências da Saúde (CCS) fizeram questão
de frisar que “Luanda sempre foi uma funcionária muito comprometida, proativa e
querida por todos”, com o período de convivência marcado também pelo
desenvolvimento de pesquisa com excelência na área de micologia e imunologia,
além da atuação em diversas ações de extensão na UFRN.
Na foto/cedida, Renato
mostra protótipo da formulação.
Wilson
Galvão, da Assessoria de Comunicação da Agência de Inovação da Reitoria/UFRN
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