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sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Da caatinga para o mercado: Nova tecnologia inovadora promete ação contra infecção

A invenção contém como ativo um insumo vegetal obtido das cascas do caule de Commiphora leptophloeos, conhecida popularmente como imburana

Uma formulação farmacêutica e cosmética inovadora, na forma de hidrogel, teve o pedido de patente depositado junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) no mês de novembro por cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). A invenção contém como ativo um insumo vegetal obtido das cascas do caule de Commiphora leptophloeos, conhecida popularmente como imburana, uma espécie nativa da Caatinga e do Cerrado, dois dos biomas brasileiros.

Coordenadora da equipe de pesquisadores, Silvana Maria Zucolotto Langassner identifica que o insumo ativo foi obtido a partir de um subproduto da espécie, visto que a madeira do caule é amplamente utilizada na indústria moveleira para a confecção de portas, janelas e móveis. Zucolotto realça que a nova tecnologia apresenta aplicação na área da saúde, mais especificamente no tratamento de infecções fúngicas causadas por fungos do gênero Candida.

“Nós testamos a formulação em modelos experimentais pré-clínicos in vitro de infecção causada por fungos do gênero Candida e in vivo em modelos de inflamação aguda tópica. Em ambos os casos, os testes apresentaram atividades antifúngicas e anti-inflamatórias satisfatórias, sendo notificada a inibição de células fúngicas isoladas de fluidos vaginais, como também na redução dos edemas locais. Além disso, os insumos se mostraram seguros com baixa citoxicidade”, explica a professora do Departamento de Farmácia da UFRN. A cientista acrescenta que esse resultado ocorre também pois os insumos ativos usados foram desenvolvidos sem a adição de solventes tóxicos, obedecendo aos preceitos da química verde.

O fungo Candida se aloja comumente na área genital, provocando coceira, secreção e inflamação na região, com sintomas que remetem à infecção candidíase. Usualmente, o micro-organismo vive normalmente no corpo sem causar danos, mas, em situações de desequilíbrio, aumenta a população e passa a ser danoso. Esses fungos gostam de ambientes quentes e úmidos, por isso se proliferam em pontos com dobras no corpo ou espaços do corpo que são mais propensos ao acúmulo de umidade.

Renato Dantas De Medeiros, autor da tese de doutorado que resultou na nova tecnologia, tendo participado da obtenção e desenvolvimento do insumo, desenvolvimento e caracterização da formulação e avaliação da atividade antifúngica, fala que o uso de plantas para o tratamento tópico de doenças vaginais, como a candidíase, e de distúrbios da pele se mostra altamente promissor, visto que apresentam potente efeito terapêutico, menos efeitos adversos e independência na produção da matéria-prima em território brasileiro, desde o cultivo até o produto que será comercializado.

Atualmente realizando estágio doutoral na Universidad Complutense Madrid, na Espanha, com bolsa pelo Programa Capes PrInt, Renato frisa que, em relação à composição de Commiphora leptophloeos, destaca-se a presença de metabólitos especializados, como ácidos fenólicos, flavonoides glicosilados e lignanas, substâncias relacionadas com as atividades terapêuticas da espécie. Especificamente a casca do caule da imburana é considerada um subproduto proveniente das indústrias moveleiras, logo, esse resíduo poderia ser reaproveitado como matéria-prima vegetal para o desenvolvimento de novos produtos de valor agregado, que podem ser empregados por indústrias farmacêuticas ou cosméticas.

Segundo o estudante do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos (PpgDITM), somado a todos esses aspectos, “tem-se o fato de que até o momento não tem nenhum insumo, cosmético ou fitoterápico, registrado na Anvisa que contenha como princípio ativo o extrato da casca do caule de C. leptophloeos. Por fim, desenvolver insumos com plantas nativas do Brasil pode contribuir para o fortalecimento da cadeia produtiva nacional e diminuir a dependência do Brasil em relação a outros países”, destaca.

O pedido de patente é fruto de parceria da UFRN com a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e contou com a colaboração também de Guilherme Maranhão Chaves e de Luanda Bárbara Ferreira Canário de Souza, ambos na avaliação da atividade antifúngica, e de Marlus Chorilli, este colaborando no desenvolvimento da formulação.

Protótipo

Atualmente atuando como professora visitante sênior na North Carolina State University, no Estado da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, Silvana Langassner situa que o invento está, após a comprovação da ação antifúngica e anti-inflamatória, por meio de estudos pré-clínicos, em fase de um protótipo. O projeto de pesquisa está sendo desenvolvido no Laboratório de AFarmacognosia, junto ao Grupo de Pesquisa em Produtos Naturais Bioativos (PNBio).

“O pedido de depósito de patente é relevante porque permite a proteção de uma invenção. É também gratificante ver o resultado de uma invenção desenvolvida em uma universidade pública do Brasil, com uma espécie nativa, que pode viabilizar o desenvolvimento de toda a cadeia produtiva do produto acabado em solo brasileiro e diminuir a dependência do Brasil da importação de insumos vegetais de outros países”, realça a docente.

O depósito do pedido de patente é uma forma de reconhecimento do esforço inventivo e, por isso, garante ao seu proprietário direitos exclusivos sobre a invenção. Ele é uma propriedade temporária, legalmente concedida pelo Estado, sobre uma invenção ou modelo de utilidade, formado por um conjunto de procedimentos sequenciais, por meio dos quais o requerente dá entrada no pedido de obtenção de direitos sobre uma criação que pode ser produzida industrialmente. No Brasil, o órgão responsável é o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). O processo, após o depósito de patente feito pelo requerente, consiste na análise do pedido de registro e na concessão do direito, caso haja conformidade do pedido com os requisitos formais e legais.

Como efeito colateral, a partir da proteção da autoria intelectual, a ideia é que aconteça o incentivo aos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Pensando nisso, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) criou em 2022 a sua primeira Política de Inovação, a qual estava prevista no Plano de Desenvolvimento Institucional 2020-2029 (PDI) já com a perspectiva de se estruturar em quatro eixos norteadores: disseminação da prática da inovação e do empreendedorismo, estratégias de fortalecimento da propriedade intelectual, transferência de tecnologia e inovação no ensino.

Uma história que não se apaga

No início do processo para depositar a patente, uma notícia inesperada chegou até os inventores. A partida de Luanda Bárbara Ferreira Canário de Souza, aos 34 anos, surpreendeu não apenas pela idade, mas pela perda de uma pessoa que se caracterizou sobretudo pela capacidade de encontrar alternativas em meio a problemas.

Graduada em Farmácia, mestre e doutora em Ciências Farmacêuticas, todos os títulos obtidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Luanda era técnica de laboratório da Instituição, professora do ensino superior do Centro Universitário Facex e professora adjunta do Centro Universitário Natalense. Em sua homenagem, as equipes do Centro de Ciências da Saúde (CCS) fizeram questão de frisar que “Luanda sempre foi uma funcionária muito comprometida, proativa e querida por todos”, com o período de convivência marcado também pelo desenvolvimento de pesquisa com excelência na área de micologia e imunologia, além da atuação em diversas ações de extensão na UFRN.

Na foto/cedida, Renato mostra protótipo da formulação.

Wilson Galvão, da Assessoria de Comunicação da Agência de Inovação da Reitoria/UFRN

 

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