Por Fernando Luiz*
Em 2006, Caetano Veloso fez um show no Canecão, no Rio de Janeiro. Na época, era comum os artistas fazerem, em um dia programado previamente, um ensaio aberto ao público. O ensaio era amplamente divulgado na Imprensa através de colunistas importantes como Joyce Pascowitch, Zózimo do Amaral, Hildegard Angel e Carlos Leonam, entre outros. Carlos Leonam tinha uma coluna diária no jornal O Globo, que assinava com o pseudônimo de Carlos Swann. Um dia, ele publicou na sua coluna um fato que tinha acontecido com Caetano. Naquele ano, um dia Caetano foi buscas seus filhos Zeca e Tom no colégio e na saída, ao se dirigir para o seu carro, ouviu alguém gritar: “aí, Caetano, sexta-feira vou lá no Canecão te ver no ensaio aberto”. Era o pipoqueiro.
Na época fiquei muito impressionado com o que li e, até hoje, de vez em quando relembro o fato e fico refletindo sobre o ocorrido: um pipoqueiro, quebrando o “muro” que separa os gênios dos simples mortais, sem a menor cerimônia, gritando, disse para todo mundo ouvir que iria assistir ao ensaio do show de um monstro sagrado da música brasileira, dirigindo-se ao artista, como se fossem velhos amigos: “aí, Caetano...”
Fiquei refletindo sobre o assunto e cheguei a duas conclusões, que mantenho até hoje. Primeiro: o pipoqueiro (que talvez nem tenha ido ao ensaio aberto do show), no mínimo era uma pessoa bem-informada; segundo, mesmo sendo bem-informado, o pipoqueiro não teria como fazer aquele fato chegar ao conhecimento de um dos colunistas mais respeitados da época. Conclusão: como Caetano, sendo quem é, não necessitava fazer marketing com a frase de um pipoqueiro para promover seu show, com certeza foi ele mesmo – ou a sua produção - a fonte do fato que chegou ao conhecimento do colunista, autorizando a divulgação do episódio; e se o fato foi autorizado, com certeza Caetano gostou do que ouviu do pipoqueiro.
Todos sabemos que Caetano é um gênio que está sempre à frente do seu próprio tempo, que não tem medo nem vergonha de ser popular e que várias vezes já provou isso. Quando a releitura de antigas músicas consideradas bregas se tornaram audíveis aos ouvidos elitizados através de regravações de Caetano Veloso, o tabu contra os artistas considerados cafonas começou a cair; O Ébrio de Vicente Celestino, Eu Vou Tirar Você Desse Lugar, de Odair José, Sonhos, de Peninha, Sozinho, também de Peninha (que recebeu o Prêmio Sharp de melhor música em 1997 e que deu a Caetano o único Disco de Platina da sua carreira) e Você Não Me Ensinou A Te Esquecer, de Fernando Mendes. Estas canções foram regravadas pelo gênio baiano da MPB com arranjos sofisticados que deram outra roupagem a elas, consagrando-as como verdadeiras pérolas da música brasileira.
Sou um cantor de música brega. Muitas vezes, ao caminhar pelas ruas, pessoas me param para tirar fotos e, de vez quando, eu escuto também pessoas cantarem em voz alta trechos de alguma música minha, principalmente Garotinha. Mas conheço alguns artistas daqui (que se acham “Cult”,) que se enfiariam num buraco se enfrentassem situações semelhantes...
Os artistas que têm vergonha do povão deveriam aprender com Caetano Veloso e não ter medo da popularidade.
@instagram: @fernandoluizcantor
*Fernando Luiz: Cantor, compositor, escritor e produtor cultural. Formado em Gestão Pública, apresenta o programa Talento Potiguar, aos sábados, às 8h30 na TV Ponta Negra, afiliada do SBT no RN.
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