Por João Bosco de Araújo
Jornalista ▶ boscoaraujo@assessorn.com
Quanta energia e vontade de vencer dessa professorinha que pesava menos de 40 quilos, conforme ela mesma relembrava, quando chegou para as primeiras aulas e que alguns até duvidaram de sua capacidade, comprovada em pouco tempo, se orgulhava de dizer. Ela foi contratada por Francisco Pereira, “Chico Francês”, para ensinar na casa dele.
Aliás, tempo foi o que nunca faltou para provar a tenacidade dessa mulher para sua época, herdada da mãe Luzia, outra mulher de firmeza e coragem para o trabalho, ao lado do companheiro, ajudava o marido Severino na fabricação de chapéus de couro, pioneiros na cidade de Caicó, embora vindos da Paraíba, de São Mamede, em 1932, terra natal também dos irmãos Antônio e Francisco Tavares, menos Antenor que veio na barriga da mãe e nasceu norte-rio-grandense, nos últimos meses, em novembro de 32.
Amparados pelo desempenho caprichoso dos pais, educando os filhos nos melhores colégios da nova cidade, a filha Alzira fez seus estudos no Educandário Santa Teresinha e no Grupo Escolar Senador Guerra, saindo preparada para o ofício que a esperava.
Determinação, perseverança, altivez, nunca lhe faltaram. Tanto que aos 18 anos estava casada com Pedro Salviano de Araújo, 22 anos mais velho do que a professorinha do lugar, onde a conheceu em suas visitas temporárias à terrinha, vez que comercializava burro-mulo para usinas de cana-de-açúcar, em Pernambuco, negócios do primo Manoel Antônio do Umbuzeiro.
Já casada, dona de casa, decidiu continuar ensinando e foi aconselhada a oficializar a escola na Prefeitura, sendo a primeira professora e primeira escola isolada municipal da região, localizada no Umbuzeiro, em Caicó. Com os filhos que nasciam, aumentando a prole, resolveu se afastar e entregar a escola que ainda resiste desde que por ela foi iniciada. Mas foi na década de 1970, quase trinta anos depois, que a professorinha, agora senhora, voltou a ensinar, dessa vez na alfabetização de adultos do Mobral, experiência que ela afirmava ter lhe dado muito prazer.
E mais trabalho na queijeira ao lado do marido, época de escassez na vida do campo com os sete filhos estudando na cidade. Graças aos esforços e incentivos dos dois, todos os filhos concluíram seus estudos, alguns alcançando a universidade, fato marcante para uma época em que apenas 1% da população do país conseguia se formar em uma faculdade.
São exemplos que marcaram os sete filhos e são espelhos também para os 15 netos e 18 bisnetos, além de uma infinidade de sobrinhos de seu marido que a amam como uma verdadeira tia.
Exemplo de vida simples, porém, comprometido com a verdade, honestidade, respeito, caridade, e tudo resulta no que foi vivido nos 33 anos na companhia do marido Pedro Salviano, desde a escolinha rural isolada. Zelo com a família e com os que estavam por perto.
De todas as suas preocupações, a hora da refeição talvez fosse a maior de todas. Preocupação que não se restringe à família, mas a todos ao seu redor, desde a época da convivência rural. É tanto que seu cardápio continuou ainda na Fazenda, que o diga os carões dos médicos que lhe acompanharam nas consultas de rotina.
Foram quase 44 anos de viuvez, embora na companhia dos filhos, netos e bisnetos, dos irmãos Antônio e Antenor que partiram para eternidade antes dela e Chico Tavares que mora em Brasília e sempre vinha para a Festa de Sant’Ana, momentos de muita alegria para ela que amava reencontrar os sobrinhos e as pessoas queridas e amigas que nunca saíram de seu coração.
Aliás, entre tantas amigos e amigas, Comadre Amália e Severina Melada foram suas amigas do peito, desde a menina-moça desconhecida e “da rua da cidade” que chegava na terra estrangeira, inicialmente para Comadre Amália, praticamente da mesma idade e confidentes por longas e longas datas.
Foram quase 96 anos de vida, dia 13 de abril seria seu aniversário (1929-2025). Mamãe, quanta energia e quanta coragem enquanto viveu!
Este texto foi baseado na mensagem das comemorações de aniversário de seus 90 anos e que todos os anos festejávamos com alegria esses momentos lúdicos que marcaram nossas vidas, para agradecer a Deus por nos conceder tê-la conosco por longa vida, esta fantástica e corajosa mulher, minha mãe e de meus irmãos: Socorro, Salete, Sônia, Sueli, Gilberto e Flávio.
Agora, celebramos a Missa de 30 dias de sua partida, uma homenagem ao amor e à vida que nunca se apagarão. “Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda que morra, viverá.” (Jo 11, 25). Que o Divino Pai Eterno, com a intercessão de Sant’Ana, a tenha na luz eterna e na infinita misericórdia de Jesus. Amém!
Cantemos o hino de Sant’Ana para eternizar as saudades da amada Alzira!
- Texto por ocasião da Missa de Trigésimo, às 8h deste sábado, 8 de março, na Igreja de São José, em Caicó-RN, com transmissão pelo Youtube da Paróquia.
- Leia também: A professorinha isolada: homenagem à minha mãe Alzira Tavares
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