A professorinha isolada
*Por João Bosco de Araújo
Jornalista ▶ boscoaraujo@assessorn.com
Texto publicado no jornal Tribuna do Norte em 2000 e neste Blog AssessoRN.com em 2006 e 2008.
Alzira era o segundo filho do casamento de Luzia e Severino Tavares e filha única entre os outros três irmãos masculinos do casal que veio da cidade de São Mamede, no sertão paraibano, e se estabeleceu em Caicó na produção de chapéu de couro, ofício que os dois trouxeram da cidade natal e que foram os pioneiros em toda a região norte-rio-grandense, nos idos de trinta, mais precisamente no ano de 1932, quando Alzira estava apenas com três aninhos de vida.
Foi, porém, aos 16 anos, que a mocinha Alzira recebeu a incumbência de lecionar em uma escola municipal isolada, na zona rural. A jovem professora ficou hospedada na casa do Sr. Francisco Pereira, conhecido na região como Chico Francês. E era lá também onde – em uma mesa gigante – ela ensinava as primeiras lições a mais de trinta meninos e meninas que residiam em sítios e fazendas em volta, num raio de duas léguas de distância – cerca de 12 quilômetros – do local da casa-escola.
A professora Alzira Tavares já estava acostumada à sua atividade pedagógica, apesar de sua pouca idade para os padrões culturais da época e da comunidade ruralista. Seu tempo estava integrado ao ensino e quando isso não acontecia ela saía em passeio com as filhas do dono da casa – que eram muitas – visitando os vizinhos mais próximos. Era, portanto, em uma dessas caminhadas que ela gostava de passar pela construção de uma casa enorme que estava sendo erguida e nem sabia quem era o proprietário daquela obra. No entanto, sem nunca ter-se interessado pelo que estava sendo construído, ela sempre, em suas horas de lazer, teria que ir ao local da construção.
Ao passar do tempo, Alzira conhece um rapaz da localidade que era conhecido de todos e que já estava perto dos 40 anos. Apesar da diferença de idade, os dois se enamoraram e, após um certo período, já pensavam em se casar.
Dias depois, tudo estava confirmado. O noivo – o fazendeiro Pedro Salviano de Araújo – iria completar os quarenta anos no dia de São Pedro, e a noiva completaria 18 anos no mês marcado para o casamento, em abril.
No dia 26 daquele mês do ano de 1947, o juiz da cidade, Dr. Janúncio da Nóbrega, consolidava em livro cartorial na casa dos pais da noiva, no centro da cidade, o casamento civil da jovem professora e do rapaz fazendeiro. Nesse mesmo dia, Dom José Delgado – o mesmo que casara no Estado do Maranhão o então iniciante político José Ribamar de Sarney – celebrava na Capela da Casa Paroquial, na Praça Dr. José Augusto, o casamento religioso daquele rapaz idoso e daquela menina-moça que mais parecia ser a neta do noivo como afirmara em cerimônia o bispo celebrante. Dom José Delgado foi o primeiro bispo de Caicó e dos que mais trabalhou para o desenvolvimento da região Seridoense.
E quem seria portanto o dono daquela casa que a professorinha conhecera ainda em construção – e que tanto gostava de olhar em seus passeios? Por ironia do destino, aquela construção era justamente do rapaz Pedro Salviano, de cuja casa a professora fez seu lar, onde continuou a ensinar por outros anos e onde criou os sete filhos que teve ao lado do marido digno e empreendedor.
Alzira Tavares de Araújo – a professorinha e minha mãe – morou na casa-sede de sua fazenda durante 34 anos, até a morte do meu pai, Pedro Salviano de Araújo, em uma curva da BR 427, na localidade Itans, em Caicó, no ano de 1981. Hoje, aposentada, ao lado dos filhos, netos e bisnetos guarda todas essas recordações.
JBAnota - É com profunda tristeza que a família lamenta o falecimento (confira) de nossa amada mãe neste 01 de fevereiro, no Hospital Promater, em Natal/RN, aos 95 anos de intensa vida. Seu ano de batismo foi 1929, porém, ao ser registrada civilmente em Caicó/RN foi adotado o ano de 1927.
Leia também: Os noventa anos marcados na vida de uma menina-moça
Foto-arquivo com os sete filhos no aniversário de 90 anos, em 2019.
Vídeo do último aniversário, de 95 anos, em 2024:
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