“João, santo
católico, primo de Jesus Cristo, nascido a 24 de junho, degolado no castelo de
Macheros, Palestina, a 29 de agosto do ano de 31. Pregador de alta moral,
áspero, intolerante, ascético, São João é festejado com as alegrias
transbordantes de um deus amável e dionisíaco, com farta alimentação, músicas,
danças, bebidas e uma marcada tendência sexual nas comemorações populares,
adivinhações para casamento, banhos coletivos pela madrugada prognósticos de
futuro, anúncio da morte no curso do ano próximo. O santo, segundo a tradição,
adormece durante ao dia que lhe é dedicado tão ruidosamente pelo povo, através
dos séculos e países. Se ele estiver acordado, vendo o clarão das fogueiras
acesas em sua honra, não resistirá ao desejo de descer do céu, para acompanhar
a oblação, e o mundo acabará pelo fogo.
“Se São João
soubesse
Quando era o
seu dia,
Descia do
céu à terra
Com prazer e
alegria.
Minha mãe
quando é meu dia?
-Meu filho,
já se passou!
- Numa festa
tão bonita
Minha mãe
não me acordou!
Acorda,
João!
Acorda,
João!
João está
domingo,
Não acorda,
não!””
Coincide seu
nascimento com o solstício de verão (de inverno para América Austral), quando
as populações do campo festejavam a proximidade das colheitas e faziam os
sacrifícios para afastar o demônio da esterilidade, pestes dos cereais,
estiagens, etc. Toda a Europa conheceu essa tradição de acender fogueiras nos
lugares altos e mesmo nas planícies, as danças ao redor do fogo, os saltos
sobre as chamas, todas as alegrias do convívio e dos anúncios de meses
abundantes. Os deuses que recebem essas homenagens são vários mas a época é a
mesma para Ásia, África, Europa. O fogo, afugentador dos demônios da fome, do
frio e da miséria, é deus fecundador, purificador e conservador, ligado e mesmo
representante vivo dos cultos larários, penates, antepassados.
Os cultos
agrícolas foram na Europa e com informação universal, divulgados no domínio do
folclore e da etnografia, por James George Frazer, que recenseou centos e
centos de cerimônia das fogueiras votivas e festas propiciatórias em
junho-julho (Le Rameau D’Or, III, 459, e segs.) ervas que podem ser colhidas
nessa noite e possuem qualidade sobrenatural, mágica e terapêutica (518, Paris,
1911). Na Península Ibérica o culto a São João é um dos mais antigos e
populares; Portugal possuiu no espírito de sua população todas as superstições,
adivinhações, crendices e agouros amalgamados na noite de 23 de junho,
convergência de vários cultos desaparecidos e de práticas inumeráveis,
confundidos e mantidos sob a égide de um santo católico.
Para o
Brasil a devoção foi trazida pelos portugueses e espalhada com a satisfação de
um hábito agradável. A maneira de comemorara o santo era a mais sugestiva e
fácil para o proselitismo. Os indígenas ficaram seduzidos. Em 1583 o jesuíta
Fernão Cardim, indicando as três festas religiosas celebradas pelos indígenas com
maior alegria, aplauso e gosto inicial, escreveu: “A primeira é as fogueiras de
S. João, porque suas aldeias ardem em fogos, e para saltarem as fogueiras não
os estorva a roupa, ainda que algumas vezes chamusquem o couro’’. (Tratado da
Terra e Gente do Brasil, 326; Rio de Janeiro, 1925).
O Francisco
Frei Vicente do Salvador, na segunda década do séc. XVII, informava que os
indígenas “só acodem todos com muita vontade nas festas em que há alguma
cerimônia, porque são mui amigos de novidades, como dia de S. João Batista por
causa das fogueiras e capelas’’. (393, História do Brasil, São Paulo,
1918).” (Dicionário do Folclore Brasileiro)
Imagem reproduzida da internet/ Pintura:
Norival
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