“Para
tentar entender mais facilmente, vou fazer uma comparação. Nós encontramos na
farmácia um dispositivo para medir a glicose, que nos ajuda a determinar alguns
valores e os identifica no display do aparelho. Juntamente com ele, são
utilizadas algumas ponteiras — com as quais fazemos um furo no dedo e obtemos
gotículas de sangue — e umas tirinhas. Essas tirinhas colocadas no dispositivo eletrônico
são microssensores eletroquímicos. Então, o que nós desenvolvemos no
Laboratório de Eletroquímica e Aplicada, junto com o Grupo de Energias
Renováveis e Sustentabilidade Ambiental, são dispositivos como essas tirinhas,
também chamados de microssensores eletroquímicos”, explica Carlos Alberto
Martínez-Huitle, coordenador do grupo.
Docente
do Instituto de Química da UFRN, ele pontua que esses microssensores, regra
geral, são baseados na composição de diferentes materiais. Essa composição é
direcionada de acordo com a aplicação que se busca. No caso da patente Sensor
eletroquímico de cortiça em pasta de carbono, o carbono e a cortiça são os
principais componentes. Menos conhecida, a segunda é muito utilizada em
utensílios de cozinha e em alguns materiais de construção, porém é considerada
um resíduo. Para ser aproveitada na invenção, ressalta Martínez-Huitle, ela
passa por um pré-tratamento químico visando à eliminação de impurezas. “A
quantidade usada é relativamente pouca, pois com, vamos supor, um quilo de
cortiça, podemos fazer muitos desses sensores eletroquímicos. Isso sem perder
eficiência, já que a seletividade e a sensibilidade do sensor para compostos
orgânicos e inorgânicos têm sido significativamente aumentadas. Essa combinação
faz dele algo altamente econômico, fácil de usar e preparar, e, não bastasse,
multiuso na detecção de materiais”, destaca.
O
cientista acrescenta que o dispositivo pode ser aplicado na parte ambiental e
no controle de qualidade em algumas indústrias. Martínez-Huitle identifica que,
com o sensor patenteado, já ocorreram trabalhos práticos para detecção de
cafeína em fármacos e bebidas, como refrigerantes e energéticos. Ele cita
também que a nova tecnologia foi utilizada na detecção de poluentes na água.
“Durante
a pandemia, o grupo de pesquisa coletou água da Lagoa de Alcaçuz e conseguimos
detectar uma concentração diferenciada de hidroxicloroquina. Em virtude do
consumo exagerado desse tipo de fármaco durante a pandemia, quando ele era
descartado, chegava nos efluentes e ia parar na lagoa. Essa é mais uma opção de
aplicação do sensor eletroquímico”, conta o pesquisador, reforçando que as
ponteiras são desenvolvidas pelo grupo de forma recorrente, com o objetivo de
tentar entender ainda mais o funcionamento frente a outras combinações de
elementos e, assim, poder aplicar em diferentes âmbitos.
Em
vídeo, cientistas explicam alguns
aspectos adicionais da invenção.
Ao
lado de Martínez-Huitle, participaram da criação os pesquisadores Mayra Kerolly
Sales Monteiro, Djalma Ribeiro da Silva, Vítor Jorge Pais Vilar e Elisama
Vieira dos Santos. O estudo que deu origem tem ramificação pelos programas de
pós-graduação em Química, em Engenharia Química e em Ciências, além de
Engenharia de Petróleo e Energia. Para o grupo, proteger a tecnologia com o
patenteamento é também traduzir o que é feito no laboratório em uma aplicação
real, além de ser um caminho para a comercialização da invenção ou de parte
dela. Segundo os cientistas, isso implica aproveitar a tecnologia com um
impacto social, bem como ajuda a motivar os alunos e colegas a alcançarem
maiores TRLs nas pesquisas no laboratório. O TRL é o Nível de Maturidade
Tecnológica (sigla em inglês) e vai de um a dez.
“Quando
o TRL vai aumentando e ultrapassa o nível de seis ou sete, estamos falando de
um dispositivo que já pode ser comercializado, que já podemos colocar na
prateleira, disponibilizar na indústria, que tem uma aplicação real e
comercial. Então a invenção tem proporcionado ciência de qualidade no
Laboratório de Eletroquímica Aplicada e, quanto mais nos aprofundarmos, como
fazemos, mais a tendência é aumentarmos esse marcador do TRL”, finaliza Carlos
Alberto Martínez-Huitle.
Números
da UFRN
Chegando
agora a 74 cartas-patente, a invenção passa a compor a Vitrine Tecnológica da UFRN, grupo de inovações que abrange tanto
os programas de computador registrados quanto as patentes concedidas e as novas
tecnologias em fase de depósito. Embora essa última distinção exista, não há
empecilho para a utilização das tecnologias pelo setor produtivo, já que o
depósito de pedido de patente é o primeiro passo para garantir direitos de
comercialização exclusiva, por um determinado período, de uma nova invenção com
aplicação industrial.
O
depósito em si já propicia a alternativa de transferência de tecnologia com as
proteções estabelecidas na legislação. Na UFRN, a Agência de Inovação (Agir)
tem a responsabilidade de dar suporte aos pesquisadores desde o depósito até os
trâmites seguintes, como a resposta aos questionamentos dos analistas do Inpi e
o pagamento das taxas junto ao Instituto. O passo inicial para tudo se chama
notificação de invenção, que pode ser feito pelo Sigaa, na aba Pesquisa.
“Nosso objetivo é fazer com que as tecnologias criadas na UFRN alcancem as pessoas, melhorando a qualidade de vida da população e contribuindo para o desenvolvimento sustentável do nosso país. Para isso, a Agir estimula que sejam firmados cada vez mais contratos de transferência de tecnologia com empresas já atuantes no mercado ou que os pesquisadores e alunos elaborem novos negócios. O licenciamento é realizado após um processo de negociação com a empresa interessada, que se compromete a remunerar adequadamente a Universidade por esse acesso. Os recursos obtidos, por sua vez, são uma importante fonte de financiamento para novas pesquisas básicas e aplicadas, além de proporcionarem maior aproximação entre a UFRN e as empresas, gerando novas oportunidades para nossos alunos e pesquisadores”, defende Jefferson Ferreira de Oliveira, diretor da Agir.
A
Unidade é também a responsável, no âmbito da Universidade, por promover e
acompanhar o relacionamento com empresas, em especial aquelas interessadas em
desenvolver novas tecnologias em parceria ou em transferir tecnologias já
desenvolvidas pela UFRN.
Wilson
Galvão- Jornalista DRT-RN 1340/Assessor de Comunicação AGIR/UFRN
Foto:
Cícero Oliveira/UFRN
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