Cinema no Alecrim
Por
Anchieta Fernandes*
O
filme que mostrou, naquela sessão inaugural de cinema falado, aos natalenses –
dentro de um novo contexto de objetivos que prosseguiria nos dias, meses e anos
seguintes, tirando de vez a era do cinema mudo em nossa capital, e despertando
a concorrência da Empresa Cavalcanti & Cia., proprietária dos cinemas
Politeama e Royal, e que pela mesma época anunciava a próxima inauguração de
filmes falados nos referidos cinemas – foi “General Crack”, da Warner Brothers,
um musical colorido, apresentando legendas em português e o trabalho de
intérprete de John Barrymore.
O
sistema Vitafone, reproduzindo o som de uma orquestra de 60 professores, veio
acabar em Natal com a era das orquestras ao vivo, tocando por trás da tela. E
serviu para que o poeta Jaime Wanderley, em artigo publicado no jornal “A
República” de 12 de abril de 1931 (“As Cintas Sonoras””) já defendesse filmes
falados em português, que “agradarão melhor, mesmo porque, são para o gosto e
senso estético e artístico de nossa sociedade.”
O
que é inegável é que as sessões normais (7.30 da noite), as “soirées elegantes”
(08 da noite) e as vesperais (05.30 da tarde) do Cine São Pedro, em filmes
falados/musicados, vieram animar muito o setor de divertimentos do Alecrim.
Anos e anos a velha casa de espetáculos foi ponto de encontro de gerações, e
quando passou a exibir matinês, em sessões matutinas aos domingos, a criançada
decidiu também formar em sua calçada o mercado sui-gêneris de troca, compra e
venda de revistas de estórias em quadrinhos, precursor dos sebos natalenses.
Mas
o São Pedro não foi o único cinema no bairro. Antes, a 07 de outubro de 1923,
no Alecrim já fora inaugurado o Cine José Augusto. Anos depois, mais outro
cinema alecrinense foi inaugurado: o Cinema São Luiz, que foi chamado “Palácio
Encantado do Alecrim”, inaugurado no sábado, 26 de outubro de 1946, com o filme
“Amar Foi Minha Ruína” (do diretor John M.Stahl). Depois de anos e anos
divertindo e educando o povo, em meados dos anos 60 o seu proprietário, Senador
Luiz de Barros, vendeu o prédio ao Banco do Brasil (ao preço de 500 cruzeiros),
e o palácio encantado desencantou-se, encerrando suas atividades a 07 de março
de 1974 (uma quinta-feira), com a apresentação do filme “A Morte em Minhas
Mãos” (dublado em inglês com o título “The Chinese Boxer”), filme feito em
Hong-Kong, produzido pela Companhia Show Brothers Company, dos irmãos Rumne e
Run Run.
O
Cine Alecrim, por sua vez, é do ano seguinte. Este cinema, de propriedade de
Cristóvão Bezerra, e instalado à Praça Gentil Ferreira, com 400 plotronas, foi
inaugurado no sábado, 13 de setembro de 1947, com o filme “Perseguidos”, onde
se destacavam os astros Errol Flyn e Helmut Dantine. A sessão inaugural
começando às 3.20 da tarde, com o público pagando Cr$ 2.40 pelo ingresso (mas
com a possibilidade de algumas pessoas ganharem “valioso brinde”). Neste início
do Cine Alecrim foram apresentados em seus salões, além de filmes, shows com
cantores, mágicos e um deles com um recital de Zé Praxedes – o “poeta
vaqueiro”.
Outros
cinemas tradicionais se conta na história do bairro que Palmira Wanderley
chamou poeticamente “bairro do samba, da folia/Das advinhações e da
magia/...bairro da feira domingueira,/Numa algazarra louca.” Um cinema
tradicional: o São Sebastião, existindo na Rua dos Paianazes. Outro: o
Paroquial, ao lado da Igreja de São Pedro, inicialmente pertencendo à paróquia,
como o próprio nome diz. Deste, derivou o Cinema Olde, que foi inaugurado no
sábado, 17 de janeiro de 1970, inicialmente passando filmes de 16mm.
A
17 de outubro de 1991, à Avenida Coronel Estêvam, foi inaugurado o Cine
Espacial, com o filme “Darkman – Vingança Sem Rosto”. O proprietário do Cine
Espacial era o Sr. Erinaldo Bezerra da Silva, e o gerente Vinício Canindé
Fernandes. Mas este cinema durou pouco tempo.
Esta,
a história cinematográfica do bairro pioneiro em cinema falado para o
espectador natalense. Uma história que falta ser completada: quando algum
cineasta se interessar em documentar a paisagem humana e sócio-cultural das
suas feiras, da vida no centro comercial, dos tipos humanos, dos variados tipos
de habitações, das suas festas (profanas e religiosas), até mesmo da forma de
agir dos seus marginais – em fim, da psicologia e filosofia de vida de um povo
que mescla raças e simboliza estratos sociais dos mais simples.
*Anchieta Fernandes –
Escritor, pesquisador especialista da arte cinematográfica / Publicação do Jornal Zona Sul.
Foto
de arquivo reproduzida da Internet/bairro Alecrim
©2020 www.AssessoRN.com | Jornalista
João Bosco Araújo - Twitter @AssessoRN | Instagram.com/assessorn
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