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domingo, 5 de julho de 2015

Memórias de uma república de estudantes e um consulado caicoense

Um Consulado Caicoense na vida universitária 

Por João Bosco de Araújo
Jornalista boscoaraujo@assessorn.com  

Foto: acervo Google/divulgação
A população universitária brasileira não chegava a 2% naqueles finais de anos da década de 1970. Sentar-se num banco de uma faculdade era privilegio de poucos e vontade de muitos, a tentar conquistar uma vaga no sonhado mundo acadêmico. A disparidade de alunos fora de cursos superiores era grande, mas acreditava-se que o caminho era buscar meios de enfrentar obstáculos e ter como meta passar no vestibular, virar um “fera”, mesmo que não fosse um cdf. No Seridó, a região ficou famosa por exportar estudantes “cobras” com títulos de 1º lugar em concursos vestibulares, fosse em Natal, Campina Grande (PB), Recife (PE) ou outros pólos universitários de outras regiões. Ainda na década, Caicó e Currais Novos ganharam núcleos universitários, abrindo as oportunidades de crescimento de matriculas, iniciando o processo de expansão.

Em campina Grande, cidade próspera do Cariri paraibano, centro de um vasto número de faculdades e bem mais próximo em distância para o Seridó do que para a nossa capital potiguar, tornou-se destino certo para estudantes da região na busca de uma vaga nos cursos oferecidos de nível superior, cujas opções eram maiores em universidades particulares e propriamente nas públicas. Na época como não existiam, na cidade, residências universitárias, os estudantes alugavam imóveis para suas hospedagens e locais de estudos.

Diante dessa possibilidade, ficou conhecido na avenida Maciel Pinheiro, mais especificamente no Edifício Palomo, centro de Campina Grande, o famoso “Consulado Caicoense”, local exclusivamente reservado para os estudantes provenientes da “Rainha do Seridó”. Eram dois apartamentos, situados no último andar do edifício, entre escritórios advocatícios, consultórios médicos e representantes comerciais. Além de sede “oficial” da turma estrangeira acadêmica, o “Consulado” era parada obrigatória dos caicoenses estudantes das universidades de Recife, em Pernambuco, e de João Pessoa, na capital paraibana.

Nessas paradas em trânsito, nunca faltava o tal do carteado, acompanhado de uns aperitivos e petiscos, esperando o horário do ônibus que partia para Caicó no outro dia bem cedo, cuja rodoviária ficava poucos metros dali, por trás do velho Palomo. Entre os períodos de 1977 a 1978, residiam no apartamento com frente virada para a rua Maciel Pinheiro os estudantes Diógenes Fernandes; Reginaldo Clemente, acadêmicos de engenharia civil; Adonias Melo Filho, concluinte de medicina; e este escriba, nos primeiros anos de jornalismo. Na outra ponta do pavimento, residiam Eli Mariano (Engenharia de Minas), Francisco Dantas (Engenharia Mecânica) e João Medeiros (Engenharia Química), além de caicoenses que moravam na cidade e visitavam assiduamente o Consulado, como Plínio Lobo (“Primo”), Hudson Araújo, ambos estudantes de engenharia. No ano seguinte chegava para cursar engenharia de Minas, meu primo Eugênio Pacelli Tavares de Araújo.  

Como de praxe, ao chegar para fixar residência, cada estreante recebia de imediato um apelido, batizado pelos mais antigos. Eugênio era “O Fera”, Reginaldo, tinha nome de “Toré”, Adonias, “Mão de Onça”, irmão de “Vaca-Véia” (Tarcísio Melo) e “Bala-Choca” que estudavam em Recife. Francisquinho Dantas era “Chico Traço-Traco”, João Medeiros, “João Banana”, e “Burrão” (Murilo Jorge), que foi fazer Agronomia em Areia, irmão de Manoel “Canjinha”. “Pirinha” (José Benévolo) e outros caicoenses cruzaram o Palomo da “Rainha da Borborema”. Já o meu apelido, quem me batizou foi Toinho de Aníbal e fiquei “C.Pinho”, embora a idéia grafada seja minha.

Outro a passar no “Consulado” foi Edílson Galvão, que virou o “Bacharel”, e logo foi transferido para Natal, onde concluiu o curso de Ciências Sociais. “Bacharel” pretendia trilhar as causas jurídicas e sua paixão era ser advogado, tanto que por muitas vezes fomos surpreendidos por seus discursos inflamados em cima de uma cadeira de um bar em uma esquina qualquer de Campina Grande, a proclamar contra a ditadura. Quem sabe, sob os olhares e ouvidos dos “dedo-duro”.   
     
Até o ano de 1980, período de conclusão do meu curso de jornalismo, outros estudantes trilharam a residência “diplomática” do Palomo. Ainda como aluno colegial Job Torres foi um deles, a cursar na escola técnica do tradicional Colégio Redentorista de Campina Grande. A partir do final dos anos oitenta e início da década de 1990, o local foi praticamente esvaziado, consequência de novos modelos de residências para universitários, através da implantação de moradias nas próprias universidades.

Interessante ressaltar que na portaria da recepção do edifício Palomo constava na lista do quadro de andares e apartamentos, o nome destacado em letras grandes pintadas de negrito: “Consulado Caicoense”. Agora um consulado de boas recordações.

*Texto originalmente publicado no Diário de Natal em março de 2009.

> Leia sobre outro componente do Consulado Caicoense: Miquéas, “Maicon Jegue” não morreu!

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