Há pouco mais de um ano, o jornalista Flávio Rezende
publicava artigo homenageando o seu pai Fernando Rezende e dizia “Para que meu
pai leia em vida”. Neste sábado (16), o Dr. Fernando partiu, perto de completar
90 anos. O velório ocorre no Morada da Paz da rua São José, em Natal, e o sepultamento,
conforme divulgado, será na manhã deste domingo. Leia, abaixo, o texto
carinhoso e emocionante do filho:
Para que meu pai leia em
vida
Não tenho dúvida nenhuma
que alguns leitores vão me considerar doido com a leitura do presente
“escrito”, como costumo descrever as coisas que produzo para jornais e sites da
internet, além de publicar em livros.
Não me incomodo, doido
mesmo é o amor que sinto por meu pai, motivo deste atual “escrito” e, vou
revelar logo de cara o motivo. Meu querido e amado pai já chegou à idade dos 88
anos e, está bem de saúde, mas, não preciso dizer que é uma idade bem avançada,
o que pode levá-lo a um desencarne repentino, levando em conta ser meu amor já
portador de diabetes, hipertensão, vários stents, marca-passo e ter
entupimentos bem comprometedores e sérios.
Por causa do exposto,
muitas vezes me pego pensando no “escrito” que vou produzir quando o adeus for
uma realidade, sempre imaginando se ele vai de alguma maneira ler o mesmo.
Não gosto de hipocrisia
e costumo ser bem objetivo em minhas coisas, por isso, revelo que a fé que
tenho no espiritismo não é 100%, confesso que, quando penso se papai vai ou não
ler o que escrevi para ele no pós-morte, sinto um vacilo e, admito que isso
possa não acontecer de fato.
Diante desta dúvida
atroz, decidi escrever antes do desencarne, para ter a certeza que ele leu
mesmo e, assim, não carregar esta dúvida eternamente. Antes de escrever,
gostaria de declarar aqui que, todas aquelas coisas que muitos se arrependem de
não terem feito aos entes queridos em vida, eu faço. Telefono para meus pais
praticamente todos os dias, participo de partilhas diversas sem contestação e
com alegria, levo para consultas, durmo no hospital, digo que amo, faço cartões
nos dias especiais e, procuro ter uma conduta ética e moral aceitável em nosso
contexto social, agradando assim o seu ser que não encontra no meu, problemas e
desvios de conduta, que muitas vezes entristece e encurta a vida dos pais
queridos e preocupados com a prole.
Meu querido e amado pai,
fique sabendo que não existe um fim, quando em sua jornada foram plantadas
roseiras que exalarão eternamente o doce perfume dos bons valores na vida de
todos aqueles que com ti tiveram profícuo contato.
O choro inevitável é
apenas o líquido que rega essas roseiras e, os soluços momentâneos, só revelam
os terremotos interiores que nos sacodem nestes rituais de despedida tão
difíceis, porem, culturais e necessários.
Meu inesquecível e
professor pai, essas roseiras que cultivou no jardim de sua existência são tão
significativas para este filho que o ama tanto, que ao me aproximar de um grupo
de dentistas, sentirei ali o perfume adocicado de sua valiosa contribuição a
esta área, tendo sido o orador da primeira turma de Odontologia da UFRN,
exercido vários cargos nas entidades classistas, recebido todas as honrarias
locais e nacionais da profissão, além de ter uma sala em seu nome na sede da
ABO/RN. O senhor nunca foi um dentista qualquer, foi no consultório um
competente e elogiado profissional liberal, que extrapolou o conforto do lar e
serviu a Odontologia sem ganhos extras, com muitas horas de serviço voluntário
produtivo e eficaz.
Meu estimado e correto
pai, quando este seu neófito filho entrar numa agência qualquer do Banco do
Brasil, sentirá o suave perfume de sua valiosa colaboração a esta entidade
nacional, igualmente exercendo vários cargos dentro e fora do banco, tendo sido
presidente e diretor da AABB, além de fundador da CASSI, entre outras valiosas
colaborações que a categoria sabe e reconhece, dai as muitas placas e
condecorações recebidas.
Meu atuante e
maravilhoso pai, quando este filho aprendiz observar as unidades militares da
vida, poderá perceber no ar o forte cheiro do perfume que revela sua passagem
por este setor da sociedade brasileira, sendo reverenciado em desfiles
militares como dos últimos a compor a Força Expedicionária Brasileira, com o
destaque de ter seu nome e foto dando nome a sala dos alunos do NPOR do 16º RI.
Meu simpático e bem
humorado pai, os melhores perfumes das mais badaladas roseiras vão estar ainda
pairando na turma de hidroginástica do professor Milton na Praia do Forte, nas
salas dos cinemas que frequentou com assiduidade de cinéfilo, nas reuniões
diversas que participou em muitos momentos de sua vida, seja no prédio onde
mora, no Lions, Rotary, Igreja Católica e, principalmente, nas
confraternizações com seus filhos, todos nós loucos de amor e de paixão pelo
senhor e por sua conduta moral, sua humildade, sua serenidade, sua
prestimosidade.
Sei que por ter o dom da
escrita, teria eu a missão dessa confissão pública de amor, sabendo também ser
porta-voz dos manos Júlio, Leila, Fernandinho, Lila e Jorge, pois, quando
estamos nós a confabular as coisas da vida, é unanimidade o carinho que todos
temos pelo senhor Fernando Rezende e por mamãe Miriam, dupla que nos trouxe ao
mundo, para que de camarote pudéssemos assistir a uma verdadeira aula de amor
aos filhos.
Então pai, quando a hora
chegar, chorar, soluçar será inevitável, mas, temporário, o que vai ficar
mesmo, é esse perfume que o senhor exala e que nos torna cada vez mais felizes
de termos encarnados em meio a um roseiral tão maravilhoso.
De onde esteja, vendo
tudo ou não, torça para que os espinhos que também estão presentes no roseiral
afugentem todos os males que queiram por ventura, se aproximar.
Seu perfume vai estar
sempre por ai, doce e querido pai. Todos nós te amamos ad infinitum.
*É escritor, jornalista
e ativista social em Natal/RN (escritorflaviorezende@gmail.com)
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