acesse o RN blog do jornalista João Bosco de Araújo [o Brasil é grande; o Mundo é pequeno]

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Memória: Manoel de Neném, um eterno folião

Manoel de Neném, um eterno folião

Por Ciduca Barros*

Meu pai adorava um carnaval e era um grande folião. Aliás, para quem vivia o ano todo numa constante alegria, o carnaval servia apenas para tornar mais intensa a sua folia. Por ocasião dos festejos momescos, ninguém contasse com ele para nada. Lembro-me de que, certa época, a sua situação financeira não andava bem das pernas, quando chegou o carnaval. Na sexta-feira à noite, ele começou seus preparativos para os dias de troça. A minha mãe, uma real conhecedora do seu aperto financeiro, vendo os seus preparativos, perguntou:

Você vai brincar o carnaval, Manoel?
Vou sim, Chiquinha. E por que não?
E as contas que você tem pra pagar? –ela perguntou, com surpresa,
E ele deu uma resposta que retratou bem a sua índole relaxada e que eu jamais a esqueci:
Até Quarta-feira de Cinzas é feriado, mulher! Os bancos e os cartórios estão fechados.
E perguntou, sorrindo muito:
Como meus títulos serão protestados?

Dado à pândega, como ele sempre foi, fundou uma escola de samba (Unidos na Folia) e no carnaval gostava de se disfarçar de mulher. Foi, durante vários carnavais, a esposa do Zé Pereira (quem não se lembra do Bloco do Zé Pereira, que desfilava na madrugada do sábado de carnaval?). Nas suas inúmeras viagens a São Paulo, ele comprou todos os apetrechos para a sua fantasia: tranças compridas, seios postiços, sapatos altos (tamanho 41) e outras peças da indumentária feminina. Ele era um homem alto (1,76 metros), moreno e pesado (tinha 120 quilos), portanto ficava uma volumosa mulata.

Certo carnaval, a sua escola de samba “assaltou” (quem não se lembra dos assaltos carnavalescos?) a casa do senhor Manoel Torres de Araújo, comerciante de renome em Caicó, que foi duas vezes prefeito municipal e quatro vezes deputado estadual, exemplo de político íntegro, recentemente falecido e que era muito amigo dele.

No momento do assalto, o senhor Paulino Torres, o patriarca da família Torres, na ocasião um homem com quase 80 anos, estava na casa do filho.

O meu pai, devidamente travestido de mulher e, naturalmente, disfarçando a voz, fez uma festa com o velho Paulino Torres e o encheu de carinhos.
Abraçou-o. Beijou-lhe a cabeça. Sentou no seu colo.
Quando o bloco partiu, o velho demonstrando que havia gostado daquelas carícias femininas, perguntou ao seu filho:

Manoel, quem era aquela morena tão fogosa?
Era Manoel de Neném vestido de mulher, papai.
O velho Paulino Torres, rapidamente, mudou o semblante de felicidade para revolta e bradou:
Vou mandar matar aquele negro filho da puta!.

*Escritor, funcionário aposentado do Banco do Brasil e colaborador do Bar de Ferreirinha (página do post)
Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial

Um comentário:

Copyright © AssessoRN.com | Suporte: Mais Template