A CAMINHO DAS ÁGUAS DO SÃO FRANCISCO
1 - INTRODUÇÃO
A Província Eclesiástica do Rio Grande
do Norte mobiliza-se para se comprometer, ainda mais, com a dura complexidade
do semiárido nordestino, em especial da escassez de recursos hídricos. Esta é
uma tradição que remonta ao século passado e que se solidificou como uma das
características da Igreja potiguar, estendendo-se às mais diversas realidades
de vida do povo, sobretudo dos mais pobres. Da educação ao sindicalismo, da
saúde à politização, da religião à economia, do lazer à melhoria da produção agrícola.
Tudo que diz respeito às pessoas é assumido pelo Povo de Deus como de sua
responsabilidade.
Terá início no próximo dia 29 de
fevereiro uma viagem apostólica de um grupo de bispos pelos Estados do Nordeste
Setentrional com o objetivo de melhor conhecer os planos governamentais sobre a
transposição do rio São Francisco, inteirar-se dos estudos e reflexões sobre as
repercussões desta intervenção e delinear o papel da Igreja neste momento da
vida do povo nordestino.
Com a finalidade de me preparar para
participar da, assim denominada, Caravana Socioambiental, honrado que fui com o
convite para integrá-la, escrevo estas reflexões para ajudar na explicitação
dos seus objetivos e melhor apreensão dos desafios emergentes.
A grave seca vivida no Nordeste nos
últimos anos, a iminente chegada das águas da transposição do Rio São Francisco
e os exemplos do Papa Francisco inspiram essa iniciativa que é assumida por
Bispos das dioceses do Regional Nordeste 2 da CNBB.
A viagem começa na Barragem Armando
Ribeiro Gonçalves, passando pelas obras de construção da Barragem Oiticica,
ambos em nosso Estado. Estão previstas paradas em barragens, reservatórios e
vilas produtivas ao longo do Canal Norte da transposição, tanto no Paraíba quanto
no Ceará e em Pernambuco. Nestes locais haverá momentos de celebrações, de
estudos e de contatos com a população local.
Os bispos serão acompanhados por seus
assessores diocesanos, por técnicos dos Ministérios responsáveis pelas obras,
por representantes dos Governos estaduais e de entidades públicas e por
especialistas em questões hídricas e afins ligados às Universidades e
organismos da sociedade civil.
As razões que mobilizam a Igreja a se
engajar na luta por soluções duradouras para a questão hídrica no Nordeste
brasileiro inspiram-se em valores eternos do Evangelho, em traços de sua
história do passado e do presente e nos desafios propostos pelo Papa Francisco.
Os fiéis, desejosos de integrar uma comunidade religiosa sempre mais comprometida,
com alegria, esperam que seus pastores os conduzam a “águas mais profundas”.
2 – “DAI-LHES VÓS MESMOS DE
COMER.” LC. 9,13
Assim ordenou Jesus aos seus
discípulos, antes d’Ele próprio realizar o milagre da multiplicação dos pães.
Dai-lhes vós mesmos de beber é o desafio repassado à Igreja do Nordeste. Este
milagre se realizará pela conscientização das pessoas, pela organização dos
grupos e comunidades e pela execução de políticas públicas capazes de superar o
grave problema hídrico.
Com satisfação constata-se a
existência de tecnologias adequadas e de recursos suficientes, insumos
indispensáveis ao milagre da multiplicação das transformações. Há séculos, no
entanto, a sociedade padece com a ineficiência dos gestores públicos. Faltam-lhes
vontade e compromisso patrióticos para implementar as políticas de convivência
com a seca, transformando o semiárido nordestino em oásis de qualidade de vida.
“Dai-lhes vós mesmos de beber” é a
ordem de Jesus a nós, Povo de Deus, seus seguidores. O próprio Mestre se
encarregou de ampliar este desafio quando estabeleceu como critério de adesão à
Sua mensagem a atitude de suprir as necessidades vitais dos pobres. “Quando,
Senhor, te vimos com sede e te demos de beber? ... Sempre que o fizestes a um
dos mais pequeninos, a Mim o fizestes”. Mt. 25,31.
3 – A TRADIÇÃO DA IGREJA POTIGUAR
E DO NORDESTE
O desafio de contribuir para a
realização do milagre da transformação da vida dos nordestinos plasmou o perfil
da Igreja do Nordeste e Potiguar. Os exemplos de homens como o Padre João Maria
Cavalcanti, em Natal, o Padre Cícero Romão Batista, em Juazeiro do Norte,
Antônio Conselheiro, em Canudos, na Bahia e Padre José Maria Antônio Ibiapina,
na Paraíba, marcaram a religiosidade do nosso povo. A eles se associaram na
modernidade, personalidades como Dom Helder Câmara, Dom Eugênio Sales, Otto de
Brito Guerra, Ulisses Celestino de Góis, Irmã Neusa Leite Moreira e tantos
outros, mulheres e homens, de inestimáveis testemunhos de doação aos preferidos
do Senhor.
Esta rica tradição de comprometimento
da fé com a vida mobilizou gerações de cidadãos a se engajarem na construção de
instituições voltadas para a melhoria da vida das pessoas.
Neste ano de 2016, celebramos 60 anos
do 1º Encontro dos Bispos do Nordeste com o Presidente da Republica, Juscelino
Kubitscheck, em Campina Grande, PB. Dessa reunião nasceu a SUDENE, responsável
por décadas de desenvolvimento regional. Em nome de um ideal de justiça e de
fraternidade, centenas de técnicos da melhor qualidade se mobilizaram para
transformar o Nordeste em uma região que oportunizasse bem estar à maioria. Se
muito mais não se realizou se deveu à desonestidade de detentores do poder que
não se envergonharam em desviar os recursos públicos destinados à digna
sobrevivência de milhares de irmãos em benefício de seus interesses econômicos
e politiqueiros
A história dos recursos hídricos do Rio
Grande do Norte registra a heroica luta do Monsenhor Expedito Sobral de
Medeiros pela implantação de um programa estadual de águas. Sua persistência se
concretizou na construção de três adutoras, uma das quais leva o seu nome como
o “Profeta das águas”.
Um grupo de padres da Diocese de Natal,
em fevereiro de 1962, se deslocou até a cidade de Paulo Afonso, Bahia, para
conhecer as instalações e as propostas da Companhia Hidroelétrica do São
Francisco – CHESF. Lutava o Rio Grande do Norte por trazer a eletricidade para
o Estado, uma vez que havia sido excluído no plano inicial de distribuição.
Motivados pelas mudanças radicais que o fornecimento de energia elétrica barata
e contínua causaria à vida do povo, os padres decidiram enfrentar a nova
realidade e se preparar para desempenhar o papel que cabia à Igreja naquela
nova realidade. No primeiro dia de estudos, ouviram os técnicos. No segundo,
refletiram sobre as implicações pastorais das mudanças anunciadas e no último
elaboraram um plano de ação e uma mensagem esclarecedora ao Povo de Deus.
Esta viagem apostólica ao encontro das
águas dá prosseguimento à tão rica tradição. Atenta aos sinais dos tempos, a
Igreja se habilita a ser fator de desenvolvimento para todos, sobretudo para os
mais pobres, a quem a falta de recursos hídricos provoca sofrimento e perdas
desesperadoras.
4 – A TRANSIÇÃO:
DO SOFRIMENTO ÀS SOLUÇÕES
DO COMBATE ÀS SECAS À CONVIVÊNCIA COM O
SEMIÁRIDO
Há séculos, a seca ocupa lugar de
destaque na vida da nação brasileira. Depois da célebre estiagem de 1877, o
imperador prometeu, até, vender as joias da coroa para solucionar a causa do
morticínio de milhares de brasileiros. No século passado, prevaleceu a política
de combate à seca, tão bem representada no nome do órgão responsável pela execução
das medidas programadas: Departamento Nacional de Obras contra as Secas –
DNOCS. A implantação de uma rede de açudes se constituiu na ação mais
relevante. No pico das crises, criavam-se as Frentes de Trabalho, como forma
organizada de acudir à população faminta e impedir os saques às feiras e ao
comércio das cidades interioranas.
Infelizmente, os resultados
mostraram-se inexpressivos não somente em decorrência da equivocada proposta de
lutar contra a natureza, como também, pela péssima gestão dos recursos
alocados, tão expressivamente batizada como “indústria da seca”. Ou seja,
tornou-se possível estruturar um sistema de desvio dos recursos em benefício
dos detentores de poder, em todas as instâncias. Os políticos federais,
estaduais e municipais escreveram uma página de atuação vergonhosa,
fortalecendo os currais eleitorais e locupletando-se dos recursos destinados
aos pobres e flagelados.
Nos últimos anos, as políticas de
distribuição de renda modificaram o perfil da seca. Não mais se vêm multidões
de famintos vagando de uma cidade a outra, saqueando o comércio e as feiras.
Acabaram os barracões para a venda de alimentos. As frentes de trabalho
perderam sua função. No entanto, as consequências na atividade econômica
persistem devastadoras, seja pela perda das culturas agrícolas seja pela
drástica diminuição dos rebanhos.
Neste contexto, o Governo Federal
retomou a ideia da transposição das águas do Rio São Francisco. A sociedade se
dividiu. Um acalorado debate se estabeleceu nas instâncias políticas,
econômicas, religiosas, técnicas, universitárias e sociais. Posições as mais
antagônicas expressaram interesses, ideologias, visões técnicas e estratégicas.
As ideias saíram do papel e entraram em execução. A transposição só não está em
funcionamento devido à sistemática corrupção adotada, de novo, em todas as
instâncias de poder. As consequências desta vergonhosa sistemática de assalto
ao patrimônio público se refletem no aumento do orçamento da obra, na duvidosa
qualidade dos serviços prestados e no adiamento, por anos, do início dos
benefícios que o sertanejo tem direito a receber.
A sociedade civil se mobilizou e
mostrou sua força. A partir da proposta de convivência com o semiárido em
contraposição à política governamental de combate à seca, levou adiante a
cultura de armazenamento da água e sistematizou o Programa Um Milhão de
Cisternas, o P1MC. A ideia tornou-se uma política do Governo Federal, sediada
no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome - MDS. A Articulação
do Semiárido Brasil – ASA, constituída por uma rede que congrega mais de três
mil organizações da sociedade civil, de distintas naturezas, lidera
significativa mudança de conceitos, paradigmas, metodologias e ideais.
O P1MC já construiu 578.669 cisternas
de placa com capacidade para 16 mil litros, o que representa benefícios
expressivos para as famílias e para as comunidades rurais, como o aumento da
frequência escolar, a redução de doenças em virtude do consumo de água de má
qualidade e a diminuição da sobrecarga de trabalho das mulheres nas atividades
domésticas.
O sucesso alcançado possibilitou
estruturar um novo desafio: o de prover água para a atividade rural. A ASA
criou o Programa Uma Terra e Duas Águas, o P1+2, ou seja, o que a família
necessita para sua sobrevivência: terra para plantar e criar e água para
cultivar e manter vivas as plantas e os animais. A metodologia é a mesma
promovendo o fortalecimento dos processos educativos, socio-organizativos e
políticos locais, contribuindo para a autonomia e o protagonismo dos
agricultores e suas organizações na construção do desenvolvimento sustentável.
Já foram construídas 87.087 cisternas de uso familiar, com capacidade para 52
mil litros, e 1.316 de uso comunitário.
Perseguindo a diretriz de ocupar todos
os espaços possíveis, a ASA intuiu a possibilidade de aproveitar o tamanho dos
telhados das escolas para armazenar água. Assim, surgiu o Projeto Cisternas nas
Escolas onde já foram implantadas 3.061. A convivência das futuras gerações com
esta revolucionária tecnologia de estoque e uso de água e de organização
popular plasmará uma nova cultura de convivência com o semiárido e de exercício
consciente da cidadania.
A mais nova conquista é o Banco de
Sementes do Semiárido. Sua concepção se assenta na estratégia de resgate e
valorização do patrimônio genético, através do fortalecimento das práticas já
existentes de auto-organização comunitárias.
Assim, milhares de nordestinos avançam
do cruel sofrimento causado pela ausência de chuva para uma postura proativa de
explorar as potencialidades do semiárido.
5 – A PRIMAVERA DO PAPA FRANCISCO
O novo tempo liderado pelo jesuíta de
alma franciscana amplia as responsabilidades dos cristãos pelos destinos da
“casa comum” e por dignas condições de vida de cada pessoa. Seus documentos – Evangelii
Gaudium e Laudato Si – suas mensagens e, sobretudo, suas atitudes revelam um
constante chamamento para que toda a Igreja se comprometa, sempre mais, com as
periferias esquecidas. Por prudência, o Papa nunca explicita a inspiração de
suas atitudes. Numa homenagem aos formuladores da Teologia da Libertação, tenho
a alegria de constatar que o Santo Padre transforma em atitudes a opção
preferencial pelos pobres. As exigências do diálogo proposto entre a fé e a
vida induzem a um íntimo relacionamento entre as verdades evangélicas e as
realidades do dia a dia das pessoas e comunidades.
Francisco no seu discurso desses dias,
falando aos Bispos do México, chamou a atenção para a necessidade da
proximidade com as circunstâncias de vida das pessoas: “Só uma Igreja que saiba
proteger o rosto dos homens que vêm bater à sua porta, será capaz de lhes falar
de Deus. Se não decifrarmos os seus sofrimentos, se não nos dermos conta das
suas necessidades, nada poderemos oferecer. A riqueza de que dispomos flui
somente quando encontramos a pequenez daqueles que mendigam... .”
A mensagem mais apropriada do Papa
Francisco para o Nordeste que esperamos construir a partir da chegada das águas
do Velho Chico, vem do Segundo Encontro Mundial dos Movimentos Populares,
realizado na cidade de Santa Cruz de la Sierra, por ocasião de sua visita
apostólica à Bolívia “Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em
grande medida, nas mãos de vocês, na capacidade de vocês se organizarem e
promoverem alternativas criativas na busca diária dos ‘3 T’ (trabalho, teto,
terra), e também na participação de vocês como protagonistas nos grandes
processos de mudança nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!”.
6 – O NOVO NORDESTE POSSÍVEL
As águas vão rolar. Muitos dos nossos
rios deixarão de ser intermitentes e passarão a perenes. Uma realidade sonhada
por tantos e um direito fundamental para a fruição da qualidade de vida digna
das pessoas, dos animais e das plantas. Infraestrutura básica indispensável para
implantar em definitivo a cultura da convivência com o semiárido, dele cuidar e
desfrutar de todas as suas potencialidades.
Momento apropriado para abandonar em definitivo as medidas paliativas de
combate às secas.
A construção do novo Nordeste desejado a
partir da oferta regular de água implica em trabalho persistente de tornar
realidade as possibilidades que se apresentam. São as políticas públicas, há
muito anunciadas e nunca implantadas. Mas, não é só. O novo Nordeste deve se
estruturar em torno de outros valores, a partir da conscientização das pessoas,
do fortalecimento dos grupos e da organização da sociedade como elementos
fundantes de uma democracia participativa. A mobilização das minorias
militantes de um novo mundo possível deve se fortalecer, uma vez que para as
mudanças necessárias não há vontade política, nem recursos públicos, nem
incentivo dos formadores de opinião.
Esta viagem, organizada pelos Bispos,
representa o momento de convocação de pessoas e entidades, de estudo das
possibilidades existentes e de planejamento das ações possíveis. Dela
participam dezenas de mulheres e homens, vinculadas a diversas instituições,
publicas e privadas, motivadas pelo valor da fraternidade e da justiça. Todos
atentos ao desafio de somar esforços para viabilizar as transformações
necessárias. Quem sabe, não será a partir do novo sertão que se desencadeará a
renovação das estruturas políticas, econômicas e sociais do país!!!
A oferta racional e constante da água
oportuniza a retomada de políticas públicas de fundamental importância e
impacto na vida e na economia da região, tais como a reforma agrária, o
saneamento básico, a agroecologia, a educação ambiental, a economia solidária,
o cooperativismo, as tecnologias populares, a organização dos grupos e
comunidades, o fortalecimento dos municípios e tantas outras.
A coincidência das eleições municipais
deste ano de 2016 com a perspectiva da chegada das águas do São Francisco
propicia eleger a questão hídrica como um dos temas da campanha eleitoral.
Neste contexto, cresce de importância o empoderamento da população no processo
de definição das políticas públicas. Consciente de seus direitos e deveres, o
povo organizado define suas prioridades, compromete-se com as estratégias de
atuação e delega sua implementação aos poderes por ele eleitos. Ou seja,
escolhe pelo voto a quem mais e melhor se candidate a executá-las – o poder
executivo - e a quem se apresente capaz e comprometido em aprovar o arcabouço
legislativo indispensável, nele incluídos a definição orçamentária e o
acompanhamento dos compromissos assumidos – poder legislativo.
Experiências desenvolvidas por inúmeras
instituições “revelam a possibilidade de estabelecer novas relações entre
Estado e sociedade civil, nas quais o Estado assuma o papel de apoiar as
iniciativas autônomas e criativas, gestadas no seio da sociedade. Além do mais,
só com a participação cidadã de uma Sociedade Civil ativa será possível
efetivamente democratizar o Estado, de forma a superar a cultura política
dominada pelas práticas de assistencialismo e clientelismo responsáveis pela
manutenção da malfadada "indústria da seca"”. Ver:
www.asabrasil.org.br
O Movimento dos Atingidos e Atingidas
pela construção da Barragem Oiticica vem demonstrando o quanto é possível
negociar com o poder público tendo como objetivo priorizar o atendimento aos
direitos das pessoas e não os compromissos com o cronograma da obra física e os
interesses das empreiteiras. Esta tecnologia social bem expressa a soberania
cidadã.
7 - “EU OUVI OS CLAMORES DO MEU
POVO” (EX 3,7)
Que belo exemplo dá a Igreja do
Nordeste quando se dispõe a acudir o sofrimento do seu povo. Inspira-a seu
comprometimento com os mais pobres, com as periferias existenciais, com sua
Doutrina Social tecida há séculos como testemunho do seu interesse pelos
direitos humanos. Numa região como o semiárido, onde as desigualdades são tão
escandalosas, avulta seu dever de lutar pela justiça. O Papa Francisco em seu
documento aos integrantes do Segundo Encontro dos Movimentos Populares
relembrou: “A justa distribuição dos frutos da terra e do trabalho humano não é
mera filantropia. É um dever moral. Para os cristãos, o encargo é ainda mais
forte: é um mandamento. Trata-se de devolver aos pobres e às pessoas o que lhes
pertence.”
Torna-se indispensável um documento dos
Bispos das Províncias Eclesiásticas aos Partidos Políticos exigindo destaque da
questão hídrica em seus programas. Desde a explicitação do marco ideológico de
como delimitam e caracterizam o direito inalienável do cidadão à água até as
soluções estruturais de escala nacional e estadual, chagando ao atendimento direto
às cidades, povoados e residências isoladas, no âmbito do município.
Cabe aos candidatos a prefeito e
vereador formular seus programas de atuação inspirados nos ideais partidários,
ajustados às realidades dos municípios e comunidades e atentos às demandas do
povo. Suas plataformas de atuação serão oferecidas a julgamento pelos cidadãos,
em quem repousa o poder de eleger e de deputar.
Aos grupos organizados, de modo
especial àqueles sob a influência da Igreja, compete o ônus de analisar e
comparar os compromissos dos que se candidatam a decidir em seu nome e de
fortalecer a formação da consciência política de seus membros. Uma metodologia
possível é o encontro com os candidatos para ouvir propostas, confrontar
visões, sugerir adequações e firmar compromissos.
Aos eleitores cabe a escolha por meio
do voto.
Aos cidadãos, o direito e o dever de
acompanhar o desempenho dos eleitos como seus representantes, comprometidos com
a pauta de propostas, prioridades e comportamentos defendida na campanha.
Neste contexto, as políticas públicas
que envolvem a questão hídrica e as demais com ela correlacionadas serão
tratadas e atendidas a partir das realidades locais, dos compromissos assumidos
e da cidadania exercida.
8 - CONCLUSÃO
Antevejo os desdobramentos do
compromisso da Igreja com a revitalização do semiárido, no momento expresso por
esta Caravana Socioambiental: a educação para o correto uso da água e a
preservação de suas fontes e rios. A oferta da água, em abundância, para todas
as necessidades. A implantação de soluções simples e eficazes, como as
cisternas e demais modalidades de retenção da água. A universalização do
saneamento básico. A transposição das águas dos rios perenes e de grande vazão
para os temporários e de reduzida capacidade. A destinação das terras
adjacentes aos rios perenizados para a reforma agrária. A recomposição das
matas ciliares. A expansão da agricultura familiar. A fixação das famílias no
campo. A revitalização do semiárido. O cuidado com a ”Casa comum, nossa
responsabilidade.”
Ao concluir, faço meus os sentimentos
do Papa Francisco ao encerrar suas palavras aos Militantes dos Movimentos
Populares do mundo inteiro reunidos na Bolívia: “Digamos juntos do fundo do
coração: nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum
trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem
dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades,
nenhum idoso sem uma veneranda velhice.”
Aracaju, 23 de
fevereiro de 2016.
Otto Euphrásio de Santana
- Nota do Blog: Otto Euphrásio de Santana foi secretário da Educação e
Cultura do RN (1987/1988), ex-padre e irmão do Cardeal Eugênio de Araújo Sales (falecido)
e do arcebispo emérito de Natal e ex-bispo de Caicó, Dom Heitor de Araújo Sales.
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