Por
João Bosco de Araújo*
Foto atual do Tio Antenor/JBA |
Estava eu
inclinado a ler a obra de Jacques Maritain? Não por acaso, mas pelas
circunstâncias daquela ocasião. O certo é que nem sabia de quem se tratava. Na
casa de minha avó Luzia uma pilha de livros encostada em um canto da Oficina
Velha adornava aquele ambiente, sempre às portas fechadas, com outros objetos
de que dias outrora foram vividos intensamente. Pequenos instrumentos de
percussão, roupas de fantasias, latinhas vazias de lança-perfume, além de
folhinhas de santinhos, cordão de crucifixo, etc. etc. Olha que o local não era
tão pequeno e serviu de ponto de trabalho do meu avô Severino Tavares, na
fabricação de chapéu de couro.
Então! Lá
estava eu, minuciosamente, com um exemplar do filósofo francês debaixo dos
olhos a ler, atenciosamente, sem pretensão de alcançar altos conhecimentos da
matéria. Apenas pura curiosidade! O maior interessado, e dono daquela coleção
de livros, estava longe dali e de seu objetivo principal, o meu Tio Antenor
Tavares de Araújo. Titenor abandonara
há tempos àquela leitura no Colégio Nóbrega, em Recife, onde fora seminarista
no tradicional Mosteiro de São Bento, em Olinda. Reprovado em matemática, e na
vocação, foge alegando que não aprendera
a matéria ensinada no Ginásio de Caicó (GDS), depois de um ano confinado na
rigorosa Ordem Beneditina, em Pernambucano. Certamente que Deus o perdoou, sua
vocação era outra.
De volta ao
Seminário caicoense, ficou também pouco tempo, fugindo numa noite de Carnaval
para um baile que acontecia em um clube da cidade. Padre João Agripino foi quem
não o perdoou. Professor de Matemática no Ginásio Diocesano Seridoense, soubera,
depois, de seu insucesso nos estudos e de sua defesa infeliz. Ao se
encontrarem, deu-lhe um carão, reclamando do jovem ex-seminarista por ter lhe
dedurado em Olinda pelo mal-ensino da matéria. O padre Agripino não merecia!
Estou eu,
novamente, a retratar aqueles livros deixados para trás por meu tio. Comigo
também não fora diferente. Deixei-os antes mesmo de tomar qualquer decisão que
fosse àquela de Titenor, embora nunca
tenha passado pela vontade de seguir a vocação seminarista. Ao menos deixara-me
o interesse pela leitura. Confesso não ser uma vocação, mais ainda por uma
necessidade e capricho de aprendizagem. Um esforço que, obrigatoriamente, me dá
prazer.
Limitado ao
meu conhecimento, ainda por cima filosófico, estava eu a retirar da leitura
afinca de um livro de Jacques Maritain (1882-1973), de tantos outros de sua
intensa obra publicada praticamente por toda a primeira metade do século 20,
uma frase que me levou a copiar nos rodapés dos manuscritos escolares: “É a
vontade e não a inteligência, por mais perfeita que seja, que torna o homem bom
e direito”. Não recebi qualquer ensinamento acadêmico-escolar desse teórico
tomista. Apenas uma frase, que deixei gravar no meu subconsciente com a vontade
de não mais esquecer.
Não sei onde
estão, hoje, os livros de Maritain do meu tio. Sei que fadado à mediocridade,
sempre estive com a vontade de superar as adversidades. Vontade que me encoraja
a enfrentar as dificuldades. Também sei que de uma legião de boas vontades o
mundo está cheio. Faltam vontades de praticá-las. São muitos os que as praticam
para o mau.
Um cérebro
medíocre, sim. Mas com uma vontade danada de um coração bondoso!
*Texto
anteriormente publicado no Diário de Natal, em 2008, que saudei meu tio Antenor
pelo seu aniversário, que neste 15 de novembro - Dia da Proclamação da República
-, agora em 2015, ele comemora 83 anos de vida. Parabéns Titenor!
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