Walter Medeiros*
[waltermedeiros@supercabo.com.br]
A Revolução nos moldes
propostos por Marx, Lenin, Engels, Stalin e outros pensadores é algo que pode
tornar-se realidade algum dia, desde que sejam criadas as condições objetivas
para a sua realização. Nesse sentido,
não adianta ser general, marechal, civil, doutor, pós-doutor ou operário para
negar ou admitir a marcha das sociedades e da humanidade nesse rumo. Pois
existem fatores que nenhum daqueles pensadores previu e certamente nos dias de
hoje eles teriam opiniões importantes a expor. Até porque, ao que parece, as
orientações que deram parece ter sido mescladas de atitudes que desvirtuam as
propostas revolucionárias. Para saber quais seriam essas atitudes, no entanto,
é preciso debruçar-se sobre suas obras e observar o que está sintonizado ou não
com os discursos socialistas e comunistas dos dias atuais.
Esta reflexão surge
quando vemos o Brasil de 2014, cinquenta anos depois do Brasil de 1964, reunir
entre 500 e mil pessoas numa Marcha da Família com Deus, manifestação que
naquele passado aflitivo reuniu entre 200 mil e 500 mil, dependendo de quem
calculou em cada época. A realização desse evento é algo que considero
estranho, triste, lamentável, uma comprovação de que parte dos brasileiros passaram
a viver numa democracia sem saber bem o que fazer com ela. Isto era algo temido
no tempo em que se lutava pelo fim do regime militar, de triste memória, mas
cujas bases devem ser sempre lembradas para que nunca mais se repita.
Esta abordagem poderá
ser vista como uma espécie de desabafo de quem viveu e sentiu nessa vida todos
os malefícios e apreensões que a ditadura provocou nos brasileiros politizados.
Até porque venho de um tempo em que se primava pela honestidade e legalidade,
porém com base em legitimidade das normas e instituições.
Pode ter-me faltado
alguma malícia, mas disso não me arrependo, pois mesmo que pareça ingênuo,
ainda acho que até em jogo deve-se lealdade e respeito aos adversários e às
regras. Porém sei também que na revolução a coisa é outra. E para se ter uma
noção do que foi o regime militar, temos o exemplo emblemático do deputado
militar Jair Bolsonaro, que em 2013 juntou umas quatro pessoas para defender a
volta dos militares e hoje deve estar emocionado depois de ver centenas de
pessoas ao seu lado. Mas cabe ao povo brasileiro ter sabedoria para enxergar
que o caminho não é esse da famigerada marcha.
O Brasil não pode pensar
em se perder em nova noite escura do terror do AI-5; da cassação de mandatos,
de tamanha truculência, ilegalidade, exceção e força; da censura, método
medieval de submeter a inteligência ao vulgo e à força; da Lei de Segurança
Nacional, que nos retirou os direitos e a cidadania, pois nem habeas-corpus era direito do cidadão; do
Exílio, pois lugar de brasileiro é no Brasil, se assim o quiser; da Tortura,
algo que preocupa mais ainda nos dias de hoje, pela banalização das ocorrências
policiais; da Lei de Imprensa, pois a
responsabilidade pelo que escreve deve ser de cada um; do Decreto 477, pelo
qual os estudantes sentiram na pele o que era cerceamento da voz e da
manifestação do pensamento. Diante de todas essas coisas horripilantes, que
criaram uma realidade de liberdades tolhidas, nada justifica um novo regime
militar.
Entretanto, o povo
brasileiro extravasa seus anseios nas ruas e a cada dia torna-se mais inadiável
uma mudança de postura dos políticos para sintonizar seus discursos com a
realidade. O povo quer verdade, transparência, honestidade, justiça e cidadania
plena. É hora, portanto, de abandonar subterfúgios, engodos e corrupção, para
que o chamado jeitinho brasileiro tenha realmente seus dias contados. O custo é
grande e o povo quem paga a conta. Daí a necessidade de empregar com eficácia
os recursos da nação e fazer por onde os desvios sejam extirpados. Para isto,
aliás, cada cidadão precisa também fazer a sua parte. As ruas mandam um recado
de mudança e é preciso que os políticos e demais responsáveis pela condução da
vida pública entendam esse recado não como um episódio qualquer, mas uma mostra
de que o Brasil precisa dar um salto para viver um novo dia.
*Jornalista
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