Por Albimar Furtado*
Jornalista ▶ albimar@superig.com.br
Há coisas que as pessoas
precisam ver, conhecer para dimensioná-las. Já falei neste espaço sobre minha
curiosidade em caminhar, olhar de perto, ver as coisas muitas que se mostram na
feira do Alecrim. Pois bem, ouvia falar, vez por outra, em conversa com os
viajores, sobre o movimento intenso da rua 25 de Março, em São Paulo. Uns
gostando pelos preços baixos, pelas compras baratas feitas. Outros, torcendo o
canto da boca e pejorativamente definindo a movimentação como “muvuca”. Fui
ver. E gostei. Prefiro falar sobre as coisas de Natal, do nosso RN. Mas não
resisti, depois de ver o turbilhão de ações que presenciei naquele pedaço
paulista e que me transportou à feira do Alecrim, mesmo sem as verduras e
frutas daqui. Mas não fui lá pra comprar.
Sobre São Paulo também
se registram sempre palavras entusiasmadas sobre os Jardins, a Oscar Freire,
Higienópolis, Pacaembu, a Paulista. Mas não tem jeito, a 25 de Março é
imbatível pelo fuzuê que é, movimento que tem, gritaria, malabaristas, cantores,
instrumentistas, pregoeiros, emboladores, um teatro a céu aberto sem tamanho,
um comércio que acolhe um mundo de gente. Fui ver e adorei, manhã inteira e
pedaço da tarde. Deixei o metrô na São Bento e fui ladeira abaixo até ser mais
um no vai-e-vem da multidão. Olhei um lado e outro da rua, sem saber por onde
começar. Até que avistei Cleópatra, a rainha egípcia nascida anos antes de
Cristo e que saíra de Alexandria para fixar um ponto exatamente ali, na 25 de
Março. Estava em suas roupas exóticas, rosto e braços em prata, parada,
absolutamente imóvel, olhos sem piscar. Estátua. A dinastia de Ptolomeu
certamente a deserdou. Estava ali, uma caixinha coberta em tecido em cima de um
banquinho aguardando que pingassem moedas ou notas de pequeno valor. Tinha
instantes de glória também, quando passantes paravam para admirá-la e para ter,
ao lado dela, uma foto que certamente seria exibida depois aos familiares e
amigos.
Depois de Cleópatra vi e
ouvi o saxofonista num esforço enorme para fazer sair do instrumento as notas
que compunham músicas do repertório de Glenn Miller. Desafinado, sim, mas
esforçado. Na bacia, poucas moedas. Ali perto encostei na parede que dividia
duas lojas de bijuterias e roupas e presenciei o que não esperava: nas
respectivas calçadas dois rapazes, bem jovens, disputavam os clientes no grito.
Pareciam pregoeiros anunciando, num quase canto, os produtos expostos nas
prateleiras. Sem qualquer cerimônia um deles garantia que tinha bonés, calças e
camisas e ainda tênis “das melhores marcas. Tudo original”. Acreditando ou não,
potenciais compradores entravam na loja. Os dois fizeram uma pausa nos pregões
para comentar o que acontecera na balada da noite anterior. Assunto que era
deles e por isso fui atrás de outras atrações.
Não é difícil encontrar
artistas populares que lhe fazem parar e, às vezes, bater palmas. Ví o
frustrado jogador de futebol fazendo sucesso fora dos gramados. Alí, no meio da
rua e da multidão trabalhava embaixadas com uma rolimã minúscula, usando os
pés, joelhos e pescoço. Acabou deixando o bolinha entrar no boca da garrafa
pet. Foi para um desafio maior, fazer embaixadas com um côco verde. Duvidei.
Mas vi o côco obedecer aos comandos do malabarista, subir e descer e subir mais
uma vez pela movimentação dos pés e joelhos e ficar parado no pescoço do homem
que se exibia. A última demonstração foi com um ovo. Claro, espatifou-se no
chão da 25 de Março. Insistiu e então teve sucesso. Era um ovo em madeira,
pintado de branco. E aí foi show de bola. Palmas para o craque.
Em dois momentos
distintos, vi a presença nordestina parando pessoas naquele movimento. Estavam
lá a mocinha cearense e sua banda cantando forró. Um sucesso. Fez gente
arriscar alguns passos de dança, cantar, aplaudir. Não era o forró que eu
gostaria de ouvir, mas gostei de ver vizinhos nossos fazendo os paulistanos
sorrir. Alguns metros depois estavam os emboladores arrancando gargalhadas com
suas rimas bem humoradas. Um sucesso.
Tem muito mais atrações,
é só ter olhos e vontade de ver. Tinha o artista que em minutos completava seus
desenhos coloridos em minúsculos azulejos, os carregadores que com suas
carroças grandes de duas rodas cheias de caixas pesadas iam à força extrema
para subir as ladeiras que desembocam no Largo de São Bento, o sorriso fácil de
quem comprara os presentes exigidos pelos tempos natalinos. Sim, porque na 25
de Março tem também comércio forte. Ruas e lojas cheias, quase esqueço disso.
Vi alegria e vi festa. Vi shows e talentos e não paguei nada por isso. E tinha
muito mais pra ver, mas o cansaço já dava sinais. Voltei à estação de São
Bento, subida com aclive acentuado, passando antes pela bela igreja onde a
Missa era celebrada. Toda ela em cantos gregorianos pelos beneditinos. O ato
final magnífico. Entrei no metrô com a certeza: a 25 de Março é imbatível. Tal
e qual a nossa feira do Alecrim.
*Texto publicado na coluna do jornalista, no Novo Jornal
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