Por
João Bosco de Araújo
Foto arquivo Google/Escultura de Geicifran Assis Azevedo
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Tem um dia na vida que
ninguém espera e vem, de repente, àquela emoção! Foi o que me aconteceu na rua
em que nasci e me criei como criança e na adolescência.
Sábado de manhã. Caicó,
outubro, férias do trabalho, véspera de encerramento da Festa de Nossa Senhora do
Rosário deste ano de 2013. O grupo dos Negros do Rosário saiu da igreja,
formado por crianças, a menor de 5 anos, de estandarte nas mãos, e as maiores
corriam e desciam, pisando levemente as pedras nuas da rua, ao som de tambores
e, aqui e acolá, de aplausos de transeuntes admirados, numa coreografia
espetacular, circulando sua majestade - o rei e a rainha - e toda a corte da
tradição negra.
Fazer parte deste
momento histórico foi uma experiência lúdica, com minha irmã Socorro realizando
o sonho de ser Rainha da Irmandade do Rosário. Completando a “Corte Real”, meu
irmão Gilberto, como Juiz, e eu, como Escrivão (além de Rosa e Socorro, juíza e escrivã substituta).
O outro momento estava
por vir. Por mera coincidência, o trajeto do cortejo se desvia para passar na Rua
Augusto Monteiro. Ninguém me avisara do inesperado itinerário. Também não
esperava voltar no tempo, quarenta e mais anos atrás. Memórias representadas
por brincadeiras de circo, bandinhas de lata, puro teatro de rua.
A corte negra seguia em
frente. O homem assoprava sua pequena flauta ou pífano. Pequenos guerreiros
seguravam suas lanças e em ritmo gigante pareciam sobrevoar como anjos sobre o
calçamento quente da rua de minha memória.
Àquela mão se levanta,
acenando da porta da casa. O dedo polegar levantado para cima, a se movimentar firmemente
à mão fechada, sinalizando que me reconhecera. Nem uma palavra, apenas sorrisos.
E nem precisava falar. Paulo Afonso, filho de Manoel Dantas, compartilhara de
nossas brincadeiras no palco da nossa infância feliz. Emoção a tocar o
semblante marcado pelo tempo.
Os tambores a retumbar, roncando
e acelerando a energia dos Negros do Rosário, de 240 anos de tradição, paixão e
fé nas ruas da nossa cidade.
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