acesse o RN blog do jornalista João Bosco de Araújo [o Brasil é grande; o Mundo é pequeno]

domingo, 7 de abril de 2013

Um cavaquinho no baú da recordação!

Por João Bosco de Araújo
Jornalista boscoaraujo@assessorn.com  

Entre o tamborim e a bandinha de lata, me vi diante de outro instrumento musical, um cavaquinho! Rebuscando o baú das recordações, lembro-me de um dia nas férias escolares, que retornava com meus irmãos ao sítio Umbuzeiro (domicílio rural de nossos pais), visitando o velho casarão construído por meu tio-bisavô João Joca Ferreira na primeira metade do Século 19, lá estava o instrumento dentro de um baú de cor preta que meu pai Pedro Salviano guardava trancado às sete chaves em um quarto isolado da casa antiga.

Distante no tempo, e cerca de 500 metros do local onde morávamos, aquele velho prédio totalmente de alvenaria, paredes enormes e cobertura de telha com duas quedas d’água, seguindo estilo dos colonizadores lusos, foi sede dos remanescentes filhos do casal Vicentinho e Aninha, ela saída da Fazenda Pedreira, ele vindo do Piauí, vaqueiro de Cosme Pereira, das bandas de Umarí.

O casarão guardava segredos e histórias dos antepassados e corria a lenda de um tesouro que estaria enterrado em um de seus aposentos escuros. Em sonhos, dona Josefa - mulher de João Valentim -, foi avisada por um senhor baixinho de que a botija seria para ela, provavelmente (suponham-se os mais antigos), tratar-se do próprio construtor do prédio que, segundo contavam, morreu solteirão. Dona Josefa também morreu sem escavar a botija, cujo sinal, comentava, ser um garfo de ouro.
 
Voltemos ao tesouro que descobri, ao abrir o baú. Um cavaquinho de madeira envernizada, todo preto, enrolado em panos de cetim. Sonho ou não, a verdade é que sai correndo para contar o precioso achado e tamanha foi a alegria ao ouvir de meu pai que mandaria reconstruir o instrumento já avariado pelo tempo.
 
Tempos depois, descobri que àquelas roupas coloridas que as encontrei trancadas no baú, há anos, com o cavaquinho, seriam fantasias de reisados, uma tradição não seridoense e sim da Zona da Mata pernambucana, região na qual meu pai ainda rapaz solteiro viveu por duas décadas, a partir do final dos anos de 1920, transportando e comercializando burros e cavalos para usinas de cana-de-açúcar, no Sul de Pernambuco.

Também descobri que a vocação para tocar cavaquinho não estaria no baú de meu talento musical. Mais pela falta de treinamento e menos por falta de sorte, embora oportunidade tenha sobrado, pois ainda em férias da escola meu pai me orientava a receber aulas de cavaquinho de um senhor que morava na fazenda vizinha, Gavião, de seu compadre Basílio Ginane.

Exímio músico, aquele homem fazia sair dos acordes de seu instrumento músicas de gêneros diversificados, nunca deixando de tocar os grandes clássicos de Waldir Azevedo. Brasileirinho, ah que vontade de tocar! Nem precisava ser igual ao autor da música reconhecida mundo afora, bastava daquele que estava ali, embora perto, mas bem longe cavaquinho. Pois é, perto apenas na vontade e longe de aprender, por causa da distância que nos separava e me impedia de ver e memorizar as posições das notas por ele executadas com habilidade. Não vi, não aprendi!

Frustrado, meu pai me trazia de volta e ao chegarmos minha mãe sempre indagava o que me dizia antes de sairmos para as lições de cavaquinho: “Você não chegue perto daquele homem, pois ele está tuberculoso”. Acreditava-se que ele estaria com a doença, por ser muito magro e pigarrear, seqüencialmente. Mas eram apenas especulações, ninguém conhecia o seu diagnóstico.      

A lição que aprendi com o tempo foi de ter criado noções de valores culturais e de não ter criado medo e preconceito das pessoas. 

O cavaquinho, guardo-o como relíquia de um tempo que se foi!

©2013 www.AssessoRN.com | Jornalista Bosco Araújo
Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário

Copyright © AssessoRN.com | Suporte: Mais Template