Como foi em Natal o dia do homem na Lua
Novo Jornal encontra o “único brasileiro vivo que
contribuiu para a chegada do homem à Lua”. É
um Neil Armstrong papa-jerimum
Reportagem
de Nadjara
Martins para o NOVO JORNAL
“Eu sou o único brasileiro vivo que contribuiu para
a chegada do homem à Lua”. A frase pode até soar arrogante para alguns, mas
diante da simplicidade de seu autor, não pode ser encarada deste modo. Antônio
Albuquerque de Medeiros, 71, mais conhecido como “seu Toinho”, tem todo o direito de
reivindicar o posto.
Durante 14 anos, o senhor de gestos simples e
memória fotográfica, operou um dos 29 telescópios Baker-nunn espalhados pelo
mundo – um deles localizado em Natal. Por meio do rastreamento de satélites,
essas máquinas foram utilizadas para mapear o céu e definir o caminho que o
foguete Apollo 11 e Neil Armstrong fariam até a Lua, em 20 de julho de 1969.
Desde 1945, Natal já era uma capital conhecida por
sua estratégica posição geográfica. Localizada na “esquina do continente”, a
cidade é o único ponto de encontro que possibilita viagens para três
continentes: África, Ásia e Europa.
Além disso, em 1965, graças à sua localização
próxima a linha do Equador Magnético – local em que os pólos magnéticos da
terra se encontram e se anulam – a capital potiguar também passou a abrigar a
primeira base aeroespacial da América Latina: a Barreira do Inferno. O fato
alçou Natal ao status de Capital Espacial do Brasil.
Talvez Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin
Audrin, astronautas tripulantes da missão Apollo 11, não imaginassem que todo o
treinamento e disciplina que superaram para alcançar um mundo sem gravidade
necessitasse, também, da ajuda de um anônimo habitante da esquina do
continente. Antônio, na época com 26 anos, um curraisnovense formado apenas “na
escola da vida”, media, fotografava e rastreava a trajetória de todos os
satélites já lançados, que percorriam o céu potiguar durante as noites da
década de 1960.
Naquela época, o mundo era dividido em dois pólos: o
capitalista, representado pelos Estados Unidos, e o socialista pela União
Soviética (URSS). Desde 1958, as duas potencias mundiais disputavam a hegemonia
política, e o ponto alto desta disputa estava na ‘corrida espacial’. Desde
1958, EUA e URSS barganhavam o papel de potência mais evoluída
tecnologicamente, a ponto de ser responsável por levar o homem à lua.
Apesar da URSS ter saído na frente, quando em 1961
enviou o primeiro homem ao espaço, o astronauta soviético Iuri Gagarin, os EUA
logo assumiu o controle da corrida. O projeto Apollo, desenvolvido entre 1961 e
1972, tinha o principal objetivo de levar o homem até a lua. E é neste ponto
que entra o Brasil.
Através de
uma parceria entre a NASA e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe),
em 1967 o país recebeu o projeto Banker-nunn. Instalado no Centro de Pesquisas
Espaciais Barreira do Inferno, o projeto contava com
uma estação destinada a rastrear o posicionamento de satélites de maior relevância.
Esse rastreamento, que já era feito em outras cidades do mundo, foi um dos
estudos que possibilitou à NASA definir qual a trajetória que seria percorrida
pelo Apollo 11.
“Eu tinha todas as estrelas do céu na minha mesa”,
conta Albuquerque, sem esconder o orgulho. Ele se refere às fotos que a câmera
Baker-nunn tirava das estrelas e satélites visíveis na noite potiguar. Pesando
2,5 toneladas, a máquina, apontada para o céu, fazia uma trajetória de 180º de
leste a oeste com uma lente de 40 polegadas de espessura.
Cada laser disparado pela máquina refletia no
satélite. O reflexo era captado pela câmera, gravando em placas de vidro um
negativo do que percorria o céu naquele momento. “Ela conseguia tirar uma foto
de uma bala de chupar a 440km de altitude”, completa.
Albuquerque não se subestima: ele sabe que é a
memória viva do que aconteceu naquela época. “Somente duas pessoas controlavam
aquela máquina, mas só eu estou vivo”, conta. “Eu tenho o maior orgulho de ter
feito parte da história potiguar e ter ajudado ao desenvolvimento da tecnologia
de hoje”.
Entretanto, apesar de saber da importância de tudo o
que já fez, ele se emociona ao olhar arquivos antigos. Entre papéis amarelados,
desencavava comprovantes de pagamento (ganhava o equivalente a R$12.500
mensais), o livro de notas em que catalogava os satélites e até mesmo um
diploma que recebeu da NASA pelo reconhecimento do seu trabalho.
O reconhecimento, porém, ficou somente no papel. Com
o fim da corrida espacial e o corte de recursos para o projeto Apollo pelo
presidente Richard Nixon, o Projeto Banker-nunn também fechou as portas. Após
14 anos, Albuquerque e os demais pesquisadores foram mandados de volta para
casa, sem aposentadoria ou auxílio financeiro. O ex-operador passou a
sobreviver com a renda de um salário mínimo, proveniente da pequena oficina
mecânica que montou.
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