Carolina Wanderley, neta de Ademir Ribeiro
Esta é uma história curta, que se preenche de outra.
Começa, caso tenha início, com o contato entre dois
desconhecidos.
“Não nos conhecemos. Mas me parece que tínhamos um
amigo (ao menos conhecido) em comum: Ademir Ribeiro. Falecido ontem, por volta
das 20h no hospital da Av. Antônio Basílio. Nos últimos quatro anos, definhando
sob as garras da demência senil agravada pelo Alzheimer, sucumbiu, pois, a uma
repentina queda de pressão.
Uso este meio para lhe informar do falecimento.
Morreu esquecido e só (à exceção da presença dos filhos do primeiro casamento,
com Teresa). Solidão mesma que já lhe ocorria há uns poucos anos. Sem álcool,
sem cigarro, sem amigos.
Vou ver se consigo ao menos deixar-lhe gravado à
lápide: “Ademir Ribeiro – A voz de ouro do rádio”.
A morte parece-nos um destino comum, sob o qual
nenhum controle detemos. E sendo curta a vida, mais hora, menos hora, ela
chega. Preciso agora falar sobre este homem, que há pouco faleceu, meu avô,
Ademir Ribeiro.
TANTO
NOMINI NULLUM PAR ELOGIUM, eis o epitáfio de Maquiavel: “Para tão grande
nome, elogio não há!”. Meu avô provavelmente não se satisfaria com tamanha
luxúria em elogios! Ele não queria elogios à toa. Dispensava-os sem falsa
modéstia, escondendo no fundo uma sincera certeza de ter cravado sua marca na
história do radio potiguar, e no coração norte rio grandense. Sempre soube: ele
gostava era de reconhecimento.
Ademir Ribeiro, nascido em 02 de junho de 1939,
locutor e boêmio por profissão, era um apaixonado pelo Radio e pelo Futebol.
Viveu intensamente cada faceta de sua vida. Amou
suas mulheres, seus filhos, sua profissão, sua cachaça e o cigarro de cada dia.
Devoto de Nossa Senhora de Fátima e torcedor ferrenho do América, escreveu na
história do Radio Brasileiro um importante capítulo.
Nostálgico e solitário, meu avô foi, sem dúvidas, um
dos homens mais inteligentes que já conheci na vida. A solidão tem mesmo dessas
coisas. Lembro-me das visitas semanais, aos sábados, à sua residência, no
bairro de Cidade Satélite, regadas a torradas de pão dormido da padaria, café,
e muitos vídeos. Entrar no “escritório” do meu avô era o que hoje eu chamaria
de “momento Cult”.
Entre cinzeiros, copos de café frio e garrafas de
cachaça, um raro acervo de fitas VHS e inúmeras K-7s do programa Show da Manhã,
do qual se orgulhava de ter protagonizado por muitos anos, transmitido pela
Radio Poti.
Com sua bolsa tiracolo e seu gravador munido de
fitas, a qualquer hora do dia Ademir estava disponível no Bar de Lourival, na
Deodoro da Fonseca, tomando sua garrafa diária de Caranguejo e fumando suas
tantas carteiras de cigarro.
Avesso à política, repetidamente se recusou a ter
sua voz estampada em campanhas e candidaturas. Dedicou-se ao “rádio-romantismo”
à lá Janet Clair. Não se furtou à oportunidade de abrir espaço para sua
nostalgia no Show da Manhã, tocando “músicas do passado”, como dizia.
Ademir era isso, ou este. Ou as duas coisas.
Gostaria de ter-lhe ao menos dito: “Vai em paz, tua história vive!” Mas foi e é
assim, sorrateira e repentinamente que a morte chega. Precisando, então, de um
epitáfio digno para este homem, recordei-me que, em entrevista ao Jornal Zona
Sul, quando perguntado sobre como queria ser lembrado, respondeu:
Eu? Nem sei… Podia ser Ademir Ribeiro, a voz de ouro
do rádio. Porque esta voz eu não ganhei de graça. Foi Deus quem me deu. Pode
botar lá no meu túmulo. “Ademir Ribeiro – A voz de ouro do rádio”. Só isso.
-
Texto enviado ao jornalista Roberto Homem Siqueira através do qual se teve
conhecimento da morte do radialista na quarta-feira (8), com divulgação, em primeira mão, nas
redes sociais.
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