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quarta-feira, 23 de maio de 2012

Basta um toque de mulher

Por  Jomar Morais*
Jornalista jomar.morais@supercabo.com.br

Na prosa poética de Diógenes da Cunha Lima, em seu  belo e refinado “Natal – uma nova biografia”, encontro o verso de Dailor Varela que me leva a refletir sobre a fase de baixa autoestima e desleixo por que passa essa cidade encantadora. “Clara cidade de luz. Natal não anoitece”, disse o poeta falecido recentemente. No domingo passado, no entanto, Natal estava escondida na penumbra. As luzes do pórtico dos Reis Magos, na entrada, apagadas. O calçadão de Ponta Negra destruído e sem lâmpadas. O Forte dos Reis Magos oculto nas trevas. Até a Árvore do Mirassol, novo cartão postal, estava desligada e inútil.

O noticiário e o jogo político tiram suas próprias conclusões e sinalizam ora a inabilidade dos gestores, ora a escassez de recursos e o caro custeio da máquina administrativa. Certamente é a soma de tudo isso e mais um detalhe que observo a partir da experiência trivial.

Certa vez, ao visitar um amigo, professor em escola pública de 1º grau, surpreendi-me com o esmero de seu pequeno apartamento, no qual móveis simples, mas de bom gosto, contracenavam com tapetes e obras de arte assinadas por artistas populares, dando ao ambiente uma aparência agradável e acolhedora. A intimidade nos permitia descer a detalhes e, assim, ouvi-o revelar espanto pelo fato de seus colegas se acharem em miséria, quando ele conseguia viver bem e sem dívidas apoiado apenas no salário modesto. Logo percebi que o segredo estava na sua criatividade e sensibilidade e, certamente, numa precisa noção de foco e moderação.

Não é uma cena incomum. No contato com famílias pobres, em meus trabalhos voluntários, frequentemente me deparo com marcas de zelo, limpeza e beleza onde há alguém disposto a expressar sua sensibilidade e alegria de partilhar, o que quase sempre tem a ver com a presença da mulher e o jeito feminino de olhar, sentir, escolher e agir. Nesse contexto o dinheiro é curto, mas a criatividade supera obstáculos.

Natal, a meu ver, precisa desse toque feminino nos escalões gestores para sair do estágio depressivo e descuidado. O Rio Grande do Norte mesmo parece carecer dessa ousadia capaz de criar novas e saudáveis possibilidades, ainda que na contramão dos interesses corruptores por serem simples, baratas e desburocratizadas.

Mulheres no poder, já temos. Mas estariam nossas mulheres poderosas acomodadas a um mimetismo machista no ambiente viciado da política? Estariam imobilizadas pelas algemas do toma lá, da cá e pelas sabotagens das máfias invisíveis? Não tenho a resposta, mas tenho uma certeza: se aprenderem com as mulheres pobres e criativas, Natal ficará mais bela até com canteiros de xanana, a planta singela e despojada que, segundo Diógenes, é a flor desta cidade.

*Texto publicado na coluna do jornalista no NOVO JORNAL
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