A paz é um tema recorrente na minha rotina de
bate-papos despretensiosos, a convite de amigos. Parece assunto grave e
urgente, mas no fundo é suave e atemporal, exceto quando o arrastamos para a
lista das preocupações utilitárias, sempre balizadas pela ilusão da concretude
e pela expectativa de um ganho imediato. Nesse caso, ele surge cercado pela
esperança (e, consequentemente, pela dúvida e a aflição) de que alguém nos
apresente a fórmula infalível para a realização de nosso desejo.
Isso é prato cheio para os vendedores de fantasias
e, quase sempre, frustração garantida para quem, no primeiro momento, irá
encantar-se com a praticidade de algum passo a passo. Uma armadilha da qual,
infelizmente, não escaparemos enquanto imaginarmos que a paz é quando as coisas
acontecem do jeito que almejamos.
Dias atrás fui surpreendido pelo pragmatismo do
título dado a um bate-papo comigo. “O que fazer para alcançar a paz”, garantia
o rótulo. Pensei no tamanho da decepção que eu iria causar aos meus amigos, mas
deixei fluir. Nem sei como consegui usar os 45 minutos destinados à exposição
(E é preciso? A tagarelice é própria da natureza da mente, especialista em
complicar coisas simples e diretas). Mas a verdade é que, em vez do manual
prometido pelo título da palestra, minha mensagem poderia ser resumida em duas
frases breves: “O que fazer para alcançar a paz? Nada.”
Assim mesmo. Nadica de nada. A maioria dos eventos
da vida pedem apenas que os aceitemos e saboreemos, a fim de que possam seguir
os seus cursos e completar os seus ciclos. São “problemas” que se “resolvem”
com mais rapidez e eficácia se não os complicamos com a interferência de nossos
caprichos.
A paz é um dos exemplos mais expressivos dessa
obviedade. Toda vez que nos esforçamos para alcançá-la, estabelecemos um
conflito. Isso vale da intimidade das relações familiares às ações
espetaculares das organizações e estados guerreiros, sempre prontos a promover
carnificinas para salvar homens e implantar a paz. Eu e você conhecemos o
resultado dessa iniciativa em nosso círculo íntimo. O mundo inteiro conhece os
efeitos das cruzadas e das guerras de conquista do passado e, com certeza,
ainda conviverá por muitas décadas com as consequências amargas das incursões
militares das atuais potências em nome da paz.
O mundo objetivo é expressão de nossa subjetividade.
As guerras externas refletem nossa intensa guerra interior, em meio à nuvem das
formas-pensamento. Fazer nada, acalmar-se, é a única saída para que elas se
dissolvam, permitindo-nos ver e fruir a paz natural das profundezas da vida.
Sem indivíduos conflituosos, não haverá mundo em conflito.
*Jomar Morais também
escreve para a coluna Plural, às terças-feiras no Novo Jornal
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