acesse o RN blog do jornalista João Bosco de Araújo [o Brasil é grande; o Mundo é pequeno]

domingo, 17 de julho de 2011

Artigo: A pesquisa


Até Jesus recorreu a pesquisa de opinião. Na cidade de Cesaréia de Felipe, reuniu seus discípulos e indagou: “quem dizem as multidões que eu sou?”. As respostas revelaram a crença popular de que ele era um dos antigos profetas retornado em novo corpo. Ninguém cravou a alternativa “é o Cristo”.

O resultado da sondagem certamente estimulou Jesus e o colégio apostólico a esclarecerem a massa em toda a Judéia e até na capital, Jerusalém. Mas faltou ao núcleo inicial do Cristianismo investigar as multidões sobre como viam a novidade, o que esperavam dela e se estavam dispostas a aceitar a missão cristã e suas consequências radicais sobre indivíduos e sociedades. Mais tarde, os fatos dramáticos de Jerusalém, que levaram Jesus da aclamação triunfal à crucificação em curtíssimo tempo, atestariam essa lacuna e também a fugacidade e vulnerabilidade da opinião pública, essa entidade forjada sobre emoções egoísticas, manipuláveis pelos inescrupulosos de todas as épocas, com ou sem a ajuda da ciência estatística e das táticas de marketing.

Jesus errou? Não. Nem ele e nem qualquer outro reformador daria conta de seu trabalho sem a coragem de nadar contra a corrente. Nenhuma utopia seguiria o seu curso rumo à realidade se mestres e heróis se permitissem acatar o interesse imediato das massas. Foi bom para o mundo que da sondagem de Cesaréia constasse apenas a uma pergunta.

As pesquisas de opinião até podem ser confiáveis, mas jamais serão sinalizações indiscutíveis pela natureza instável e imprevisível das multidões. E quando a isso se soma a incompetência técnica, a irresponsabilidade ou a desonestidade na apuração dos dados, estamos diante de uma farsa nociva a pessoas, empresas, o mercado, os governos, a democracia, a educação e a ética, cujos processos levam em conta a suposta opinião coletiva.

Lembrei disso ao assistir recentemente, numa praça do Recife, a atuação de um grupo de pesquisadores, a maioria mulheres, que mensuravam a popularidade do medicamento Amidalin, usado contra infecções da boca e da garganta. A praça estava repleta de gente, mas os entrevistadores preferiram se aboletar em um banco e ali preencher alguns formulários a esmo, para “fechar a cota do dia”, tendo o cuidado de completá-los com dados pessoais de familiares e amigos que eram contatados via celular e instruídos sobre como responder, caso fossem procurados pela equipe de checagem da pesquisa. “Não esqueça, você usa Amidalin. A-mi-da-lin, certo?”, dizia ao telefone uma lépida “pesquisadora”.

Ninguém teve a iniciativa de me entrevistar, embora eu estivesse ao lado. Era hora do almoço e todos queriam seguir para o restaurante...

Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário

Copyright © AssessoRN.com | Suporte: Mais Template