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domingo, 12 de junho de 2011

Artigo: Crime e solução


Existe solução? Sim. E custa bem menos que os bilhões de reais desperdiçados em presídios “seguros” e demonstrações espetaculosas de força para tapar feridas que logo reabrem, repletas de pus 

Há décadas autoridades e especialistas falam sobre a falência do sistema penal brasileiro. Nos últimos anos, tenho constatado pessoalmente esse desastre social ao colaborar com o trabalho da Pastoral Penitenciária dentro de pavilhões onde homens perdidos na escuridão dos impulsos são entregues à própria sorte ou à sanha de chefes mafiosos brutais e de um sistema corrupto que os transformam em profissionais do crime.

O círculo vicioso está fechado. Enquanto o motor de uma sociedade individualista, materialista e imediatista gera novos transgressores entre seus excluídos, os bem-estabelecidos baixam o porrete e os enviam para geenas superlotadas, de onde logo sairão - por consentimento legal – treinados para acelerar a roda da malandragem e da violência na qual todos damos um empurrãozinho com nossas práticas diárias.

Existe solução? Sim. E custa bem menos que os bilhões de reais desperdiçados em presídios “seguros” e demonstrações espetaculosas de força para tapar feridas que logo reabrem, repletas de pus. Mas quem se interessa por solução barata e efetiva? Ela implica desmontar a máquina milionária dos interesses econômicos e políticos e a corrupção visceral do sistema penal. Um problemão.

Aqui mesmo, no Brasil, uma simples organização não-governamental, a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados - APAC, tem demonstrado que é possível fazer mais com menos quando há espírito de serviço, respeito à dignidade humana e participação comunitária. Desde a experiência pioneira de São José dos Campos, SP, em 1972, a APAC montou e administra - sob permissão do poder judiciário de alguns estados - mais de 100 presídios que funcionam na contramão das penitenciárias governamentais, com excelentes resultados.


Nesses estabelecimentos não há policiais nem agentes penitenciários. Todos os internos cumprem uma rígida disciplina de trabalho, estudo e práticas espirituais desde as 5h da manhã e são permanentemente avaliados pela diretoria da instituição e por um conselho de segurança formado por presidiários. Não há “solitárias” nem castigos físicos, mas todo o grupo é responsabi
lizado pela falta cometida por algum membro. As famílias dos condenados participam do esforço institucional e os presos sem família ganham pais adotivos que os ajudam no processo de reeducação. O regime semi-aberto é rigorosamente monitorado.

Você já ouviu falar de rebelião e fuga em presídio da APAC? Já soube de alguém comandando quadrilhas de dentro dessas prisões singulares? Não há celular nem drogas circulando ali. Não há familiares ou advogados fazendo a ponte entre condenados e deliquentes em liberdade. O índice de reincidência entre egressos do sistema APAC é de apenas 10% contra quase 90% entre egressos do sistema oficial. E o custo médio por detento nessas casas de correção modestas e dignas está em torno de 25% dos 2 500 reais que o estado gasta mensalmente com cada preso de seu sistema ineficiente.

Um modelo como o da APAC – exportado para vários países - só pode ser aplicado sobre terreno arado e livre das pragas que corrompem o aparato de segurança pública e o sistema penal brasileiros. Ele pede antes uma desconstrução. Isso não custa dinheiro, mas dá trabalho, exige coragem e apresenta riscos reais aos que se dedicarem à missão heróica.

Publicado na edição de 07/12/10 do Novo Jornal

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