Em longo prazo, a meta não é reformar
a Previdência, mas extingui-la. Essa é
a verdade que não pode ser dita.
por JOMAR
MORAIS*
Assumi meu
primeiro emprego, com carteira assinada, aos 14 anos de idade. Meu cargo:
repórter. Quase 40 anos depois, aposentei-me, sob a lei vigente, aos 53 anos de
idade. Na época, sob protestos da família, troquei um bom salário pela vida
idealista de serviço ao próximo sem remuneração. Sem peso na consciência, mas
consciente de que, a exemplo de outros trabalhadores, eu havia sido lesado pelo
Estado brasileiro.
Durante anos
de atividade contribui para a Previdência Social quase sempre na faixa mais
alta, que na década de 1980 correspondia a 30 salários mínimos. A promessa era
que, aposentado, eu teria um benefício mensal em torno desse valor. Então
vieram as reformas, sucessivas reformas, e, para encurtar a história, ao
aposentar-me, em 2006, atingido em cheio pelo redutor inventado no governo
Fernando Henrique - o Fator Previdenciário -, tive que me contentar com um
benefício equivalente a 4 salários mínimos que, passados 11 anos, agora
equivalem a três salários, e deverá seguir minguando, graças ao arrocho
contínuo dos reajustes abaixo dos do salário mínimo e até da inflação.
Agora vejo
que poderia ter sido pior e lamento por meu filho que, tendo se iniciado no
mercado aos 17 anos de idade – como fotojornalista -, não poderá escolher
aposentar-se antes dos 65 anos e, junto com toda a sua geração, certamente terá
um benefício ainda mais irrisório que o meu ao deixar a ativa.
Ainda assim,
eu seria a favor de uma reforma na Previdência, se esta se constituísse em uma
ação de Estado honesta e justa para salvaguardar o bem comum. A seguridade
social foi pensada numa época de homens de baixa longevidade e suas fórmulas
precisam ser atualizadas para o nosso tempo de vida longa generalizada e
mercado dinâmico. No caso brasileiro, porém, há fatores que complicam essa
situação e deliberadamente foram postos à margem da discussão atual.
Nada
justifica que políticos e militares, dois segmentos em que privilégios e
distorções humilham os brasileiros que dependem da Previdência comum, fiquem
fora da mudança. Nada justifica que categorias da chamada elite do serviço
público, bem organizadas e bem remuneradas – não raro, de forma injusta em
relação aos demais trabalhadores – acabem preservando seus privilégios,
enquanto os plebeus do regime comum são sangrados mais uma vez. Nada justifica
que trabalhadores paguem a conta para cobrir a ineficiência do Estado e ampliar
os lucros dos grandes grupos econômicos.
Para que se
tenha uma ideia da inversão de prioridades nesse momento, basta lembrarmos que
o INSS, que protege 33 milhões de brasileiros, teve em 2016 um déficit de 150
bilhões de reais, enquanto o déficit da Previdência do serviço público federal,
que abrange apenas 980 mil pessoas, chegou a 90 bilhões de reais.
Uma reforma
justa talvez começasse por esse ponto, mas isso poderia colocar em risco a
aprovação já das mudanças e, portanto, não interessa aos maiores beneficiários
da reforma em curso: a banca brasileira e internacional, de olho nos ganhos da
expansão da previdência privada. Há pressa em debilitar o sistema oficial,
minar a confiança das pessoas. Em longo prazo, a meta não é reformar a
Previdência do Estado, é asfixiá-la e extingui-la.
Imagem relacionada à publicação
*Com publicação no portal do jornalista
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