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domingo, 23 de abril de 2017

Reforma ou destruição?

Em longo prazo, a meta não é reformar 
a Previdência, mas extingui-la. Essa é 
a verdade que não pode ser dita. 

por JOMAR MORAIS*

Assumi meu primeiro emprego, com carteira assinada, aos 14 anos de idade. Meu cargo: repórter. Quase 40 anos depois, aposentei-me, sob a lei vigente, aos 53 anos de idade. Na época, sob protestos da família, troquei um bom salário pela vida idealista de serviço ao próximo sem remuneração. Sem peso na consciência, mas consciente de que, a exemplo de outros trabalhadores, eu havia sido lesado pelo Estado brasileiro.

Durante anos de atividade contribui para a Previdência Social quase sempre na faixa mais alta, que na década de 1980 correspondia a 30 salários mínimos. A promessa era que, aposentado, eu teria um benefício mensal em torno desse valor. Então vieram as reformas, sucessivas reformas, e, para encurtar a história, ao aposentar-me, em 2006, atingido em cheio pelo redutor inventado no governo Fernando Henrique - o Fator Previdenciário -, tive que me contentar com um benefício equivalente a 4 salários mínimos que, passados 11 anos, agora equivalem a três salários, e deverá seguir minguando, graças ao arrocho contínuo dos reajustes abaixo dos do salário mínimo e até da inflação.

Agora vejo que poderia ter sido pior e lamento por meu filho que, tendo se iniciado no mercado aos 17 anos de idade – como fotojornalista -, não poderá escolher aposentar-se antes dos 65 anos e, junto com toda a sua geração, certamente terá um benefício ainda mais irrisório que o meu ao deixar a ativa.

Ainda assim, eu seria a favor de uma reforma na Previdência, se esta se constituísse em uma ação de Estado honesta e justa para salvaguardar o bem comum. A seguridade social foi pensada numa época de homens de baixa longevidade e suas fórmulas precisam ser atualizadas para o nosso tempo de vida longa generalizada e mercado dinâmico. No caso brasileiro, porém, há fatores que complicam essa situação e deliberadamente foram postos à margem da discussão atual.

Nada justifica que políticos e militares, dois segmentos em que privilégios e distorções humilham os brasileiros que dependem da Previdência comum, fiquem fora da mudança. Nada justifica que categorias da chamada elite do serviço público, bem organizadas e bem remuneradas – não raro, de forma injusta em relação aos demais trabalhadores – acabem preservando seus privilégios, enquanto os plebeus do regime comum são sangrados mais uma vez. Nada justifica que trabalhadores paguem a conta para cobrir a ineficiência do Estado e ampliar os lucros dos grandes grupos econômicos.

Para que se tenha uma ideia da inversão de prioridades nesse momento, basta lembrarmos que o INSS, que protege 33 milhões de brasileiros, teve em 2016 um déficit de 150 bilhões de reais, enquanto o déficit da Previdência do serviço público federal, que abrange apenas 980 mil pessoas, chegou a 90 bilhões de reais.

Uma reforma justa talvez começasse por esse ponto, mas isso poderia colocar em risco a aprovação já das mudanças e, portanto, não interessa aos maiores beneficiários da reforma em curso: a banca brasileira e internacional, de olho nos ganhos da expansão da previdência privada. Há pressa em debilitar o sistema oficial, minar a confiança das pessoas. Em longo prazo, a meta não é reformar a Previdência do Estado, é asfixiá-la e extingui-la.
Imagem relacionada à publicação
*Com publicação no portal do jornalista
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