Por Albimar Furtado*
Jornalista ▶ albimar@superig.com.br
Quem é rei nunca perde a majestade. Coisa mais
batida, né? Absolutamente vazia de criatividade. Ninguém aguenta mais. Mas é
isso aí mesmo que vou usar, seja por falta de talento para construir outra
imagem ou por considerar que nada expressa melhor o meu sentimento do que
repetir a frase já exaustivamente dita. Negócio seguinte: uma dor de cabeça que
já me perturbava por três dias me fez sair do meu trabalho e ir rápido à
farmácia na busca do analgésico milagroso que me devolvesse a sensação de
conforto. Vou chegando à farmácia, aquela ali da esquina da rua da Saudade com
a Rui Barbosa e a visão se volta, surpresa, para o criolão que deixava o local.
Alto, esguio, elegante, cabelos já brancos, mas guardando ainda os traços
daquele que por cerca de 15 anos era tema predileto nas rodas de conversas em
qualquer canto da cidade.
Muitos anos depois, sei lá quantos, revia o rei do
Castelão/Machadão, Alberi. Não fiz reverência à sua passagem, mas não seria
qualquer favor se o fizesse. Afinal, eram suas pinturas, no domínio da bola,
que enchiam de alegria uma grande galera nas tardes de domingo ou nas noites
das quartas feiras no finado estádio. Um lançamento longo, um drible curto, uma
tabela progressiva, um gol de placa. Ele era o rei. Fui editor de esportes, fiz
entrevistas com o Negão, escrevi as matérias de grandes jogos. Um deles, o ABC
e Santos, que o Novo Jornal relembrou agora. Estavam lá Pelé e Alberi. Fui um
dos 52 mil privilegiados daquela noite.
Não era apenas ver os jogos. Era fácil escrever
sobre o futebol quando Alberi estava em campo. Os dedos corriam mais soltos nas
teclas das velhas máquinas Remington, recompondo cenários. Fiz, com ele, uma
das matérias que mais gostei de fazer. Cruel matéria: Alberi contratado pelo
América, abdicando da condição de ídolo do meu ABC. A responsabilidade
profissional se impunha. Não me contentei apenas com a entrevista, mostrando
todas as circunstâncias da transferência, da mudança de camisa. A imagem
precisava ser mais forte. Propus que fosse fotografado vestindo a nova camisa,
a vermelha do América. Mais que isso, que fôssemos para frente da sede do
clube, na Rodrigues Alves. Aceitou. Clovis Santos, repórter fotográfico dos
bons, caprichou: Alberi em primeiro plano e o colosso ao fundo, mostrando o
enorme escudo do clube. Não deu outra, foto de primeira página, valorizada por
João Neto, o comandante da redação do Diário de Natal, americano roxo.
Ali na farmácia não pensei em pará-lo,
cumprimentá-lo. Não se pára um rei, mesmo depois de passar o trono (para quem?
Quem o substituiu?) por qualquer coisa. Enquanto o ídolo seguia em direção ao
carro a imaginação veloz me levava de volta ao campo de treino do ABC, em Morro
Branco, ou ao Machadão. Ao aprendizado na editoria de esportes. O carro partiu
e a moça do caixa que atenta acompanhava a cena, deu o mote para estas linhas:
“Conhece Alberi? Quem não conhece, né?”.
*Texto publicado na coluna
do jornalista no NOVO JORNAL
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