Por François Silvestre*
Escritor
▶ fs.alencar@uol.com.br
Não é saudosismo. É constatação. Eu nem era eleitor,
nem adulto, nem leitor. Mas sou um estudioso das mogangas republicanas deste
país de geografia fantástica e história mal contada.
Começo pelos seus erros políticos e manias de
grandeza. Isso mesmo. Juscelino era um megalobrasilino. Via-se e via o Brasil
do tamanho do seu território.
Médico medíocre, transformou-se num líder político
após revolucionar a administração pública de Belo Horizonte. Daí foi num
crescendo de vitórias consecutivas. Era o terror da UDN. Não se pode dizer que
era um pessedista disciplinado. Usava a estrutura rural do PSD, mas sua ligação
fazia-se direta com o eleitor.
Nenhum líder da esquerda foi mais odiado do que ele
pela Ditadura. Nem aqueles que morreram sob tortura. A milicada estrelada, que
abocanhou o poder central, devotava-lhe inveja e ódio. Até porque não podiam
matá-lo ou exilá-lo.
Como acusar de comunista um católico notório, reaça
até, liberal e populista? E ainda mais sabendo que ele morto seria muito mais
perigoso. Tinham de suportá-lo, ruminando a gosma da inferioridade que faz o
subalterno moral espojar-se no chafurdo do próprio excremento.
Geisel confessa que rezara para ele não morrer
durante o seu “governo”. O enterro de JK foi a primeira manifestação popular
espontânea, ocorrida em Brasília, desde o golpe que o proibiu de visitar a sua
obra síntese.
Durante seu Governo, dois levantes militares
tentaram a sua queda. Aragarças e Jacareacanga. Derrotados, Juscelino anistiou
todos os envolvidos. Não prendeu nem exilou ninguém.
Foi combatido duramente por uma oposição violenta e
virulenta. No Parlamento e na Caserna. Opositores competentes e ativos.
Diferente da oposição de hoje, mão de alface na face do poder.
Retirou o Brasil da vocação de vira-lata, na
definição de Nelson Rodrigues. Estimulou o afeto coletivo. Se havia esmola,
dela pelo menos resultavam obras.
Indústria do automóvel, açudagem, planejamento
econômico. Uma Capital edificada em mil dias.
Nenhum jornal censurado ou sindicato fechado. Ou
adversário perseguido. Nem grevista sem salário. Democrata na expressão mais
fina do termo. Tudo que produz ódio no moralismo e na hipocrisia. Sua natureza
enojava os cretinos.
Federalizou universidades sem olhar o partido dos reivindicantes.
Cá mesmo, num governo da UDN, fez, a pedido de Onofre Lopes, a UFRN.
Campeão mundial de futebol; campeão mundial de boxe,
com Éder Jofre. Campeão mundial de tênis, com Maria Ester Bueno. Numa época de
comunicação precária e PIB nivelado por baixo. Só perdeu uma eleição, por um
voto. A Academia Brasileira de Letras vendeu a vaga por um terreno. Geisel não
queria que JK tivesse uma tribuna. A Ditadura morreu; de podre. Juscelino vive;
de liberdade. Té mais.
*Texto publicado em sua
coluna no NOVO JORNAL
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