Por Jomar Morais*
Jornalista
▶ jomar.morais@supercabo.com.br
Se você está lendo este jornal na expectativa de
encontrar o relato fiel de fatos, lamento informar: você está equivocado. Diria
o mesmo se você estivesse lendo os jornais concorrentes ou mesmo um monstro
sagrado da mídia, como o The New York Times.
Aplique-se isso às revistas (com mais ênfase), aos
portais de notícias, aos blogs (com muito mais ênfase) e à televisão, ainda que
nas transmissões ao vivo. Aplique-se até aos emails e às cartas (se é que elas
ainda existem) e também aos livros e às pesquisas orgulhosamente rotuladas de
ciência. No papel, no computador ou na TV jamais existem fatos, mas versões de
fatos baseadas nos filtros mentais e ideológicos de quem os reporta.
A rigor não existem fatos – no sentido de realidade
que pode ser percebida por inteiro – nem mesmo quando estamos cara a cara com o
que acontece ou somos parte do acontecimento. Cada observador só registra o que
é selecionado por seu conjunto de crenças e condicionamentos, algo mutável com
a experiência, porém invariavelmente resistente a mudanças. Mesmo assim a
aproximação da verdade pode e deve ser uma meta pessoal e profissional para a
qual se faz necessário o desapego de operar no nível das convicções,
sedimentando na humildade da dúvida a abertura ao desconhecido.
Novos conhecimentos e tecnologias derrubam crenças
consolidadas e, nesse contexto, é a percepção da complexidade, revelando-nos a
interpendência dos agentes da vida, que paradoxalmente nos abre a porta do
exercício efetivo da liberdade e da responsabilidade. Até hoje isso tem sido
prejudicado pelo hábito de identificar o fato com a versão, base da passividade
das massas e do movimento de manada nos modismos.
No campo do jornalismo, muito temos a agradecer a
Internet por sua ajuda no desmonte de mitos como o da objetividade da notícia e
o da sapiência dos analistas e líderes de opinião. Portais de informação e
blogs, por seus pecados e virtudes, acabam sensibilizando o leitor para a
percepção do óbvio: a diversidade de visões e interesses e a funcionalidade das
técnicas de edição (inclusive nas imagens ao vivo) sob a influência desses
pontos de vista e intenções. Além disso, a emergência do noticiário em tempo
real tem substituído a noção de notícia como pacote fechado pela de processo,
uma captação do movimento da vida com o permanente ajuste de novos enfoques e
correção de dados.
Isso não é mau para o jornalismo, o bom jornalismo,
e é ótimo para o público. Motivado pelo oceano de versões, o leitor tende a
assumir a atitude proativa de selecionar dados e construir o seu próprio
conhecimento, passando a agir e interagir na teia social com liberdade e sem
subjugação a manipulações e interesses.
*Texto publicado na
coluna do jornalista no NOVO JORNAL
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