Por Jomar Morais*
Jornalista
▶ jomar.morais@supercabo.com.br
A internet me traz o convite do promotor cultural
Antonino Condorelli para participar de um tuitaço (protesto através do Twitter)
pela democratização da cultura. A frustração de admiradores de Chico Buarque,
impossibilitados de assistirem ao show do consagrado compositor em razão do
preço proibitivo e mesmo da falta de espaço para abrigar tanta gente no teatro
mais sofisticado da cidade, inspirou a idéia. O objetivo é pressionar o poder
público a priorizar a cultura, o que levaria, entre outras ações, à criação de
espaços onde o povo pudesse ter acesso a produções mais refinadas e
consequentes que o batidão com letras pornográficas ou a tradicional comédia
pastelão.
Se funcionar, a proposta do tuitaço terá
contribuido, no mínimo, para o despertar das consciências acomodadas a uma
situação de apatia da qual se beneficiam os interesses políticos tradicionais e
a chamada indústria cultural, aquela que, quase sempre, mói o artista e o
transforma num produto pasteurizado e inofensivo – uma grife a ser consumida por
quem pode pagar e usar na excitação dos sentidos, sem que a arte em si lhe
toque a mente e o coração.
Pensar, ter idéias e expressá-las, inclusive na
moldura de beleza da arte, sempre foram ameaças ao estabelecido, espécie de
facas amoladas que precisam ficar longe da massa rude, a quem o preconceito
atribui a incapacidade de processar o conhecimento, decantando hábitos e
objetivos. E isso explica, em parte, a estratificação da produção cultural em
que os pobres seguem isolados no circuito de pão e circo, no pior sentido dessa
expressão.
O tuitaço traz ainda à superfície outro aspecto da
situação que diz respeito ao próprio artista e ao seu senso de missão e
comprometimento. É certo que o credo do mercado e a ganância nos fazem esquecer
de que também nossa atividade profissional precisa estar atrelada ao nosso
propósito de vida, o que nos levaria a intervir no mundo como missionários,
acima do interesse financeiro. Mas a sociedade sempre paga caro quando essa
amnésia acontece em áreas vitais, como a medicina e a arte.
Diante disso, sem esquecer a ação avara dos
atravessadores na fixação de preços dos produtos culturais, vale a pena evocar
o que um dia cada artista hoje aboletado em cachês milionários cantou nos
versos de Fernando Brandt e Milton Nascimento: “Foi nos bailes da vida ou num
bar em troca de pão / Que muita gente pôs os pés na profissão / De tocar um
instrumento e de cantar / Não importando se quem pagou quis ouvir (…) / Era
assim. / Com a roupa encharcada e a alma repleta de chão / Todo artista tem de
ir aonde o povo está. / Se foi assim, assim será. / Cantando me disfarço e não
me canso de viver/ Nem de cantar.”
*Texto publicado na
coluna do jornalista no NOVO JORNAL
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