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quinta-feira, 8 de março de 2012

Deixem o velho viver

Por Jomar Morais*
Jornalista jomar.morais@supercabo.com.br

A melhoria das condições de vida presenteou-nos, nos últimos 100 anos, com uma longevidade inimaginável para os nossos antepassados. No início do século 20, a expectativa de vida de homens e mulheres brasileiros estava abaixo dos 40 anos. Hoje é de quase 74 anos para os homens e de 76 anos para as mulheres. Deixamos de ser um país de jovens e já nos aproximamos do estágio de regiões desenvolvidas onde a população idosa se impõe nas ruas e na economia.

É certo que isso coloca o governo diante do desafio de alterar as regras da previdência, estouradas pelo aumento de despesas que os cálculos atuariais não previram. Mas o desafio maior está posto para a própria sociedade: o de reavaliar a visão sobre o idoso, superando preconceitos cristalizados numa época em que a exaltação da juventude e da beleza estimula a discriminação e o cerceamento.

Não me refiro a uma ação superficial, no nível da linguagem. Tem pouca relevância trocar “velhice” por “terceira idade”, se isso não ajuda a manter as pessoas rotuladas integradas à rotina social. Na verdade, essa é uma operação que precisa começar na cabeça dos velhos, dominada por uma ideologia da juventude, que os empurra para uma destrutiva rotina de lamentos e autopiedade, e pelos interesses, às vezes inconfessáveis, de alguns familiares. É o primeiro passo para o idoso libertar-se da condição de semiescravo, condenado a trabalhar além de seus limites ou a anular-se num círculo de superproteção que o retira da vida bem antes da morte.

Na semana passada, surpreendi-me com a minha mãe, saudável nos seus 76 anos, queixando-se de não poder comparecer à hidroginástica por que não havia quem a transportasse. Parece razoável, mas não é. O que levaria idosos saudáveis a se colocarem como dependentes dos mais jovens, a não ser a idéia introjetada de que o seu tempo já passou? Contei-lhe então sobre a japonesinha de 70 anos que há pouco encontrei num trem do Peru. O marido, piloto aposentado, acha que já não tem o que desbravar e prefere não sair de casa.

A velhinha, convicta de que a vida continua, aventura-se pelo mundo. Naquele dia, ela escalaria a montanha de Machupicchu.A palavra chave para se viver bem na velhice é aceitação. Entender os ciclos da existência e adaptar o ritmo pessoal às circunstâncias. É possível manter-se saudável, operante e criativo nessa fase, como comprovam as trajetórias de cientistas, empreendedores e artistas ativos bem depois dos 60, 70, 80 anos. E é possível desfrutar dos prazeres da vida, de um jeito sereno e profundo, se a mente está livre da prisão dos padrões – inclusive os de juventude e beleza.É possível ser velho e ser feliz.

*Com post no blog do Novo Jornal e no site do autor
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