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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

A política, a internet e a obscenidade

Edmilson Lopes Júnior*
De Natal (RN)**


Confrontos no Egito mostra relevância das redes sociais,
mas interesses políticos só emergem "quando a
vulgaridade perde espaço" (Foto: AP)
Se você digitar o nome "Arruda" no YouTube, tenho certeza!, vai se deparar com algumas dezenas de links direcionando-o para alguns dos vídeos nos quais o ex-governador do DF e alguns dos seus aliados metiam literalmente a mão em dinheiro de origem duvidosa. Também no famoso site de vídeos, você poderá se deparar com o vídeo com o qual um vereador de Curitiba pretendeu garantir um lugar em uma edição do Big Brother.

Gostem ou não os atores do campo político (parlamentares, assessores, consultores, jornalistas e todo um conjunto de agentes que o constroem e estruturam), as atividades enquadradas na rubrica de "política" produzem imagens e narrativas que são consumidas da mesma forma que o são as performances das celebridades, as bizarrices dos esportistas milionários e as cenas de sexo de modelos e atrizes de terceira linha.

Se o espaço público tradicional sempre demarcou fronteiras entre o que "está na frente" (público) e o que fica nos "bastidores" (atrás), agora tudo mudou. O voyeurismo embaralhou as fronteiras. E os políticos, assim como todas as outras celebridades, nos jogam na cara suas velhacarias mais íntimas. E há sempre uma câmera a registrar seja a atriz sem calcinha ou o deputado que coloca dinheiro em partes íntimas... As imagens não mentem, repetem os especialistas da mesmice. E a discussão mais substancial resvala para a mobilização de imagens.

Para complementar, cada vez mais políticos, assim como já ocorre há algum tempo com os jogadores de futebol, não conseguem dar um passo ou abrir a boca sem as dicas de um consultor de imagem pessoal. E todo ato público é pensado, teatralizado, como se fora uma performance. E como o público quer consumir o que é distinto, então, tome distinção fabricada. E tome publicização da vida privada. Se brincar, teremos todo um bloco do principal telejornal da noite dedicado à vida da cadela daquele presidente...

Aqui no Rio Grande do Norte, acreditem!, a coisa não é diferente. O blog dedicado ao jornalismo político no RN que recebe o maior número de visitas presenteia os internautas com fotos e mais fotos das festas de aniversários de políticos e seus familiares. Ou, quando se dedica a "cobrir" uma campanha política, chama atenção para o "pé inchado" de um deputado.

E os novos mídias ajustam-se bem a essa transformação dos políticos em celebridades. Com o twitter, por exemplo, o voyeurismo avança um pouco mais. Propalado como uma das "ferramentas" responsáveis pela vitória democrata nos EUA, o programa passou a ser usado largamente pelos políticos brasileiros. Com essa "rede social", dizem os especialistas, é possível acompanhar o "fazer político". "Dá mais transparência", ouvi um precoce candidato a conselheiro do Príncipe anunciar com a solenidade empolada dos medíocres.

O espaço público, pelo menos aquele tradicionalmente concebido por defensores da res publica, pressupunha discussão e deliberação. Na atualidade, com a força da TV e da internet, ele se transforma, mais e mais, em espaço de "revelação" de segredos, intimidades e bizarrices.

Bueno, e daí? Ora, a primeira lição a tirar disso tudo é que aquela simpática (e, segundo o sociólogo Pierre Bourdieu, em seu corrosivo livro "Meditações Pascalianas", um tanto quanto cristã) idéia de uma esfera pública racional, propugnada pelo filósofo Jürgen Habermas, parece ter cada vez menos chão social para se firmar.

Isso não significa, longe de mim essa idéia pessimista!, assumir a proposição de que as novas tecnologias ameaçam a democracia. Pelo contrário! Elas podem ajudar, sim, a construir espaços democráticos. Os acontecimentos dos últimos dias no Egito parecem confirmar essa promessa. Para isso, entretanto, é necessário que atores, interesses e horizontes políticos possam emergir. E eles só emergem quando a vulgaridade perde espaço.

*Edmilson Lopes Júnior é professor de sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)




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