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domingo, 28 de julho de 2013

O beijo na santa, a fé em Sant’Ana

Por João Bosco de Araújo
Jornalista boscoaraujo@assessorn.com  
 
Sentada em seu trono, lá está Senhora doce e clemente Sant’Ana, mãe da graça e do perdão. Aos seus pés, lá estava meu pai, Pedro Salviano de Araújo, a beijar a Santa naquele domingo à tarde, último dia da festa e hora da procissão. O interior da igreja lotado de peregrinos e devotos aguardando enquanto não chegava o momento da imagem da santa sair em procissão. 
 
Todos os anos, o beijo na santa, a urna no chão, a mão no bolso, a quantia depositada, nunca revelada, seus segredos guardados. Eu, pequeno a lhe admirar tão grande na fé a nos ensinar. Todos os dias a se perpetuar. Minha avó materna Luzia Tavares após ficar velhinha já não podia ir à igreja, mas sempre depositava no genro o valor do beijo da Santa, creditando confiança na tradição.        
 
Fora da Catedral, todos a cantar: “Salve, Sant’Ana Gloriosa, Nosso amparo e nossa luz; Salve, Sant’Ana Ditosa, Terno afeto de Jesus”, e todos a repetir num coro de vozes, e lá estava ele, cabelos brancos, com muitas outras mãos a segurar o andor coberto de flores e uma multidão coberta de fé, enchendo as ruas de minha cidade por onde ia passando. Ao longo das avenidas, a imagem gloriosa deslizava sobre as pessoas a suplicar não nos desampare, não nos abandone!   
 
Meu pai repetiu essa tradição por toda a sua vida e ao findar do dia da festa ele retornava ao seu lugar. Foi lá aonde aprendera com sua mãe Virgínia a praticar o ofício da oração. Minha avó Gina, por sua vez, herdou tamanha fé de sua avó Aninha do Umbuzeiro. Gina de Salviano (meu avô) enchia sua casa de devotos para rezar o Terço. Eram pessoas vindas das redondezas, montadas em burros e cavalos, ou mesmo a pé, na esperança de encontrar na fé uma resposta para o conforto da alma e da vida difícil do sertanejo sofrido, sem os olhos dos poderes constituídos, a não ser do poder que poderia vir dos céus.  
 
Reza a lenda sertaneja que a fé de um vaqueiro atacado por um touro bravo em plena caatinga o fez acreditar que se salvo fosse da fúria daquele animal, construiria uma capela em devoção à Senhora Sant’Ana, hoje a Catedral de Sant’Ana, Padroeira de Caicó, cuja festa data desde meados do século 18, hoje com 265 anos.
 
Mas a devoção a Sant’Ana espalhou-se e passou a ser considerada a padroeira do povo seridoense, embora essa fé seja do sertanejo nordestino que adotou em sua fala o nome Santana para designar o mês de julho. Em território potiguar, como padroeira, a avô de Jesus é homenageada no Seridó em quatro municípios, Caicó, Currais Novos, Santana do Matos e Santana do Seridó; no Oeste, em Campo Grande e Luis Gomes, além das cidades de São José de Mipibu e Passagem, no Agreste, e em duas localidades de Natal, na Zona Norte, no conjunto Soledade II e na Zona Sul, no bairro de Capim Macio.
 
Um fato importante me contado pelo professor Galvão Celestino, que fora vigário da Catedral na segunda metade da década de 1950, segundo o qual na época foi decidido mudar o final da festa dos caicoenses, que passou deste então a ter data móvel. Enquanto nas outras paróquias a festa se encerra em 26 de julho, dia da santa, em Caicó acontece na última semana do mês, possibilitando a cidade receber mais visitantes. Importante, ainda, é o fato do povo católico carregar consigo a fervorosa fé em Sant’Ana.
 
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