Por Carlos Fialho
Escritor
e publicitário ▶ cruvinelcamisa9@gmail.com
Dia desses, encontrei um livro que me saltou aos
olhos de súbito. Uma obra muito interessante que disserta sobre um capítulo da
cultura popular de Natal que me era totalmente desconhecido. O autor é o
jornalista e pesquisador Neto Pão com Ovo, filho do eminentíssimo intelectual
do passado, Júnior Pão com Ovo. O tema abordado na publicação é a grande
incidência de fenômenos sobrenaturais na cidade do sol e se chamava “Histórias
de uma Natal Assombrada”.
O volume de elegante edição, capa dura, colada e
costurada em couro, ricamente ilustrado e de vasto conteúdo catalogava algumas
lendas urbanas surgidas em Natal em décadas recentes. Fui consumido pela
leitura de imediato e separei aqui algumas das assombrações descritas no livro
como exemplo para que eu possa dividir com vocês um pouco do fascínio que tive
ao ter conhecimento destes formidáveis episódios que revelam uma riqueza folclórica
interessantíssima.
Vamos às lendas:
O FANTASMA DA AFONSO PENA Em noites de lua cheia e
lançamentos de coleções de outono/inverno, um espectro de aparência torpe e
maltrapilha vaga pela rua que é sinônimo do luxo e da usura na capital
potiguar. Ele sai repetindo seu mantra que é basicamente “um dinheirinho pra eu
comer, um dinheirinho pra eu comer, um dinheirinho pra eu comer”, exigindo dos
vivos uma pequena parcela da riqueza ostentada. Os especialistas dizem que uma
pequena quantidade de dinheiro ofertada pode serenar seus ânimos temporariamente,
mas para afastá-lo de vez só com técnicas avançadíssimas chamadas distribuição
de renda e oportunidades de vida. O Fantasma, que é definido pelos místicos
como uma entidade de pobreza, se refugia no morro de Mãe Luíza e provoca um
leve incômodo nos mais abastados da cidade, frequentadores daquela avenida,
porém estes e também os políticos natalenses preferem fingir que não o veem
(apesar destes últimos acenderem muitas velas para o espectro em época de
eleições).
O LOBISOMEM DE PONTA NEGRA Surgiu há alguns anos
quando um turista italiano foi mordido por uma menina de 13 primaveras numa
noite de entorpecida agitação na orla de Ponta Negra. Desde esse dia, ele
assombra a beira-mar do tradicional bairro praiano natalense e a sua
assustadora presença uivando ensandecido em noites de lua nova (porque ele
prefere as novas) afugentou os moradores nativos. O “Lobisomem Italiano em
Natal”, como foi batizado pelos doutores em Ciências Ocultas mais respeitados
da capital, só se sente saciado perante a oferta de jovens garotas potiguares
para que possa praticar sua cópula interespécies. Para evitar esse monstro de
caráter maldito, é preciso nunca sair do caminho seguro, mantendo-se longe de
seu território preferencial, a Avenida Beira-mar em Ponta Negra e a rua do
antigo Salsa no alto Ponta Negra.
A CAVEIRA DE BURRO DA CULTURA. Em 1903, quando se
estava construindo o Teatro Alberto Maranhão, que na época seria chamado de
Teatro Carlos Gomes, um dos operários de nome Alexandre Bezerra Carvalho
enterrou uma caveira de jumento embaixo de uma das colunas que alicerçam o
prédio.
Ao fazê-lo, decretou: “Nessa terra nenhuma
manifestação cultural genuína tocará o coração do povo, nada germinará e
frutificará, todo trabalho em prol do desenvolvimento da boa música, literatura,
dramaturgia e artes plásticas será em vão. Apenas alguns poucos testemunharão o
fracasso desta civilização que verá o tempo avançar sem nunca prosperar, que
testemunhará a cidade crescer sem nunca encontrar uma real identidade. Nesta
cidade ninguém nunca sentirá orgulho do que é, foi ou poderá vir a ser!” Após
dizê-lo, deu uma risada sinistra e partiu para Salvador. A caveira de burro,
porém, permaneceu entre nós, emanando seus poderes de atrofiamento cultural,
cultivando nos espíritos o comodismo e semeando a má vontade em todas as
camadas sociais.
OS ZUMBIS DO SOL. Eles se deslocam em grupo,
aparentemente a esmo, hipnotizados pelos meios de comunicação de massa que, por
sua vez, são controlados por manipuladores chamados de “formadores de opinião” já
que introduzem nas mentes ociosas das criaturas suas próprias vontades, valores
morais e normas de comportamento a serem seguidas e adotadas por todos eles.
Quando um zumbi começa a frequentar um lugar,
utilizar uma roupa ou adotar um padrão de comportamento qualquer “sugerido”
pelos “formadores de opinião”, logo é imitado por seus semelhantes que procuram
fazer tudo exatamente igual. O aparecimento destas hordas de mortos-vivos em
nossa cidade pode ser atribuído ao excesso de exposição solar na moleira, fato
altamente perigoso para os miolos que, sem a solidez da boa educação,
raciocínio lógico e cultura geral, se revelam demasiado fl ácidos e vulneráveis
à alta temperatura, derretendo docilmente e originando tais aberrações. As
maiores concentrações destes débeis monstros caminhantes podem ser vistas em
concertos de verão, boates da cidade, além de acorrerem sempre no início de
dezembro em desvairada perseguição aos trios elétricos que chegam da Bahia para
inebriá-los com um espetáculo de sons, luzes e cores. Foi daí que surgiu o
ditado: “Atrás do trio elétrico só vai quem já morreu!”.
Já era quase noite quando eu fechei o livro
“Histórias de uma Natal Assombrada”. Os relatos que expus aqui são apenas
alguns poucos retirados do extenso dicionário de lendas reunidas pelo
pesquisador e organizador da obra. Fiquei muito impressionante com tantas
fantasias populares natalenses surgidas nas ruas e praias da cidade. Será
preciso, a partir de agora, tomar mais cuidado quando andarmos distraídos pelas
veias do organismo urbano, pois além da violência crescente dos vivos que
ameaça nos converter em mortos, existem também todas essas criaturas do breu a
nos aterrorizar com suas artimanhas do além. Eu digo é VÔTS!
CONVITE
ResponderExcluirPrimeiro, eu vim ler o seu blogue.
Agora, estou lhe convidando a visitar o meu, e se possivel seguirmos juntos por eles. O meu blogue, é muito simples. Mas, leve e dinamico. Palpitamos sobre quase tudo, diversificamos as idéias. Mas, o que vale mesmo, é a amizade que fizermos.
Estarei grato, esperando VOCÊ, lá.
Abraços do
http://josemariacostaescreveu.blogspot.com