Por
João Bosco de Araújo
Seu Cosme era um
agricultor do sertão de Caicó. Seu ofício era fazer cercas de madeira,
entrançando as varas de marmeleiros, sua maior habilidade e procura pelos
proprietários de terras da região. Mas era no inverno que o velho Cosme
abandonava as feituras das cercas para se dedicar à agricultura, literalmente. Aliás,
na ausência de chuvas, a cerca era a única saída para manter a sobrevivência da
família, que era bastante numerada e, cada vez, aumentava netos e bisnetos.
O ano muito bom de
inverno, início de 1964, meu pai Pedro Salviano do Umbuzeiro ajuntou uma
cabroeira de trabalhadores para a plantação de arroz e outros grãos. Seu Cosme estava
incluindo para a jornada de trabalho. Agrupados, meu pai lançava uma corda,
organizada com laços, para a medição das covas aonde seriam inseridas as
sementes do plantio.
Com cerca de 20 metros
de comprimento, a meta da corda era ser içada para a frente e o trabalho seqüenciado,
com os agricultores avançando e cavando o chão molhado pelo bom inverno.
“À frente”, gritava Pedro
Salviano. E para sua ira, Seu Cosme recuava. E a cena se repetia. Todos avançavam,
Seu Cosme recuava. “Ô diachos”, praguejava. O dia calejado, sol a pino,
escaldante. Meu pai olhava aos céus, resmungava. Após um descanso, voltava ao
grupo e debaixo de seu chapéu de couro ordenava: “Seu Cosme, preste bem atenção,
quando eu disser pra frente o senhor avança com os outros, entendeu?” Desconsertado,
ele acenava com a cabeça, positivamente.
Não se cumpria o
ensinamento da tarefa e o atrapalhado Cosme voltava a recuar, em vez de ir pra
frente. Foi nesse ínterim que outro trabalhador, José Jerônimo, mais conhecido
como Zé Girósme, já sem paciência, pediu para intervir: “Seu Pedro”, disse ele
lá de trás, “vamos combinar e o senhor em vez de gritar pra frente, diga pra
trás!”
Foi a solução e o
trabalho realizado com sucesso. Melhor foi a safra com muita fartura no bom ano
de inverno no sertão do Seridó.
Lembrei-me desse
episódio por causa de uma postagem na página do conterrâneo seridoense Geraldo
Anízio, que ele descreve assim:
CURRAL COM VARAS DE MARMELEIRO
Ó SERTÃO... Ó SERIDÓ!!!
No Seridó, por vezes, há de se avistar alguns desses
currais feitos de varas de marmeleiro bem comum na caatinga nordestina. As cercas ficam mais resistentes
à chuva e ao sol de tinir. O sertanejo só disponibiliza o trabalho dele em
cavar a terra, aprumar os caibros e depois fazer o entrançamento das varas
verdes do marmeleiro formando o cercado. Sem muito gasto de dinheiro, o
seridoense usa dos recursos da terra e do que o sítio pode oferecer para a segurança
da criação de ovelhas, bodes e o gado.
Quando perto
da casa, a cerca de marmeleiro tem a serventia de quaradouro e varal
para enxugar as roupas lavadas em casa ou no açude quando é próximo. As cercas
de marmeleiro, de pedras as de aveloz ainda se veem pelos sítios regionais
principalmente no Seridó do Rio Grande do Norte.
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