Por Fernando Luiz*
Durante o período do regime militar, vários artistas brasileiros, para fugir da Censura, gravaram músicas cujas mensagens combatiam de forma velada o regime, usando expressões que fugiam à compreensão dos censores. Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Ivan Lins, Milton Nascimento e outros criavam metáforas nas letras das suas canções e conseguiam driblar a Censura.
A música era um dos principais instrumentos utilizados para protestar contra a ditadura, mostrando ao grande púbico a insatisfação com o regime vigente. Por causa disso, vários compositores sofreram censura, foram perseguidos e tiveram que se autoexilar. Para alguns, o exílio foi forçado, como Gilberto Gil e Caetano Veloso; obrigados a saírem do país, tiveram que se mudar para Londres.
Dezenas de músicas foram compostas utilizando uma linguagem difícil de ser captada, para fugir da Censura. Alegria, Alegria, (Caetano Veloso,) Pra Não Dizer Que Não falei das Flores, (Geraldo Vandré), Eu Quero é Botar o Meu Bloco Na Rua, (Sérgio Sampaio), Apesar de Você (Chico Buarque), O Bêbado e o Equilibrista (João Bosco e Aldir Blanc) e Cálice (Gilberto Gil e Chico Buarque) são apenas alguns exemplos de músicas cujas letras continham temas proibidos ocultos, uma “malandragem” usada pelos compositores que eram contra a ditadura.
Existiam também outras maneiras de driblar a “inteligência” dos censores e uma delas era o uso de um pseudônimo, como é o caso de Chico Buarque, que assinou várias composições como Julinho de Adelaide, dentre as quais uma foi grande sucesso: Você Não Gosta de Mim, Mas Sua Filha Gosta, feita para Luci Geisel, filha do presidente Ernesto Geisel, que era fã de Chico. A música foi gravada pelo próprio Julinho de Adelaide; aliás, Chico Buarque de Holanda.
Em 1971 Roberto Carlos lançou Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos em homenagem a Caetano Veloso, que estava exilado em Londres. O compositor pernambucano Paulo Diniz driblou a Censura com I Wanna To Bo Back To Bahia, também feita para Caetano no mesmo ano. Em 1972, a genialidade de Caetano deu as caras mais uma vez, com a música de sua autoria Como Dois e Dois, gravada por Roberto Carlos, cuja letra tinha um trecho que afirmava “tudo certo, como dois e dois são cinco, ou seja: ele dizia que estava tudo errado e a Censura – pra variar – não se tocou.
A música Na Tonga Da Mironga do Kabuletê tem uma letra que na época do seu lançamento deixou uma interrogação no ar, pois e expressão era completamente desconhecida do grande público. Segundo o Novo Dicionário Banto do Brasil, do compositor e pesquisador Nei Lopes, a palavra tonga significa “poder, força”; mironga quer dizer" mistério, segredo" e kabuletê é o "indivíduo desprezível, vagabundo”. Portanto, a expressão seria um xingamento, no idioma nagô, uma forma de protesto político, uma afronta ao regime, sem que os militares compreendessem.
A música foi um grande sucesso e os militares não sacaram que Vinícius e Toquinho estavam mandando-os para a PQP... Como ela, muitas outras canções escritas por pessoas inteligentes, passaram despercebidas de uma Censura comandada por pessoas despreparadas. Músicas como essa ajudaram o Brasil recuperar o Estado Democrático de Direito.
Instagram: @fernandoluizcantor
*Fernando Luiz: Cantor, compositor, escritor e produtor cultural. Formado em Gestão Pública, apresenta o programa Talento Potiguar, aos sábados, às 8h30 na TV Ponta Negra, afiliada do SBT no RN.
Nenhum comentário:
Postar um comentário