Pesquisa desenvolvida amplia a
possibilidade de terapia direcional no tratamento do câncer usando quinoxalinas
e nanopartículas de ouro.
Por José de Paiva Rebouças - Ascom/ICe-UFRN
Apesar do
avanço da ciência, o câncer ainda é uma das doenças mais temidas da humanidade.
A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, ligada à Organização Mundial de
Saúde (OMS), estimou 18 milhões de novos casos no ano passado, com crescimento
de 28% nos últimos seis anos. Isso significa que um em cada cinco homens e uma
em cada seis mulheres no mundo desenvolverá câncer durante a sua vida. Por se
tratar de uma doença de múltiplos fatores causada pelo acúmulo de mutações
genéticas que levam à proliferação anormal de tecidos, é difícil traçar um
único caminho para o tratamento do câncer. Contudo, novo estudo publicado no
New Journal of Chemistry por pesquisadores da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN) abre caminhos para a realização de tratamentos mais
efetivos usando o direcionamento de nanopartículas.
A
decodificação da seqüência do genoma humano possibilitou à Ciência localizar os
genes mais freqüentemente mutados diretamente correlacionados às proteínas
superexpressas no crescimento de tumores cancerosos. Isso foi fundamental no
avanço e aparecimento de novas pesquisas e tratamentos contra a doença. Uma
delas é a terapia direcionada que permite atacar somente as células cancerosas,
ao contrário da quimioterapia que também afeta as células normais e provoca
muitos efeitos negativos à saúde dos pacientes. Acontece que este tratamento é
ainda muito complexo e caro, o que dificulta sua popularização.
No novo
estudo, os cientistas modificaram, de forma simplificada, nanopartículas de
ouro através da inserção, em sua superfície, de quinoxalinas sintetizadas. Além
disso, usando simulação molecular (in silico), observaram que esta mutação
permite atacar, com grande eficiência, células cancerosas por meio da terapia
dirigida. Menores que 100 nanômetros, as nanopartículas de ouro são produzidas,
como o próprio nome sugere, a partir do ouro. Elas são tão pequenas que podem,
por exemplo, transportar medicamentos para o interior das células sem perfurar
as membranas celulares. Também podem ser carreadas para partes específicas do corpo
humano em intervalos controlados.
Já as
quinoxalinas são agentes antitumorais e anticancerígenos capazes de inibirem
enzimas envolvidas na proliferação, motilidade e diferenciação do câncer.
Devido a sua vasta gama de aplicações que inclui luminescência e biomedicina,
são identificadas algumas vezes como “moléculas reconhecedoras de tumores”. Com
o título “Funcionalização de nanopartículas de ouro com dois derivados de
quinoxalina à base de aminoálcool para direcionamento de fosfoinositídeos
3-quinases (PI3Kα)”, a pesquisa foi desenvolvida na UFRN e envolveu os
institutos de Química (IQ-UFRN) e do Cérebro (ICe-UFRN), em parceria com os
laboratórios de Bioinorgânica e Cristalografia, do departamento de Química da
UFSC, e de Microscopia Aplicada à Ciência da Vida, do Inmetro. Ao todo, dez
pesquisadores trabalharam no estudo: Janine Araújo, Fabrício Menezes, Heloiza
Silva, Davi Vieira, Sérgio Ruschi Silva, Adailton Bortoluzzi, Celso Sant'Anna,
Mateus Eugenio, Jannyely Neri e Luiz Gasparotto, coordenador do estudo.
Autodestruição
celular
Segundo o
professor Luiz Gasparotto, as nanopartículas de ouro se aquecem quando
submetidas à luz de determinados comprimentos de onda, o que pode instigar o
suicídio celular a partir do calor. “A ideia central é concentrarmos
nanopartículas de ouro na região do tumor, de modo que a aplicação de luz
aqueça a região tumoral, levando apenas células doentes ao suicídio”, explica.
A grande
questão é que as nanopartículas de ouro não sabem que devem colar apenas em
células tumorais. É neste ponto que entram as quinoxalinas. Estudos
computacionais mostraram que duas quinoxalinas têm excelente afinidade por
determinadas células tumorais e, por isso, “grudam” muito bem em determinados
tipos de cânceres. “Os cálculos teóricos indicam uma forte tendência de interação
dessas quinoxalinas com o sítio ativo da enzima-alvo, com os aminoácidos que
apresentam as interações mais fortes sendo iguais aos de outros ligantes já
reportados na literatura”, contextualiza Sérgio Ruschi, do Laboratório de
Neurobiologia Celular e Molecular, do ICe-UFRN.
Sabendo
disso, os pesquisadores inseriram quinoxalinas na superfície das nanopartículas
para que estas fossem direcionadas a reconhecer os tumores. Um ponto importante
neste trabalho é o fato de as quinoxalinas serem produzidas em laboratório de
maneira muito simples e barata, o que facilita sua produção em larga escala. A
metodologia tipicamente utilizada é a inserção de anticorpos na superfície das
nanopartículas, mas este é um processo complexo, caro e muito sensível. “A
grande contribuição deste trabalho é em termos de simplicidade e custo.
Mostramos que há um caminho interessante na produção de compostos antitumorais.
O fato de não usarmos anticorpos é um excelente atalho para uma futura produção
em larga escala”, diz Luiz Gasparotto.
Novas
abordagens
O próximo
passo da pesquisa será a aplicação das nanopartículas em células tumorais in
vitro e in vivo, utilizando camundongos como modelo animal. Outros
desdobramentos são estudos computacionais de novos candidatos a reconhecimento
tumoral baseados em quinoxalinas. Há ainda interesse do grupo na produção de
outras partículas, como, por exemplo, as de prata, para baratear ainda mais o
custo de produção.
Foto: Cícero Oliveira
Nenhum comentário:
Postar um comentário