JOAQUIM LUCAS DA COSTA, DO TEATRO DA VIDA
PARA A ESCOLA
Por Carlos
Frederico de O. L. da Câmara*
[carlosastral@hotmail.com]
O comerciante e jornalista, Joaquim
Lucas da Costa (1886/1925), poderia ter sido mais um desses profissionais dessa
atividade a ter sido despachado do cenário da vida intelectual de Natal,
principalmente nos primeiros anos do século XX e meados da década de 20,
inglòriamente, sem deixar marcado o rastro da sua presença. Mas, graças ao seu
talento artístico, terminou ganhando uma fatia de glória póstuma porque as suas
atividades extra-comerciais, o jornalismo, o teatro, a crônica e a poesia,
garantiram sua redenção pós-morte.
E sua história até ganharia outra
dimensão lítero-humanistica, caso não estivesse sido atropelado,
prematuramente, pela implacabilidade que abrevia a nossa trajetória
existencial. J. Lucas, como se assinava nas transações comerciais, anunciou no
jornal “ARepública”, “A Imprensa”, “Gazeta doComércio” e “A Capital”, sobre sua
empresa “Armazém de Cereais,Consignações, Comissões e Conta Própria”, desde
(1908/1924); J. Lucas vende redes do Ceará, por preços vantajosos.
Representante da fábrica Iracema de Mello e Nogueira. Mantém depósito de
madeiras do Pará – de todas as qualidades. Vende por preços reduzidos. Rua
Aureliano Medeiros, n.º11; outro anúncio: J. Lucas vende baleeira nova, por
preço baratíssimo, para o serviço de porto.
Mais outro: J. Lucas tem para vender, pelos preços antigos.
Sacaria de estopa para açúcar em 60 e 75
quilos. Em uma nota da empresa Tração, Força e Luz Elétrica de Natal, referente
á taxa de cobrança de luz (como aviso aos contribuintes da Ribeira), em (1917),
no jornal “A República”, a respeito de um prédio, na rua desembargador Joaquim
Ferreira Chaves. J. Lucas também possuiu terrenos na antiga Rua do Comércio
(hoje Rua Chile), no bairro da Ribeira. Também assinando como Joaquim Lucas, o
combativo articulista do jornal “A Imprensa”,(1917) e do “Jornal daNoite”
(1925), órgão independente e noticioso, consagrado aos interesses do povo.
Também publicou poemas, caso do poema “Revés da Sorte”, saído no jornal “A
Capital”, edição de 17 de janeiro de (1909); ou ainda Lucas Costa, dos poemas
publicados no jornal “ARepública” e do seu único livro DISFARÇADOS...1924, com
edição do livreiro Fortunato Aranha. Capa e desenhos, graças à gentileza do
inteligente artista piauiense Mário de Carvalho que, presentemente nesta
Capital, de boa vontade ilustrou com belos quadros o simples trabalho que
apresentamos. Quando um articulista do jornal“A República”, escreveu na edição
de 24 de outubro de (1924), sobre o fato de o autor além de ter se dedicado a
atividade comercial, “mesmo assim se revelou um espírito esforçado e
inteligente ao abordar assuntos literários”.
Colaborou ainda, na condição de redator,
em “O Teatro”, nos números um e dois (26 de fevereiro de1916 e três de maio de
1918). Desse grupo faziam parte Félix Fidélis (pseudônimo de Jorge Fernandes),
Riachão, Lívia Maggioly, Deolindo Lima, João Estevão e Cora Maggioly. Revista
do Órgão do “O Ginásio Dramático”, publicação indeterminada. Não tivemos acesso
a essa revista. Joaquim Lucas escreveu um original e bem elaborado mini-conto
intitulado, “OOURO...”, publicado em 1917 na revista Rapa-Coco, para as festas
sanjuanêscas.
Joaquim Lucas da Costa, participou como
contra-regra, conforme se lê no jornal “O Parafuso” de 17 de dezembro de 1916.
O “GinásioDramático”, Instituição de amadores organizada em Natal em 1914,
funcionou toda a sua vida no Teatro Carlos Gomes, (hoje Teatro Alberto
Maranhão), por gentileza dos governadores que independente de qualquer contrato
e mediante insignificante caução, ofereciam o teatro do Estado para os ensaios
e representações da referida sociedade. O proveitoso grêmio natalense, posto
que não contasse com nenhuma subvenção pública, e fosse até visto com certo
indiferentismo por parte de alguns conterrâneos refratários, se manteve por
muitos anos com os seus próprios recursos, impondo-se também a elevada
consideração, já pelos seus proveitosos fins, já pela grande harmonia de vistas
existente entre os seus associados.
De admirar era também, que “O Ginásio
Dramático” sendo uma sociedade tão bem unificada, não dispusesse de leis para o
seu regimento interno. Os seus estatutos não passavam de meras decisões da
diretoria em exercício, que sempre agia tendo em vista o desdobramento do
valioso núcleo de amadores. Os sócios componentes do Ginásio dividiam-se em
três classes tendo cada uma, funções distintas. Havia uma classe de sócios
protetores que nos momentos precisos auxiliava pecuniariamente o grêmio: a
segunda que era o corpo de amadores, representava por assim dizer, a vida ativa
da sociedade: a terceira, de maior responsabilidade, era constituída pelos
conterrâneos que tomavam o compromisso da elaboração literária.
As peças levadas à cena pelos inteligentes
amadores do Ginásio eram, em sua maioria, da criação dos patrícios associados,
que as escreviam, adaptando à genérica intuição dos amadores. Desta arte, foi
que a brilhante sociedade de que ora nos ocupamos, ofereceu em Natal momentos
de verdadeiro encanto aos espíritos da sociedade natalense que souberam receber
as maravilhosas emoções da arte imitativa. Este grêmio marcou época na vida da
cidade, com muitas revistas, vaudevilles, comédias, burlêtas e dramas, escritas
pelo pessoal de casa e montadas no “TeatroCarlosGomes”, pelos moços ginasianos.
Foram também magnificamente representadas
por estes, peças de consagrados escritores nacionais, cujo desempenho, causa
viva surpresa aos legítimos conhecedores da arte. “O Ginásio Dramático”, que
nos seus últimos anos se achava bem pujante e conceituado. Contava, como seus
elementos constitutivos, os seguintes cavalheiros: drs. Sebastião Fernandes,
Luiz Potiguar, major José Pinto, prof. Ivo Filho, major Ezequiel, tenentes
Deolindo Lima e Aristóteles Costa, Virgilio Trindade, Amaro Andrade, Sandoval
Wanderley, Joaquim Lucas, Abelardo Bezerra (1) Cícero Vieira, Jayme Wanderley,
Fábio Zambrotti, Mario Mendes, Carlos Siqueira, João Estevam, José Callafange,
José Callazans, Pretextato Bezerra, Pedro Odilon e João Leite. O
GinásioDramático,viajou pelas cidades mais próximas da capital, como: Macaíba,
Ceará-Mirim, Canguaretama.
Dentro da sua produção cultural, Joaquim
Lucas destaca-se com o texto O Homem, publicado no jornal A Imprensa, setembro
de (1917), aborda, filosòficamente, nossa espécie, com observações dessa
profundidade, nas quais se observa, na escrita, uma espécie de transe
mediúnico, (registre-se: Lucas da Costa era um dos espiritualistas da cidade):
“Homem, não te envaideças tanto! Há em tua alma, cores que deslumbram, mas
estas não são mais que as iriações dos páramos, o brilho fictício dos fulgores
ou as variedades caleidoscópias. Tu és apenas um instrumento transmissor das
maravilhas de todos os tempos, sabes? O panteísmo é a verdadeira ciência;
somente Deus é grande...”
Seu
envolvimento com a Maçonaria é um capítulo especial e importante na sua vida,
ele dedicou quinze anos à loja maçônica “FILHOS DA FÉOR DE NATAL DE NATAL”.
Destacando-se como brilhante orador, além de exercer os cargos de secretário e
1º vigilante. Grau (18). Fez parte também como orador da SOCIEDADE IRMANDADE
DOS PASSOS e da SOCIEDADE GARANTIA DO POVO.
Marcando sua
presença na vida política da capital Natal, Joaquim Lucas da Costa se registrou
entre os (100) nomes de uma lista de candidatos a deputados e suplentes, para a
renovação da 2ª turma a esta zona. Pelo edital da JuntaComercialdeNatal, foram
convidados, naquela ocasião, os comerciantes-eleitores, em 26 de dezembro de
(1923), publicado no jornal “A República”.
O respeitado poeta e crítico literário
Anchieta Fernandes traduziu e resumiu a importância de Joaquim Lucas Costa no
ofício lítero-jornalístico: “Um genial praticante da ironia e do humorismo
desvelador das máscaras sociais. Pioneiro na documentação da vida cultural de
Natal”. Mais: “Temos em Lucas da Costa, no livro DISFARÇADOS...1924,a prova de
quanto o bom escritor pode ultrapassar a sua época, na verdade criativa, que
sabe usar para captar situações e comportamentos humanos”. O ilustre jornalista
e grande escritor premiado Franklin Jorge, afirma em seu texto publicado no
jornal cultural O Rio Grande, “LUCAS DA COSTA, CRONISTA POLÍTICO QUE NATAL
ESQUECEU”; partidário do Capitão José da Penha, adversário do sistema Maranhão,
Lucas da Costa utiliza recursos da ficção para decompor os bastidores da
política e o caráter dos personagens que estão no comando da ação ou encarnam o
papel de satélites dos poderosos de plantão. Observa; “o jornalismo incendiava
a opinião pública no Rio Grande do Norte e o Governador Alberto Maranhão
contratou jornalistas pernambucanos para defenderem os seus interesses contra o
avanço do adversário, antenado com a insatisfação popular.
Dotado de uma cultura que o distinguia dos
seus colegas de redação, Lucas da Costa viu na multiplicação dos jornais, uma
forma de corrupção aos interesses políticos antidemocráticos. A prova disto: a
nomeação do jornalista pernambucano Oscar Brandão, para a função de delegado de
polícia”.
Retratando o cotidiano, as
vicissitudes, os desmandos políticos oligárquicos do seu tempo, Lucas da Costa
pormenorizou e reconstituiu um amplo e rico painel da vida e da sociedade
natalense. Essa crítica social dos costumes de Natal foi enriquecida,
especialmente quando, em um dos capítulos de DISFARÇADOS...1924, o escritor
abordou a célebre e quase sangrenta campanha política da sucessão governamental
em (1913), que desassossegou o Estado, com os inflamados discursos
“salvacionistas” do capitão José da Penha: “... Muita gente já tinha uma
espécie de fanatismo pelo capitão Penha, e quase diariamente chegava gente do
interior à capital para vê-lo e ouvi-lo falar desassombradamente sobre os
desmandos políticos da terra, bradando contra o continuísmo da oligarquia
Maranhão, representada pela candidatura vitoriosa do desembargador Joaquim
FerreiraChaves, que voltava ao governo do Rio Grande do Norte, agora com um
gigante mandato de sete anos.
Lucas da Costa despediu-se da vida,
quando já gozava da popularidade alcançada com seu livro, comenta o jornalista
Carlos Morais”. DISFARÇADOS... editado em outubro de(1924), bem vendido nas
duas principais vitrines de venda de livros da cidade, a livraria
Cosmopolita, do livreiro e editor
Fortunato Aranha e agência Pernambucana
do livreiro Luís Romão, ambos situados na avenida Dr. Augusto Tavares de Lyra,
na pitoresca Ribeira. Bairro, aliás, que Lucas da Costa amava, e viveu boa
parte das suas horas, no comércio, no jornalismo, no teatro e na condição de morador.
No prefácio do livro NATAL DO MEU TEMPO,Crônica da Cidadedo Natal, de João
Amorim Guimarães, na 2ª edição (1999), com organização, introdução e notas do
Dr. e professor do Departamento de Letras da (UFRN), Humberto Hermenegildo de
Araújo. Ele faz este comentário: “É necessário observar, no entanto, que NATAL
DO MEU TEMPO, não é uma manifestação isolada de documentação da vida cultural
da cidade do Natal. No gênero, destacam-se os títulos HISTÓRIAS QUE O TEMPO
LEVA... (1924, Luís da Câmara Cascudo) e DISFARÇADOS..., 1924 (Joaquim Lucas da
Costa), ambos publicados na década de 20. Após estes dois trabalhos pioneiros,
muitas crônicas sobre o processo de modernização da cidade, foram publicados na
imprensa natalense, assunto em torno do qual relacionam todos os outros”.
Este livro, portanto, reeditado
após 73 anos, com o apoio do venerando Instituto Histórico e Geográfico do Rio
Grande do Nortee da Fundação Cultural “PadreJoão Maria”. DISFARÇADOS...1924, é
ao mesmo tempo uma obra de referência e um delicioso painel dos costumes
políticos e sociais de uma Natal dorminhoquenta e provinciana, transformada em
presa da oligarquia constituída ao longo da luta pela extinção da escravidão e
proclamação da República que desde o seu nascimento mostrou-se uma boa mãe para
aqueles que detém o poder em nome do povo, deve ser lido e comentado pelos seus
enfoques diversos, livre das exigências gramaticais, cujo fato, porém, não
ofusca, jamais, os méritos do autor.
E foi no bairro da Ribeira, na Rua Gen.
Glicério, por trás da Igreja do Bom Jesus das Dores, que o prestimoso
cavalheiro, Sr. Joaquim Lucas da Costa, se despedia da vida, às 6 horas da
manhã de sábado, proveniente de uma úlcera perfurante no estômago, em 25 de
julho de 1925, com 39 anos de idade. A sua vida e sua importante trajetória
existencial foram analisadas e avaliadas, lhe garantindo um retrato fiel do seu
comprovado e reconhecido valor. O comerciante, escritor e jornalista Joaquim
Lucas da Costa consorciou-se com a Sra. Maria Pereira da Costa e desta união
constituíram três filhos: Giordano Lucas da Costa, Renato Lucas da Costa e
Dinorá Lucas da Costa.
*Com post na página do Jornal Zona Sul
Foto relacionada à publicação/
capa livro
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