A voz do povo
Por Fernando
Antonio Bezerra*
Primeiro prédio da Rural: Rua Otávio Lamartine, centro de Caicó
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Não existe,
em Caicó ou região, alguém que seja totalmente indiferente a Emissora de
Educação Rural de Caicó AM. Ela, de alguma forma, já esteve presente na vida de
cada um dos filhos e residentes do Seridó. Seja pelo noticiário; pelos
Violeiros ou pelos avisos; pelos programas de evangelização ou pelas grandes
coberturas feitas acerca de eleições ou fatos graves na cidade, todo seridoense
com raízes bem fincadas neste chão sagrado, pelo menos, um dia já parou para
sintonizar 830 AM e ouvir a Emissora Rural.
A Emissora
de Educação Rural de Caicó nasceu entre razões e emoções que se articularam com
equilíbrio, sob a liderança de homens preparados e de muito crédito, em um
tempo movido por inovações provocadas pelo dinamismo do pastoreio de Dom
Eugênio de Araújo Sales na Igreja Católica Apostólica Romana em Natal e com
repercussões em todo o Estado do Rio Grande do Norte.
Na Diocese
de Caicó, particularmente, a liderança foi exercida com destacado entusiasmo
por Dom Manuel Tavares de Araújo (*7 de julho de 1912/+18 de fevereiro de
2006), cujo Bispado se deu no período de 17 de maio de 1959, data da posse, até
1978. Em 2003, entrevistado pelo Professor Mário Lourenço para sua tese de
doutorado, Dom Tavares - falando sobre a Emissora Rural - disse: “Para mim, foi
a maior coisa da minha vida que fiz, foi a fundação da Rádio Rural. (...) Foi
um ponto muito interessante de formação. Não era somente religião, era também a
educação do povo. Eu deixo a mensagem que ela continue, de tal modo que eu
desejo que seja fonte de educação religiosa e civil do povo do Seridó, porque o
povo precisa de uma educação a toda prova”.
Assim, com o
apoio de muitos, depois de campanhas no Seridó e fora dele, a Emissora de Educação
Rural de Caicó foi ouvida a primeira vez, em caráter experimental, no dia 21 de
fevereiro de 1963 e oficialmente inaugurada no dia 01 de maio do mesmo ano, em
solenidade iniciada às 9 horas e bastante prestigiada por autoridades e pelo
povo. No ato inaugural falaram Dom Tavares que também ministrou a benção sobre
as instalações e, ainda, o Prefeito de Caicó, José Josias Fernandes; Gumercindo
Amorim (Rádio Brejuí); Padre Itan Pereira da Silva (1º. Diretor); José Lucas de
Barros (em nome do Banco do Brasil); Padre José Celestino Galvão, pelo clero
diocesano; José Salvador representado os estudantes e Paulo Celestino que se
pronunciou pelos católicos, mesmo não estando previamente acertado, mas
estimulado pelos presentes e por ter sido facultada a palavra.
Os Padres
Galvão e Itan foram importantes protagonistas neste enredo. Padre Galvão porque
mantinha uma difusora (A Voz do Seridó) a partir da Paróquia de Santana, o que
significou aprendizado para alguns que, depois, foram para a Rádio Rural. Padre
Itan, por sua vez, liderou o efetivo início, desde a participação na campanha
de mobilização e organização até a produção da primeira programação. Aliás,
coube ao Padre Itan, em um de seus primeiros pronunciamentos, aclarar alguns
dos propósitos da nova Emissora que, além de evangelizadora, seria educativa e
libertadora: “você que tem um filho que não pode estudar porque tem que lutar
no pesado logo cedo. Você que é analfabeto e não conhece a civilização.
Agricultor do sertão. Hoje é o seu dia. Você sofre tudo isso, mas agora sabe
que tem uma Rádio para defendê-lo e, sobretudo para ajudá-lo. Você agora vai
educar-se e politizar-se. Através das escolas radiofônicas receberá
alfabetização e educação de base. Terá instrução e poderá ser um homem livre,
um habitante da civilização moderna.”
Sob a
liderança de Dom Tavares, a operacionalização de Padre Itan, um novo grupo se
formou, dentre os quais, nomes que integraram a primeira equipe: Zé Gerôncio,
Neto Damásio, Getúlio Costa, Moacir Pinheiro, Alcimar de Almeida, Paulo
Celestino, Evilázio, Pedro Celestino, Moacir Maurício Dantas, Zélia Gurgel,
Maria Marta Araújo e Terezinha Brito. Outros colaboradores, apoiadores,
funcionários logo se somaram ao projeto que há muito era desejado por uma
cidade que crescia e, de fato, era a Capital próspera do sertão seridoense. Da
primeira grade de programação ainda estão no ar os programas “O Mundo Bíblico”,
com Monsenhor Antenor Salvino de Araújo, e os de cultura regional: Violeiros do
Seridó e Forró pela Rural.
Depois de
Padre Itan, o Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo assumiu a direção. Em alguns
períodos menores já respondia pela direção, mas de 1967 a 2012 foi o efetivo
diretor e, sob seu comando, a Emissora se consolidou não apenas como um veículo
de credibilidade e audiência, mas se tornou maior, tendo em vista que, neste
período, surgiram a Rural FM e a Rural AM Parelhas. Em entrevista à imprensa,
já como ex-diretor, Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo, disse: “A Rural ainda é
a voz do povo, fato que se repete muitas vezes na sua programação, e é verdade.
O povo começou a ter um meio de comunicação para ouvir a si mesmo. Vi a Rural
nascer e crescer, como fruto do bem que dom Tavares apresentou em toda a sua
profundidade na comunicação de Deus em Cristo”.
Em 2012, já
como Sistema Rural de Comunicação, o Padre Ivanoff da Costa Pereira assumiu a
direção em substituição a Monsenhor Tércio. Já com a nova direção, uma outra
emissora foi incorporada: a Rádio Currais Novos AM, antiga Brejuí, a primeira a
ser fundada no Seridó. A semente, portanto, bem plantada por Dom Tavares e
tantos outros, germinou, rendeu frutos e continua a fazer parte da vida
seridoense, contribuindo para fazê-la melhor, contando a cada dia a história da
região, a mudança dos costumes, os novos acontecimentos, seus personagens e os
desafios de um mundo em transformação que, às vezes, sem prumo e sem rumo, não
é fonte de boas notícias. Mas, assim mesmo, como os que nos antecederam, não
percamos a emenda do fio da esperança.
*Fernando Antonio Bezerra é potiguar do Seridó
/ com post na página do Bar de Ferreirinha
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