Dona Rosa e o para-raios
Ciduca Barros(**)
Quando nós a conhecemos
ela já era uma mulher de meia-idade, viúva, baixinha, gordinha, muito agitada,
irritadiça e nervosa, apesar de tratar a todos nós de “meus filhos”. A sua
mercearia ficava localizada nas imediações do nosso colégio (GDS) e nós,
alunos, comprávamos ali. Ela nos tratava sempre com carinho, mas com medo de
ser engabelada nas vendas ficava mais nervosa e muito mais irritada.
Como é do conhecimento
de todos, no nosso Seridó, por ocasião do tempo chuvoso, são comuns os raios,
relâmpagos e trovões. Assim como estudamos em Física, o raio é a descarga
elétrica entre uma nuvem e a terra, acompanhada de relâmpago e trovão. E os
raios já fizeram muitas vítimas, não só no Seridó, como no resto do mundo.
Portanto, o raio é uma manifestação da natureza muito perigosa.
Certa ocasião,
justamente quando a mercearia de Dona Rosa estava cheia de estudantes, com
alguns deles querendo uma distração dela para lhe dar um calote, apareceu um
cidadão de pasta na mão, aparentando, claramente, no seu aspecto exterior, ser
um vendedor, aliás, um caixeiro-viajante, como se dizia naquela época.
Aquele homem era
vendedor de para-raios e desejava vender um deles para Dona Rosa, que nunca
tinha ouvido falar sobre aquele equipamento. Para-raios é um sistema de
condutores metálicos colocados nos pontos mais elevados de edificações e
ligados à terra, com o fim de proporcionar um caminho mais fácil às descargas
elétricas atmosféricas e evitar danos, inclusive perdas de vidas humanas.
Agora me responda você,
caro leitor: como a pobre de Dona Rosa iria entender esta complicada explicação
sobre para-raios que o sisudo vendedor tentava lhe dar, com o balcão cheio de
jovens clientes duvidosos? Cada um daqueles pequenos era um devedor
inadimplente em potencial.
Então, a coisa estava
nesse pé: o cara, num canto do balcão, tentava explicar o que era o seu produto
e Dona Rosa correndo de um lado para o outro atendendo a sua “perigosa”
clientela.
Depois de vários minutos
nessa agonia, Dona Rosa parou, encarou o vendedor e disse:
– Meu filho, seja
simples e direto. O que realmente o diabo desse equipamento faz?
E foi a desgraça do
vendedor, pois com a expressão “simples e direto” na cabeça, querendo
demonstrar a grande área de ação do seu produto, ele sintetizou:
– É o seguinte, Dona
Rosa! A senhora compra um e instala aqui em seu estabelecimento e se um raio
for cair lá no Açude Itans (*) o seu para-raios o atrai.
Esta explicação “simples
e direta” foi uma dose muito forte para a ansiosa Dona Rosa. Ela parou, colocou
as mãos nos quadris e mostrando a sua ampla e trabalhosa clientela, perguntou:
– Meu filho, você acha
que eu vou gastar o meu suado dinheirinho pra trazer raios lá do Açude Itans
pra dentro da minha casa?
(*) O Açude Itans é um reservatório artificial
construído no leito do Rio Barra Nova, em Caicó, com a finalidade de abastecer
aquela localidade
(**) Com post no Blog
Bar de Ferreirinha
JBAnota – Dona Rosa era a mãe de Jessé, um
rapaz que nessa época era proprietário de uma lambreta novinha, e craque no
volante, a dirigia em alta velocidade pelas ruas da cidade.
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