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domingo, 26 de julho de 2015

Sessenta quilos na roda bruta

Por João Bosco de Araújo*
Jornalista boscoaraujo@assessorn.com  

Foto pesquisa internet/divulgação
No parque de diversão, que era o Parque Lima e ficava armado sempre ao lado da Catedral todos os anos e por quase três décadas, as moças e rapazes explodiam de alegria. O sobe e desce na roda-gigante, as canoas, os aviões, o carrossel de cavalinhos, a paquera na praça do coreto – justamente a Praça da Liberdade. Das crianças aos adolescentes, ninguém ficava parado.

Naquela tarde de sábado, penúltimo dia de festa da padroeira Sant’Ana de Caicó, o rapaz do sítio havia arranjado uma namorada. No alto-falante tocava uma canção de Paulo Sérgio, onde o locutor com sua voz impostada acabara de anunciar: “De um alguém para outro alguém, no País da Lua”. Os Beatles estavam em moda, mas suas músicas não tocavam naquela difusora. Questão de costume.

O namorado, gentilmente, se oferece para dar um passeio na roda-gigante. A moça, com seu jeito tímido, balança a cabeça afirmando, positivamente. O casal entra na fila e toma assento na cadeira giratória. Outros rapazes que residiam na cidade ficaram a observar, atentos, os dois sentados e felizes naquela poltrona de ferro a rodar e a balançar, suavemente. A mocinha vestia uma saia curta e justa. Foi quando, exatamente, no movimento da gigante roda e ao aproximar-se da turminha de amigos, todos leram, estupefatos, escrito em sua calcinha branca “60 Kg bruto”, estampado em letras garrafais, como estava impresso saca de açúcar do armazém de cereais.

A pobre moça – analfabeta – jamais imaginara que em suas vestes íntimas estivesse escrita uma mensagem tão explícita e versal como àquela, exposta ao público naquele momento de pura felicidade em sua vida, num dia de alegria, de prazer, de festa de rua. Tampouco os rapazes demonstraram o que acabavam de ver – ao menos enquanto viviam àquele flagrante sensual. Depois, ninguém jamais esqueceu dos sessenta ‘quilo’ bruto da calcinha da roda gigante. 

Era comum, na época, as pessoas mais simples confeccionarem suas roupas com tecidos de sacos de açúcar ou de farinha, pois, geralmente, os homens faziam dessas vestimentas seu uniforme de trabalho na roça e as mulheres suas peças íntimas, como anáguas e calcinhas. Eram adquiridas em armazéns e feiras ou, muitas vezes, de graça na casa do patrão.

Quem também presenciou esse flagrante sensacional, embora não fosse do grupo de amigos da cidade, mas do casal de namorados, foi o rapaz Manoel Sirino, que era queijeiro no Umbuzeiro e que por sua vez narrou muitos outros causos por ele vividos e por outras pessoas do lugar. Ele sempre teve uma criatividade fora do comum e juntava tudo isso em sua memória e me contava todas as vezes que eu ia passar as férias escolares no sítio do meu pai Pedro Salviano de Araújo, em Caicó.      

*Texto originalmente publicado nos jornais Tribuna do Norte (julho de 2000) e Diário de Natal (setembro de 2008) além de outros blogs.

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Abaixo, vídeo com a cantora caicoense Dodora Guedes, original de outro seridoense, Elino Julião: 



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