Por Albimar Furtado*
Jornalista ▶ albimar@superig.com.br
A seca braba que sentencia de morte o rebanho
nordestino tem sido pródiga na produção de imagens fortes e tristes e de
produção de matérias que documentam o fato e atestam a forma descuidada como se
tem tratado a terra. Pela ausência das chuvas um tema voltou a ser lembrado, a
desertificação, e o Novo Jornal tratou do assunto com uma bem trabalhada
matéria de Paulo Nascimento enriquecida pelas fotos de Ney Douglas e pelo
oportuno e competente artigo de Sílvio Andrade. Acompanhando o notíciário,
lembrei ter guardado um trabalho que o professor e ex-governador Cortez Pereira
me enviou no idos de 1994, de várias páginas manuscritas, alertando que “...no
Rio Grande do Norte o Seridó, se nada for feito em sua defesa, poderá ser o
primeiro deserto do Brasil e das Américas”. Está registrado também que a
Estação Ecológica do Seridó, com sede em Caicó, àquele ano, já identificara
pontos desérticos nos municípios de Ouro Branco, Parelhas e São José do Seridó.
Cortez Pereira, um dedicado estudioso das questões
do Nordeste, acompanhava os eventos ligados à desertificação e naquele 1994 era
realizado na França a Convenção Internacional de Paris Contra a Desertificação,
realizada pela ONU, reunindo 132 paises ameaçados pelo fenômeno. E do evento
ele pinçou a informação de que nas Américas três zonas foram identificadas como
de “altíssima susceptibilidade”: Piedemonte, no México; Patagônia, na
Argentina; e Nordeste, no Brasil. Em seu manuscrito o ex-governador, que
revolucionou o Rio Grande do Norte com projetos inovadores, juntou estudos
realizados pela Universidade Federal do Piaui e levados ao Seminário
Latino-Americano da Desertificação realizado em 1994, em Fortaleza. O documento
já apontava o Rio Grande do Norte como o Estado de maior área de risco (80%),
seguido de Pernambuco (75%) e Paraiba (70%).
Lembrava ainda Cortez Pereira que o cientista
mineiro, Guimarães Duque, em anos anteriores, já fizera a advertência apontando
o índice de aridez como crítico por se aproximar do nível dos desertos. “As
suas observações ao longo de 25 anos utilizaram os registros da antiga Estação
de Cruzeta (Seridó), que atestavam um índice de aridez de 3.3, o mais baixo
nível de todo o Nordeste.” Lembro que em nossa conversa o professor Cortez
Pereira me informou ter encaminhado ao governador Vivaldo Cortez (que
substituira a José Agripino que se afastara do cargo para disputar novas
eleições) um estudo sugerindo providências para serem encartadas em programa
amplo em defesa do Seridó. A essência era trabalhar com uma diversificada
cobertura e leguminosas como base e início do programa, buscando a recuperação
e fixação do solo. Em paralelo haveria a criação do suporte forrageiro para
desenvolver uma pecuária com desenvolvimento industrial.
O manuscrito e a conversas estão completando 19
anos, beirando duas décadas. O conteúdo tinha apoio em documentos ainda mais
antigos. A desertificação do semiárido é tema recorrente, sempre. E sempre,
nele, o anúncio da iminência do deserto tomar conta do Seridó. O alerta do
professor Cortez Pereira, que tem várias páginas manuscritas, não foi o
primeiro e, depois dele, muitos estudos e muitas pesquisas já foram produzidos.
Gritos silenciosos sem ecos em quem tem o comando. As matérias e as fotos
publicadas nos últimos dias mostram bem o cenário que cada vez mais se efetivam
no sertão do Seridó e sem solução à vista.
*Texto publicado na
coluna do jornalista no NOVO JORNAL
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