--- Walter Medeiros* -
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A proximidade dos festejos natalinos, que sempre
gera algo contagiante e envolvente, realçando a felicidade, a bondade, a
ternura, simpatia, amor e tantos outros sentimentos bons, mundo afora, sempre
aguçou minha atenção. Quando criança, lembro dos presentes que ganhei; não
foram tantos, mas todos foram muito valiosos: do dominó verde trazido pela
minha prima Socorrinho, ao Gordini azul presenteado pela minha irmã Clemilda, e
o dinheiro que meu irmão Wellington dava para eu comprar o que quisesse e
aproveitava para gastar na Livraria Moderna.
Guardo na mente também as vitrines da Cidade Alta,
que nos anos 70 e seguintes atraiam a freguesia com aqueles motivos de recursos
propagandísticos ainda parcos, mas da melhor qualidade. Assim encontrávamos
objetos para realizar sonhos no Magazin Jóia, de Auta Vieira e irmãos; na
Galeria do Barão do Rio Branco; na Lobrás; Americanas, enquanto não chegava a
nova dimensão do comércio de Natal, através do Hiper Bom Preço, Carrefour e
shoppings. Até a chegada dessas grandes estruturas, tudo que se tinha para
momentos com a família na cidade eram as lanchonetes e a Casa da Maçã. Só
depois é que surgiram as pizzarias.
Em meio a esse clima natalino, que começou faz
tempo, vou olhar as vitrines de um grande shopping, em busca de alguma novidade
que justifique novo entusiasmo. E encontro. Numa prateleira ou outra, lá está
sempre um objeto que faz brilhar os olhos e toca o coração pela descoberta de
algo com a impressão de que quem o receber de presente irá vibrar e valorizar. Ou aquele objeto que fica bem em algum lugar
da casa, para tornar o ambiente mais agradável a quem nos visitar. No fundo, todos com aquele aspecto de Décimo
Terceiro Salário, gratificação natalina que começou com esse nome, depois
passou a ser tratada só como “décimo terceiro” e agora já chamam de “décimo”.
Em meio a essa andança, ouço um piano solitário,
executando bela música clássica, que me leva para dentro de algum castelo, na
Renascença, e aos bailes que embalaram os corações da humanidade através da história.
Fico sensibilizado e grato pela feliz escolha do programador do shopping,
lembrando inclusive do tempo em que sonhei em ser discotecário da rádio, mas o
destino me transformou em repórter. Era uma música daquelas que o popular
extraiu do erudito e a transformou em universal. Mas em meio a esta sensação,
passa um cidadão com uma impressão diferente, aquela que foi formada no tempo
em que a Paixão de Cristo e outros momentos eram embalados pelas músicas
clássicas, e exclama: “agora tão tocando música fúnebre, né?”
Nem vi o cidadão, que passou rapidamente, mas suas
palavras alteraram completamente a cena. Como acontece muitas vezes as
coincidências da vida, poucos passos adiante vejo ninguém menos que o Padre
Pedro Ferreira, uma das pessoas mais qualificadas para falar sobre música.
Aquele mesmo andar calmo, aquela mesma voz forte de sempre. Aí conto o
ocorrido. Com a bagagem imensa de pesquisador e músico, ele esboça aquele
sorriso que vai além do homem comum que classifica as músicas. E fala com a grandeza
do sacerdote: “veja como são diferentes as percepções”. E ao final roga para
que Deus me acompanhe. Como a música é mesmo divina, saí me guardando para
ouvir, no Natal, aquela música que conheci através da sua regência no coral da
UFRN: “Hallelujah”.
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*Jornalista
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