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domingo, 6 de março de 2011

A Barca num dia de comer filhós

Por João Bosco de Araújo
Jornalista 

Recebo e-mail carregado do bolero “La Barca”. Dicen que la distancia es el olvido / Pero yo no concibo esta razón, estão nos primeiros versos da música mais executada de todos os tempos, até hoje, informa o texto na abertura da mensagem auditiva. Nem consigo imaginar o tempo que não ouvia um bolero. Acabaram com o romantismo, em tudo. Se bem, me lembro bem, bolero já não fazia a cabeça da minha geração pós Bossa Nova.

Mas, me lembro, tão bem, daquela radiola de balcão dos meus tios, na sala de visita da casa dos meus avós maternos. Criança, nem imaginar chegar perto. Tocava outras canções, mas nunca me esqueci dos boleros que meu tio os acompanhava batendo as pontas dos dedos de uma mão na outra fechada. Com a toalha sobre o ombro, ele esperava a hora do banho para o jantar. Eu, sentado na cadeira da sala, calado. Era a senha da minha estada.

Uma parede separava a casa da rua dos meus pais, da outra de meus avós, contudo, a sensação de ver e ouvir aquele disco bolachão a rodar segurado por uma agulha, me fascinava. Em outra ocasião, era o meu outro tio que ensaiava passos, sozinho pela sala, naquela sessão auditiva. Tempos depois, final dos anos 70, nas férias da faculdade, me deparo com um LP de Trini Lopez. Todas as faixas, de clássicos boleros do célebre interprete americano, filho de pais mexicanos. A música latina voltava a me contagiar com aquele álbum latino.

Na verdade, a música latina embalou a juventude de meus tios e de sua geração daqueles anos românticos da metade do século 20 da vida caicoense. Tanto assim, que décadas depois, Antenor e Chico Tavares ainda mantinham a alma latina. Os discos e radiola não faziam mais parte de suas vidas, embora carregassem consigo a paixão pela música e o ritmo calientes. Bastava ver na alegria de Antenor Tavares dançando bolero, rumba, salsa, girando, elegantemente, com sua esposa nos salões da Festa e Baile dos Coroas. 

Cuando la luz del sol se esté apagando / Y te sientas cansada de vagar / Piensa que yo por ti estaré esperando / Hasta que tú decidas regresar.

Navegamos, se preciso foi, pois que a distância separa o tempo e ninguém há de imaginar de nunca se acabar a esperança, até que o sol possa um dia sua luz se apagar. Embarquemos, pois, mesmo que seja carnaval e domingo é dia de comer filhós.
   
JBAnota Texto publicado no blog em 14/02, Domingo de Carnaval de 2010, e n’O Jornal de Hoje (Natal). Comer filhós é uma tradição herdada de nossos colonizadores portugueses e ainda muito comum entre os seridoenses, com a família reunida neste Domingo de Entrudo, sinalizando a chegada do carnaval e a quaresma que se aproxima. Por força geográfica, este blogueiro se abstêm dessa iguaria, mas fica o registro e o compartilhamento sentimental.

©2011 www.AssessoRN.com | Jornalista Bosco Araújo

Abaixo, vídeo com a música La Barca


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2 comentários:

  1. Meu caro Bosco,

    tanto no ano passado como hoje você me fez voltar também a infância, mas não tinha ainda ouvido La Barca com Luis Miguel, o Roberto Carlos dos mexicanos. E você me fez voltar no tempo porque, lá em meados dos anos 60 - vixe, home! faz tempo - eu já era músico profissional e não só assisti monstros como Bienvenido Granda, Marimba Alma Latina - que me fascinavam - como fazia parte do contexto, não tocando com eles, mas fazendo zuada na bateria de orquestras e, depois, conjuntos de rocks. Nada se iguala a boleros, rumbas, mambos, salsas, fox, entre outros rítmos. Na verdade, essa minha paixão só é mesmo superada pelo forró, não esta baboseria de hoje, mas aquele autêntico que tomou corpo e forma nacionais a partir de Luiz Gonzaga. Bom carnval, amigo e lamento pelo filhó que eu, embora não seja seridoense, adoro.

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  2. Rosemilton, amigo,
    Quanto tempo que não nos mantemos contatos! Também não sabia dessa sua veia artística. Grato pela visita e volta sempre. Bom carnaval e grande abraço.

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